Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 16/08/2014
Ouviram do Maracanã as arquibancadas plácidas, de um povo heróico o brado, apupada, assobiada, assuada, babaré, babaréu, corrimaça, fiau, lequéssia, motejo, pateada, pateadura, reprovação, surriada, vaia a zombaria retumbante – quando surgiu nos telões a figura de certa senhora cujo nome não merece figurar nesta coluna.
Ainda que modesta, a situação dos meus pais me permitiu a honra vantajosa de ser bacharel. Em que pese ao tiquinho de sangue angolano descoberto num teste de DNA, tenho jeito de elite branca e cara de rico, que me poupou durante anos de fazer compras em imensa loja juiz-forana, que vendia tudo e nada tinha preço. Explico: os donos da loja cobravam de acordo com a cara do freguês. Uma daquelas bolas de torrar café na fazenda, que valia 40 no dinheiro da época, vendida para mim custava 400. Como havia produtos só existentes na loja, a exemplo da estrovenga, foice de dois gumes e de pequena proporção usada na agricultura, precisei pedir a um amigo, sem cara de rico, que me comprasse meia dúzia delas.
Junto com a cara de rico da elite branca, acho que tive boa educação. Pelo menos cumprimento conhecidos e desconhecidos com bons dias, boas tardes, boas noites, peço desculpas se o meu carrinho de supermercado atrapalha a circulação de alguém e nunca me esqueço de agradecer aos que me prestam favores ou algum tipo de serviço. Isto posto, devo confessar que não sei como reagiria no Maracanã ao aparecimento no telão de certas pessoas, Joseph Sepp Blatter & cia.
Dom
Entre dezenas de significados, dom é aptidão inata para fazer algo especialmente difícil ou raro; inclinação, talento. Vem do latim dónum,i “dom, dádiva, doação”. Pode ser burilado, estudado, aperfeiçoado, como fazem os cantores líricos, e também pode ser aprimorado no dia a dia dos negócios, caso dos grandes comerciantes. Posso imaginar o que tenha sido o começo da vida comercial de um Samuel Klein construindo o império das Casas Bahia. Temos agora este menino Ricardo Nunes, nascido em Divinópolis, MG, repetindo o feito com a sua Ricardo Eletro. Dom para o canto lírico tem desde rapazola José Plácido Domingo Embil, tessitura de barítono e tenor dramático, casado desde 1962 com a notável soprano Marta Ornelas, que abandonou os palcos para cuidar da carreira do marido.
Com o renascimento do comércio de discos de vinil, é possível que o leitor encontre um à venda com a seguinte dedicatória: “Para o lindo Eduardo, com beijinhos da Amália”. Pois é: fotógrafo de Rolleiflex, fui fazer matéria no Copacabana Palace com a fadista Amália da Piedade Rodrigues (1920-1999). Antes de entrar no hotel, comprei um LP da linda portuguesa, que andaria pelos seus 35 aninhos e, aparentemente, se encantou com o jovem fotógrafo. Divórcios repetidos, sucessivas mudanças de casa, fizeram que o ex-fotógrafo perdesse o LP. Comecei este belo suelto pensando falar no dom para o comércio de um Klein, um Nunes, e acabei perdendo o rumo ao pensar na Amália que conheci.
Perigo
Na cidade de São Paulo, um cabo de alta tensão caiu sobre um automóvel eletrocutando o casal que nele viajava. Caiu por cair, sem que houvesse trombada num poste próximo. Funcionário da Eletropaulo disse à imprensa que o cabeamento da região havia sido revisto quatro meses antes da estranha ruptura. Numa dessas, nem o anjo da guarda da Cemig dá jeito.
Diante da notícia e da filmagem do carro pegando fogo, lembrei-me de uma tarde em que voltei para a fazenda fluminense depois de um temporal. Encontrei um poste caído, poste novo, linha de alta, e alguns brasileiros pulando sobre o cabo que soltava faíscas. Geralmente, quando cai um poste a linha desarma no dispositivo chamado faca, mas não desarmou e a turma se divertia pulando sobre as faíscas que produziam estalidos.
Consegui que dois sujeitos ficassem de guarda impedindo os pulinhos, voltei a mil para a fazenda mais próxima, telefonei para a Cerj e o pessoal cortou a energia no ato. Três horas mais tarde o sistema estava normalizado. Energia elétrica é uma bênção, sem deixar de ser um perigo. O episódio paulistano ocorreu num bairro de bom aspecto, movimentado, sinal de que se pode repetir em qualquer lugar.
O mundo é uma bola
16 de agosto de 1097: casamento de Pedro I de Aragão com Berta de Itália, isto é, o tipo da notícia que não interessa a ninguém. Novecentos anos mais tarde, em 1997, Pedro e Berta seriam celebridades, o mundo ficaria sabendo quem fez o vestido usado pela noiva filha do marquês Pedro de Itália e de Agnes de Potio. Antes, Pedro I de Aragão fora casado com Inês, filha de Guilherme VIII de Aquitânia, da qual teve dois filhos mortos antes do pai, que reinou de 1094 a 1104 e foi a óbito, coitado, com 36 aninhos.
Em 1570, início da Inquisição nas colônias espanholas da América, estabelecida por carta assinada nesse dia em Madrid. Em 1950, Frederico Chávez assume a presidência do Paraguai, cargo para o qual seria eleito três anos depois.
Ruminanças
“Não há profissão mais bela, mais interessante que a de jornalista; nenhuma exige mais talento, tato e vivacidade” (León Daudet, 1867-1942).
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