VALOR ECONÕMICO - 28/01/2013
Por Cristian Klein | De São Paulo
Uma oposição desidratada - 34% menor na Câmara e 50% no Senado - e
com comportamento errático é o obstáculo que os petistas encontram no
Congresso dez anos depois de alcançar o poder. O partido de esquerda que
chegou ao governo com uma coalizão minoritária, em ambas as Casas do
Parlamento, ampliou sua base, seja pelo voto ou pela cooptação, e está
prestes a formar o maior - embora não necessariamente coeso - bloco de
apoio desde que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva passou a
ocupar o Palácio do Planalto, em janeiro de 2003.
Os dez anos do PT no poder devem coincidir com a consumação do maior
golpe na oposição, assim que a presidente Dilma Rousseff confirmar a
entrada do PSD em seu governo, na reforma ministerial esperada para as
próximas semanas. Com uma bancada de 49 parlamentares em exercício na
Câmara - a maioria de ex-adversários petistas - o PSD elevará a base
aliada para um patamar superior a 360 deputados, superando os 356
registrados no início do último gabinete do primeiro mandato do
ex-presidente Lula. Um novo gabinete é marcado pela entrada ou pela
saída de um partido do ministério ou pelo começo de um novo mandato
presidencial.
Dilma ruma para contabilizar a segunda maior coalizão desde 1988, de acordo com levantamento feito pelo Cebrap a pedido do Valor.
A maior base aliada do período, com 396 do total de 513 deputados, foi a
registrada em abril de 1996, no segundo gabinete do primeiro mandato do
ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
O amplo apoio à presidente reflete o progressivo definhamento da
oposição, num drama que revela histórias de perseverança, adesismo e
trajetórias políticas empurradas para o ostracismo.
Boa parte do grupo dos adversários mais ferrenhos quando Lula assumiu
em 2003 aderiu à era petista. É o caso de parlamentares como Inocêncio
de Oliveira (ex-DEM, hoje PR-PE), que triplicou sua taxa de apoio ao
Executivo; a ruralista Kátia Abreu (ex-DEM, hoje PSD-TO) - cotada para o
ministério de Dilma - e do então deputado Gilberto Kassab, que liderou
dissidentes do DEM, abriu um racha na oposição e fundou o governista
PSD. No princípio, Kassab estava entre os que mais se opunham aos
projetos da administração Lula.
O PSD é apenas a última das hostes colecionadas pelo PT desde 2003,
como PTB, PP e PMDB. O desembarque dos pemedebistas em 2004 trouxe
figuras antes associadas ao governo FHC, como os deputados Geddel Vieira
Lima (BA) e Henrique Eduardo Alves (RN), que por pouco não foi vice na
chapa do tucano José Serra na eleição de 2002; e o líder nacional Michel
Temer, ex-presidente da Câmara e hoje vice-presidente de Dilma
Rousseff.
Poucos persistem com a mesma verve oposicionista a exemplo dos
deputados Onyx Lorenzoni (DEM-RS) e Ronaldo Caiado (DEM-GO) e do senador
José Agripino Maia (DEM-RN).
"Alguns não resistiram e se entregaram antes do tempo. Vão se
arrepender. Vão malograr junto com o modelo equivocado do PT, que está
no fim", afirma Agripino Maia. "Sobrevivi. Não deixei meu eleitorado ser
enganado pelo canto da sereia do Lula, ou melhor, do PT", corrige o
senador, negando que a retificação seja uma precaução contra a ira do
ex-presidente. "Ele não me intimidou. Digladio com o modelo petista",
diz.
Agripino Maia foi um dos poucos sobreviventes na eleição de 2010,
quando Lula utilizou sua popularidade para derrotar seus maiores
adversários no Senado.
