Projeto da USP examinará corpos sem bisturi, usando tomografia avançada e outros aparelhos para aumentar precisão de testes e beneficiar pacientes vivos
Imagens de tomografia do primeiro corpo submetido a autópsia virtual |
O programa de imagem na sala de autópsia envolve 17 departamentos da faculdade e deve receber US$ 10 milhões, somando recursos da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e da própria USP, além de uma parceria com um fabricante de aparelhos.
O plano é realizar autópsias virtuais em mil corpos examinados no Serviço de Verificação de Óbitos.
Paulo Saldiva, professor de patologia na Faculdade de Medicina da USP e especialista em poluição atmosférica, diz que os resultados da autópsia comum, feita com cortes e análise física dos órgãos, e a da virtual, realizada por meio de exames, serão postos lado a lado.
"A qualidade da informação fornecida pelos dois métodos será comparada."
A primeira finalidade do projeto é gerar conhecimento para ensino e pesquisa, mas há outros objetivos de médio e longo prazo.
Um deles é aumentar a adesão às autópsias. Uma família que negaria o exame invasivo pode ter mais chances de aprovar a autópsia digital.
E hospitais que hoje não realizam autópsias poderiam passar a fazer exames pós-morte não invasivos.
"Sai o bisturi para todos os casos e entra o tomógrafo e o raio-X", diz Saldiva. O exame também pode incluir a realização de biópsias -a retirada de amostras de tecido para confirmar diagnósticos.
Outro objetivo é avaliar novas tecnologias de exame, que poderão ser testadas nos cadáveres. Será possível saber a dose de radiação ou o campo magnético máximo que pode ser usado em uma pessoa viva.
Também pode ser avaliada a qualidade de diferentes exames para o diagnóstico de câncer de mama ou próstata, por exemplo, e estudar se a adoção de um novo equipamento vai fazer diferença no cuidado com os pacientes.
MÁQUINA NOVA
Em cerca de dois anos, o projeto da USP deve receber uma nova máquina de ressonância magnética, muito mais potente do que as presentes hoje nos hospitais. O aparelho será usado nos cadáveres, e esses testes vão ajudar a avaliar a segurança de seu uso nos vivos.
Tornar os exames de imagem feitos para fins diagnósticos em pessoas vivas mais precisos também é uma meta do grupo a longo prazo, como explica o médico Edson Amaro Jr., professor associado do Departamento de Radiologia da Faculdade de Medicina da USP.
Uma das formas de fazer isso é usar os dados das autópsias comuns e das digitais para investigar a correlação entre as imagens e a análise dos tecidos, isto é, fazer uma ligação direta entre o que aparece no exame e o que está acontecendo no corpo.
Hoje, é comum que testes de imagem cheguem com um resultado dúbio: há uma mancha no filme, e o médico não sabe se aquilo pode ser um tumor ou não ser nada.
Como pode não ser recomendável ou mesmo viável retirar uma amostra de tecido para realizar um diagnóstico, resta ao paciente esperar e repetir o teste depois.
"Dependendo da pessoa, isso é uma fonte de angústia. Ao receber um laudo dizendo que você tem algo no seu coração, mas que os médicos não sabem o que é, o paciente não vai entender que isso é um problema de especificidade. Vai achar que tem algo grave, vai procurar no 'doutor Google' ", diz Amaro.
Testes de imagem para detecção de Alzheimer, por exemplo, podem se tornar mais precisos por meio dos estudos com cadáveres.
Para o radiologista, não há lugar melhor do que a Faculdade de Medicina para esse tipo de estudo. "Este é o maior centro de autópsia do mundo, com cerca de 15 mil realizadas por ano."
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