domingo, 10 de fevereiro de 2013

Bisneto de Joaquim Nabuco contesta artigo de Luiz Felipe de Alencastro

folha de são paulo

RÉPLICA
Abolicionista convicto
Nabuco e o fim do tráfico de escravos
RESUMO Bisneto de Joaquim Nabuco contesta artigo de Luiz Felipe de Alencastro, segundo o qual o autor de "Minha Formação" renegou seus escritos abolicionistas ao endossar atos de seu pai, ministro do Império, para legalizar a posse de 750 mil escravos trazidos ao país depois de 1831, data da proibição do tráfico negreiro no país.

PEDRO NABUCO

QUANDO, EM 1849, o ministro da Justiça do Império Eusébio de Queirós (1812-68) debruçava-se sobre a questão do tráfico de escravos -que não cessara em nosso país, a despeito da lei de 1831 que o proibira, decretada por Diogo Feijó em virtude de exigências do tratado de 1826 com a Inglaterra, quando aquele país reconhecia a nossa independência-, escreveu um memorando em que se lia:
"Para reprimir o tráfico de africanos no país sem excitar uma revolução faz-se necessário: 1º. atacar com vigor as novas introduções, esquecendo e anistiando as anteriores à lei; 2º. dirigir a repressão contra o tráfico no mar, ou no momento do desembarque, enquanto os africanos estão em mãos dos introdutores."
No ano seguinte, 1850, a Câmara votou projeto do Senado, e Eusébio de Queirós promulgou nova lei reprimindo o tráfico e o seu comércio hediondo de seres humanos.
Entre 1831 e 1850, Brasil e Inglaterra haviam se empenhado em luta diplomática em torno do tráfico nefasto. Em 1845 os ingleses aprovaram o Bill Aberdeen, perseguindo os navios negreiros em nossos portos, mas deixando-os passar livremente em navios com o pavilhão dos Estados Unidos.
O artigo inicial da lei de 1850 remetia-se à lei anterior, mandando apreender navios brasileiros em qualquer parte, navios estrangeiros em nossos portos, "tendo a seu bordo escravos, cuja importação é proibida pela lei de 7 de novembro de 1831".
Em "O Abolicionismo" (1883), Joaquim Nabuco (1849-1910) anotou: "O mesmo estadista, no seu célebre discurso de 1852, procurando mostrar como o tráfico somente acabou pelo interesse dos agricultores, cujas propriedades estavam passando para as mãos dos especuladores e dos traficantes, por causa das dívidas contraídas pelo fornecimento de escravos, confessou a pressão exercida, de 1831 a 1850, pela agricultura consorciada com aquele comércio, sobre todos os governos e todos os partidos".
José Thomaz Nabuco de Araújo, pai de Joaquim, sucedeu a Eusébio como ministro da Justiça, tomando medidas que fulminaram o tráfico, como subtrair do júri popular o julgamento dos traficantes, porque nas pequenas localidades os jurados eram ameaçados e terminavam por absolver os criminosos. O que fez foi dar efeito à lei de 1850, perseguindo os cúmplices do último grande desembarque de escravos que se tem notícia no Brasil, ocorrido na praia pernambucana de Serinhaém, em 1853.
Em "Um Estadista do Império", publicado por Joaquim Nabuco em 1897, encontra-se a carta ao presidente da província de São Paulo a que se referiu, no texto "A Guerra Civil, lá e cá" ("Ilustríssima" de 27/1), Luiz Felipe de Alencastro. A missiva é datada de 1854, ano seguinte, portanto, a Serinhaém e mais de duas décadas após a lei de 1831.
Em seu livro "Da Senzala à Colônia", no qual se colhe citação da mesma carta, a historiadora Emília Viotti da Costa, conclui: "Apesar de tudo, a lei de 1850 teve resultados mais felizes do que a de 1831. O tráfico acabou por cessar definitivamente. Os efeitos dessa interrupção, entretanto, só se farão sentir dez anos depois".
Ao homenagear Abraham Lincoln em seu centenário, no ano de 1909, Joaquim Nabuco, então embaixador do Brasil em Washington, enfatizou o caráter de movimento civil na luta final da Abolição no Brasil.

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