Entre os que aderiram ao governo petista ao longo dos últimos dez
anos, as explicações são distintas. O deputado Júlio César Lima, que
saiu do DEM e é um dos líderes do PSD no Piauí, começa a entrevista
afirmando que nunca foi "opositor ferrenho dentro do então PFL, pelo
contrário". Ao ser questionado sobre a baixíssima taxa de apoio que deu
aos projetos do Executivo em 2003, o parlamentar reconhece o giro em seu
perfil. "Começou a mudar dois anos depois [que Lula venceu], na eleição
municipal de 2004. A base cobra muito. Sou muito ligado aos prefeitos,
aos deputados estaduais, e eles não estavam conseguindo liberar as
verbas federais. Vinham e me pediam. Além disso, o pessoal nosso já
estava indo para o PT, que também havia ganho o governo estadual, em
2002, com o Wellington Dias", conta o deputado.
Seu colega de partido e de Câmara, Eduardo Sciarra, do Paraná, também
saiu do DEM, onde era um dos mais combativos oposicionistas ao governo
do PT. Sua explicação para a mudança, porém, é outra. O problema era
Lula, e não sua sucessora. "Tive atuação bem crítica durante o governo
Lula. Mas com relação à Dilma tenho outro posicionamento. Ela facilitou o
apoio, com sua rigidez na questão ética, com o foco na gestão. O PT,
com Lula, não fazia investimento em infraestrutura e por questões
ideológicas não realizava as concessões de aeroportos e rodovias",
afirma Sciarra, que será o próximo líder do PSD na Câmara.
O parlamentar diz que não aderiu ao governo federal por causa de
pressões da base e que sua maior votação foi em 2010, quando conquistou o
terceiro mandato.
Mesma sorte não teve o ex-deputado Arnaldo Madeira (PSDB-SP), um dos
personagens mais representativos do tucanato que foi líder do governo
FHC na Câmara. Madeira não faz parte nem do grupo dos cooptados nem dos
sobreviventes. Está entre os medalhões que saíram de cena após derrota
eleitoral, como o ex-senador Tasso Jereissati (CE), que hoje preside o
Instituto Teotônio Vilela (ITV), a fundação do PSDB cujo nome é uma
homenagem ao pai do governador de Alagoas, Teotônio Vilela Filho.
Madeira aponta o recente apoio do governador tucano a Lula como um
dos maiores indicadores do nível de enfraquecimento a que chegou a
oposição. Em dezembro, Teotônio Vilela Filho participou do ato de
solidariedade feito por governadores que visitaram o petista. O
ex-presidente estava às voltas com as denúncias que envolviam sua
ex-chefe de gabinete no escritório da Presidência em São Paulo, Rosemary
Noronha, e com a divulgação do depoimento ao Ministério Público no qual
o publicitário Marcos Valério dizia que Lula sabia do esquema do
mensalão.
"Essa visita tem um significado forte do ponto de vista político. O
[ex-]presidente terá que se defender na Justiça. Não é a oposição que
deve defendê-lo. O governo está nadando de braçada e a oposição está
muito frágil. Faz crítica pedindo desculpa. Onde já se viu, numa
democracia, um opositor justificar que está fazendo uma crítica não ao
país, mas ao governo? É o que tem acontecido", afirma Madeira.
O ex-deputado não credita sua derrota nas urnas à virulência contra o
PT, mas a um esgotamento de seu nome junto ao eleitorado, que teria
procurado novos candidatos. Arnaldo Madeira defende que um dos maiores
problemas da oposição é exatamente não fazer um discurso bem formulado e
contundente - embora acredite que no Brasil, em geral, "o próprio povo
tem certa vocação governista".
"Não se conquista a opinião pública da noite para o dia. É um
processo. Se está com a tese correta, um dia ganha. Mas mesmo quando
éramos governo setores do PSDB tinham dúvidas se estávamos na direção
certa. O programa não era defendido com convicção. Precisou o PT vencer e
assumir nossas bandeiras para se perceber que Fernando Henrique tinha
razão", afirma Madeira.
O quadro teria piorado quando a oposição, PSDB à frente, passou a
fazer uma "imitação do discurso social do PT, a competir na mesma área".
"Isso revela a fragilidade conceitual. Ao se preocupar em não passar a
imagem de elitista, meteu-se numa sinuca de bico", conclui o
ex-deputado.
O diagnóstico pessimista é compartilhado por um dos principais
representantes da oposição à esquerda do PT, o senador Randolfe
Rodrigues (PSOL-AP). "Desde a ditadura militar, nunca um governo teve
tanto apoio como este", afirma.
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