sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Editoriais FolhaSP

FOLHA DE SÃO PAULO

Apenas uma fração
Procurador-geral afirma que esquema do mensalão era muito mais amplo e que a denúncia incluiu somente o que era possível provar
Foram 53 sessões ao longo de quatro meses. Mais de 250 horas de julgamento. Um processo que acumulou pelo menos 50 mil páginas, sem contar os votos dos ministros, e resultou na condenação de 25 dos 37 réus.
Diante de cifras dessa magnitude, é espantosa a afirmação do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, de que o esquema do mensalão era sem dúvida "ainda muito mais amplo do que aquilo que constou da denúncia".
O assombro não se justifica só pelo fato de que essa ponta de iceberg já tenha dado ensejo ao maior julgamento da história do Supremo Tribunal Federal.
Segundo informações reunidas pela Procuradoria-Geral da República, o mensalão mobilizou R$ 141 milhões em dois anos, esquema alimentado por verbas públicas com a finalidade de comprar o apoio de parlamentares durante o primeiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
É perturbador imaginar que o volume de recursos públicos desviados seja "muito mais amplo", mesmo que Gurgel evite dizer que fração do total o montante conhecido representava. Não é menos sinistra a perspectiva de que mais congressistas tenham sido corrompidos. E tudo isso ficou impune.
Com certa resignação, o atual procurador-geral reconhece que constou da denúncia apenas "o que foi possível provar, com elementos razoáveis". Mas a estratégia adotada por seu antecessor, Antonio Fernando Souza, mostrou-se "corretíssima", avalia Gurgel.
Não é difícil intuir que, não tivesse sido limitado o escopo da investigação, talvez o julgamento jamais chegasse a um fim. O próprio presidente do STF e relator do processo do mensalão, Joaquim Barbosa, admitiu ter duvidado de que a corte conseguiria concluir a ação penal.
O êxito, porém, apenas será completo se o julgamento se transformar num verdadeiro divisor de águas na repressão aos crimes de colarinho-branco. O processo do mensalão restará diminuído se permanecer como um caso à parte na longa história de impunidade que acompanha a corrupção no Brasil.
Tem razão Gurgel, pois, ao cobrar a "efetividade" do julgamento. O desafio mais premente diz respeito à cassação dos deputados federais condenados pelo esquema. Ainda que em tese seja possível discordar da interpretação dada pelo STF à Constituição, daí não decorre que uma decisão da corte possa ser desrespeitada.
O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), presta enorme desserviço ao insistir na divergência com o Judiciário, tanto com relação à competência para cassar deputados quanto no que tange a eventual nova investigação sobre Lula. Melhor faria ao país se reconhecesse que, nesses dois casos, tem de ser da Justiça a última palavra.

    EDITORIAIS
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    Contradição parlamentar
    Não chega a causar surpresa o fato de que a maior parte dos senadores tenha decidido embolsar o dinheiro do 14º e 15º salários que o Congresso paga aos parlamentares, mesmo após o Senado ter aprovado -por unanimidade- o fim desse benefício extraordinário.
    Os adicionais, que somam R$ 53,4 mil ao ano, ainda são pagos porque os deputados não aprovaram sua extinção e ainda são recebidos porque os senadores não parecem ver nisso uma contradição.
    Criados na década de 1940, os salários extras justificavam-se como ajuda para que os parlamentares voltassem a seus Estados de origem. Hoje, porém, o Legislativo já paga as passagens aéreas. Até os próprios senadores reconhecem o absurdo dessa vantagem.
    Quando a existência dessas ajudas de custo foi colocada em votação, em maio, nenhum senador apoiou a manutenção do benefício, e alguns até ousaram fazer discursos inflamados contra ele.
    Nada obstante, chegada a hora de passar das palavras aos atos, ou da tribuna ao bolso, apenas 13 dos 81 senadores julgaram oportuno devolver o dinheiro recebido.
    Entre eles, representantes de diversos partidos, como Cristovam Buarque (PDT-DF), João Capiberibe (PSB-AP), Pedro Taques (PDT-MT), Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) e Lindbergh Farias (PT-RJ).
    Alguns baluartes da ética escorregaram no episódio. O senador Eduardo Suplicy (PT-SP), por exemplo, só decidiu devolver o adicional após a publicação de reportagem desta Folha. Outros arautos dos bons costumes, contudo, permanecem em silêncio, mas a assessoria do Senado informa que ainda há tempo para que todos possam devolver o pagamento.
    Seria bom que o fizessem logo, não só por razões éticas, mas para evitar a reedição do imbróglio acerca da cobrança do Imposto de Renda sobre os adicionais.
    Como a Mesa Diretora do Senado sustentava o curioso entendimento de que esses rendimentos não eram tributáveis, o desconto não era feito. A Receita Federal, contudo, cobrou os valores devidos. O presidente do Senado, José Sarney, reconheceu o erro e disse que cada senador pagaria a sua dívida. Alguns assim procederam, mas muitos protestaram.
    O Senado, então, decidiu usar dinheiro público (R$ 5 milhões) para quitar as dívidas de senadores e ex-senadores desde 2007. Débitos, vale lembrar, originados por benefícios que nem deveriam existir.

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