Carolina Cotta
Estado de Minas: 28/01/2013
Quantos astrônomos você conhece? A astronomia não tem a popularidade de outras ciências, apesar de ser a mais antiga da humanidade, mas esse cenário está mudando. E muito mais rápido do que muita gente imagina. O número de pesquisadores filiados à Sociedade Astronômica Brasileira (SAB) cresceu consideravelmente nos últimos anos, chegando a mais de 700. O Brasil é hoje referência na América do Sul e por causa de convênios internacionais está conquistando espaço no cenário mundial. Ensino e pesquisa andam lado a lado nesse progresso em que os investimentos crescem, apesar de haver vários aspectos a melhorar. Mas os especialistas ligados aos principais centros de astronomia comemoram os investimentos que têm sido feitos.
Um dos crescimentos está na área de formação: o Brasil tem hoje programas de pós-graduação específicos em astronomia ou astrofísica, caso da Universidade de São Paulo (USP), Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Observatório Nacional (ON) e Universidade Cruzeiro do Sul (só mestrado). Em outras instituições a formação é atrelada aos programas de física, como na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Segundo Jaílson Alcaniz, coordenador de astronomia e astrofísica do ON, ligado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), há 15 anos a pesquisa se concentrava no Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Sul e Rio Grande do Norte. Hoje há grupos no interior da Bahia e de Minas Gerais, caso do Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), em Itajubá.
E em campo, o perfil do trabalho dos astrônomos também está mudando: os pesquisadores brasileiros não se limitam mais à observação. Agora, participam também do desenvolvimento de novas tecnologias. Há ainda mais investimento e colaborações internacionais. As três maiores são gerenciadas pelo Observatório Nacional, caso da The Dark Energy Survey (DES), da Sloan Digital Sky Survey (SDSS) e da Javalambre Physics of the Accelerating Universe Astrophysical Survey (J-PAS). Nesse último, em parceria com a Espanha, o Brasil está construindo um telescópio. Na Inglaterra, nosso país tem a responsabilidade de gerenciar a construção da maior câmera do mundo – capaz de observar milhões de galáxias. “O objetivo é desvendar questões associadas à energia escura, mecanismo que faz com que a expansão do universo seja acelerada”, diz Alcaniz.
O país se destaca consideravelmente em cosmologia física, que descreve o universo em grande escala e se dedica a compreender a aceleração de sua expansão. Também é muito forte a pesquisa em astrofísica estelar, que estuda a evolução das estrelas. Mas a astronomia é bem mais ampla. Segundo Jaílson Alcaniz, cada área estuda especificamente uma classe de objetos ou um regime de evolução no universo. “Tem gente estudando esteroides e formação de planetas; astrofísica estelar, que observa a evolução e a criação das estrelas; astrofísica galáctica, que estuda os vários fenômenos envolvendo aglomerados de galáxias. Existem ainda os cosmólogos, que estudam o universo como um todo, da criação à sua evolução.”
Coordenadora da pós-graduação em astrofísica do Inpe, uma das mais antigas do país, Cláudia Vilega Rodrigues ressalta ainda a dedicação a outras áreas, como a radioastronomia e a astronomia de raio x. No Inpe são realizadas pesquisas teóricas e de modelos, além de instrumentação, que é o desenvolvimento de tecnologia para a observação e coleta de dados. “Não temos laboratórios como os químicos, por exemplo. O astrônomo olha para o céu, e da luz que vem das estrelas tira informações. Os objetos astrofísicos emitem luz infravermelha, ótica, raios X e raios gama. Mas no Brasil, por causa do Observatório Pico dos Dias, em Minas Gerais, que alavancou nossa ciência, é a astronomia ótica a mais popular.”
Faltam recursos humanos
A contribuição brasileira não é concentrada em uma única área. “Temos pesquisas em todas as grandes áreas da astronomia, o que acho saudável. Elas podem ser maiores em algumas áreas, mas não podemos falar em concentração. Isso vai de encontro com a distribuição da pesquisa internacional”, acrescenta Cláudia Rodrigues, do Inpe. Para a pesquisadora, a astronomia brasileira cresceu muito – e tem doutores espalhados pelo mundo inteiro – mas pode crescer mais. “Temos potencial para aumentar nossa contribuição na astronomia mundial. Os números só crescem e talvez por isso nosso desafio futuro é aumentar não só a quantidade de publicações, mas também a qualidade. Outro desafio é assumir um papel de liderança nas colaborações, o que já está começando.”
No Laboratório Nacional de Astrofísica (LNA), que com o Inpe e o ON completa a estrutura do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) na área, também existem desafios. Para Alberto Rodríguez Ardila, chefe da coordenação de apoio científico do instituto dedicado à instrumentação, os entraves para um maior progresso da astronomia no país são basicamente dois: burocracia e falta de recursos humanos. “No primeiro caso, o longo processo que deve ser realizado para a compra de peças não fabricadas no país, aquisição de equipamentos, exportação de instrumentos ou partes deles é altamente desgastante e nos deixa em uma posição pouco competitiva em relação a outros países que atuam na mesma área.”
A simples compra de um componente indispensável para um instrumento fabricado no LNA pode levar até seis meses. Isso provoca atrasos incríveis no planejamento inicial. Inclusive, a compra de material no Brasil é também altamente burocrática, sendo que a duração desses processos se mede em meses. No segundo caso, a falta de vagas para suprir as necessidades de pessoal científico e de alta qualificação técnica no LNA é crônica. “Passam-se anos até se ter o aval do MCTI para contratar funcionários nessas duas áreas. Isso impede que o LNA possa entrar em novos projetos e parcerias, já que o quadro atual de recursos humanos é insuficiente para atender a demanda.” O mesmo ocorre no Inpe, onde há 10 anos não há concurso para a área de astrofísica.
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