Bruna Sensêve
Estado de Minas: 04/12/2012
Brasília – A capacidade de mover algo apenas com o poder da mente está cada vez mais próxima do homem. Não se trata do desenvolvimento de poderes paranormais, mas da aplicação da mais pura ciência. Graças a próteses implantadas no cérebro, macacos – animais comumente usados em pesquisas desse tipo – já conseguem controlar máquinas e cursores em uma tela apenas com o pensamento, sem precisar mexer um só músculo. Agora, um algoritmo desenvolvido por pesquisadores da Universidade de Stanford, nos Esatdos Unidos, promete tornar esse tipo de mecanismo muito mais preciso. A pesquisa, publicada recentemente na revista Nature Neuroscience, aponta que, no futuro, quando essa tecnologia for aplicada ao homem, o movimento imaginado por uma pessoa poderá ser realizado por uma máquina com a mesma habilidade de um membro humano.
O professor de engenharia elétrica, bioengenharia e neurobiologia em Stanford Krishna Shenoy, junto da equipe liderada pelo pesquisador Vikash Gilja, partiu de mecanismos já existes para conseguir duplicar o desempenho do dispositivo, aproximando sua performance à de um braço real. O sistema consiste em um chip de silício implantado no cérebro que registra potenciais ações mecânicas ainda no processamento da atividade neural. Esses sinais são, então, enviados por uma matriz de sensores para um computador. A frequência com que as ações em potencial são geradas fornece as informações essenciais para que o computador, processando o algoritmo, consiga estabelecer a direção e a velocidade do movimento pretendido pelo usuário.
Chamado de ReFIT-FK (sigla para Intenção de Feedback Recalibrada, em tradução livre), o papel do algoritmo é decodificar os sinais cerebrais. A ideia é que ele possa, futuramente, ajudar pessoas com dificuldades de movimento ou paralisia total de membros do corpo. Isso será possível porque, mesmo nessa situação, os neurônios de um indivíduo continuam a funcionar normalmente, e as células que controlam o movimento ainda disparam informações elétricas como se estivessem tentando realizar a ação. Munidos dessa informação, neuroengenheiros e cientistas do mundo todo, inclusive do Brasil, trabalham há alguns anos no desenvolvimento de próteses implantáveis que possam medir esses sinais e se moverem no lugar dos músculos inativos.
“Essas descobertas podem levar a um desempenho e robustez muito melhores das próteses implantadas em pessoas com paralisia, algo que estamos buscando ativamente como parte dos testes clínicos com a plataforma BrainGate”, adianta Shenoy, que pretende iniciar testes clínicos utilizando o sistema recém-desenvolvido.
Rápido e duradouro Além de a velocidade ter sido duplicada com o uso do novo algoritmo, a precisão é um dos maiores diferenciais do programa. Assim como na relação entre o olho humano e a mão, o ReFIT-KF consegue fazer ajustes em sua rota no momento em que a executa. “O movimento real do braço ocorre por um sistema de controle neuromotor que tem consigo a ação, sua validação e sua correção, caso não esteja correto em um primeiro momento”, explica Marcos Pinotti, coordenador do Laboratório de Pesquisa Aplicada em Neurovisão (Lapan), da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Para entender melhor, é preciso imaginar o momento em que o maior desejo de uma pessoa é acertar um perturbador mosquito durante a noite. “Se você tentar acertá-lo de uma vez, não vai conseguir. É preciso ir se aproximando aos pouquinhos, pois ele está voando aleatoriamente. Ou seja, otimizando sua trajetória no momento em que a realiza e não antes de executá-la”, continua Pinotti. Segundo ele, essa mesma lógica faz com que o dispositivo criado em Stanford se torne muitas vezes mais preciso que os anteriores. A otimização é feita em cada movimento e não na trajetória por completo.
Com o objetivo de testar o ReFIT-KF, os pesquisadores passaram a macacos a tarefa de dirigir um cursor para um alvo na tela do computador. Primeiramente, o experimento foi feito com o uso de um mouse e, depois, somente com o controle da mente (veja infografia). O caminho do cursor do ponto de partida ao alvo era reto e direto, atingindo seu objetivo duas vezes mais rapidamente que os sistemas anteriores, entre 75% e 85% da velocidade alcançada quando braços reais foram utilizados. Tamanha agilidade é resultado de uma decisão arriscada dos cientistas. Eles abandonaram métodos tradicionais do campo.
Atualmente, a maior parte da pesquisa em próteses neurais trabalha com a diferenciação de neurônios individualmente. Uma vantagem seria a criação de uma compreensão detalhada das células nervosas que controlam o movimento do braço, por exemplo. A escolha da equipe por pequenos grupos de neurônios, no entanto, trouxe um benefício não previsto: uma maior longevidade no desempenho dos sistemas. Registros de dispositivos anteriores trazem a crença de que, depois de seis meses ou um ano, eles já não podem interpretar com precisão o movimento pretendido pelo cérebro. O ReFIT, segundo o artigo, está funcionando muito bem e por mais de quatro anos após o implante.
Nenhum comentário:
Postar um comentário