Unidades de longa permanência para doentes crônicos tornam-se alternativa a hospitais em São Paulo
É um movimento que começa a ganhar força no Estado de São Paulo, com a abertura recente de ao menos seis clínicas com esse perfil.
Nos EUA e na Europa, as chamadas unidades de longa permanência ("Long-Term Acute Care Hospitals") são uma realidade há décadas e fazem parte dos sistemas público e privado de saúde.
Um paciente vítima de AVC (Acidente Vascular Cerebral), por exemplo, fica em um hospital geral apenas na fase crítica. Quando o quadro de saúde se estabiliza, uma opção é encaminhá-lo para as unidades de doentes crônicos.
Segundo a literatura médica, com isso os hospitais têm maior rotatividade de leitos, e os pacientes, uma atenção mais individualizada e mais chances de reabilitação.
"É um tipo de negócio atraente para as operadoras [de saúde] e para os prestadores [hospitais e clínicas]. O Brasil nunca teve políticas voltadas a esse tipo de necessidade", afirma a médica Ana Maria Malik, coordenadora do GVsaúde, núcleo de saúde da Fundação Getúlio Vargas.
Para analistas do setor, a demanda tende a aumentar no país em razão do envelhecimento populacional e da falta de leitos hospitalares, intensificada pela entrada de mais usuários no sistema suplementar de saúde.
Mas o modelo ainda enfrenta falta de regulamentação e resistência. "Há um grande desconhecimento. Muitos médicos pensam que essas unidades sejam depósitos de paciente, que o cuidado será ruim", afirma o oncologista Agnaldo Anelli, diretor da clínica Althea, na zona leste de São Paulo.
Estudos norte-americanos mostram o contrário: unidades de longa permanência (quando bem estruturadas)oferecem, por exemplo, maior controle de infecções.
"É fundamental ter um plano de continuidade do cuidado do paciente fora do hospital. Só assim a família e o médicos se sentirão seguros", diz o médico Frederico Berardo, diretor clínico da Premium Care, na zona sul.
CONFLITOS
Há também outro tipo de conflito em jogo: a remuneração. Nos hospitais, os médicos visitam numa manhã vários pacientes e chegam a receber até R$ 1.000 por visita. Ou seja, não seria vantajoso para ele visitar esse paciente em um local externo.
Segundo Cláudio Lottenberg, presidente do hospital Albert Einstein, o atual modelo de remuneração favorece esse tipo de conflito à medida que os médicos recebem dos planos um valor fixo, não importando o desempenho (o resultado do tratamento).
Ele tem debatido com os médicos do Einstein modelos de assistência fora do hospital, como o "home care" e as unidades de crônicos.
Mas lembra que, para "girar leitos", os hospitais precisam melhorar os fluxos. "Há demora para fazer exames, por exemplo, o que aumenta o tempo de permanência do paciente no leito."
Rapaz tetraplégico teve melhora em clínica
DE SÃO PAULOUma piscada forte quer dizer sim. Duas piscadas fortes querem dizer não. É dessa forma que Thiago Ribeiro, 25, se comunica há um ano.Em janeiro de 2011, ele sofreu um grave acidente de carro, teve um trauma craniano e ficou tetraplégico. Também perdeu a fala e os movimentos dos membros.
Entre as idas e vindas do quarto para a UTI foram 360 dias de internação em um hospital geral de São Paulo.
Em razão da internação prolongada, perdeu quase toda a massa muscular.
Por falta de fisioterapia, os membros se retraíram, fazendo com que ele ficasse com uma posição próxima à fetal.
Era mantido assim por longas horas, o que resultou em úlceras que necrosaram a pele da região sacral e da bacia.
Em janeiro do ano passado, foi encaminhado para uma casa de doentes crônicos, ainda precisando de ventilação mecânica. Tinha uma traqueostomia (orifício artificial na traqueia).
"Quando o recebemos, ele pesava 38 kg", lembra a fisioterapeuta Telma Busch.
Ela conta que nos primeiros atendimentos percebeu que o rapaz compreendia o que se passava ao seu redor. Foi então estabelecida a comunicação por piscadas.
"Pudemos perceber se ele recebia a quantidade adequada de analgésicos, se a posição estava confortável ou se ele queria mudar o canal da televisão", explica.
A equipe tenta conseguir a doação de um sistema de computador que melhore a comunicação com Thiago.
Com sessões intensivas de fisioterapia e fonoaudiologia, ele conseguiu se livrar da traqueostomia e já mexe os braços, antes inertes.
Com a nutrição adequada, ganhou seis quilos, e as feridas estão cicatrizadas. Para prevenir o surgimento de novas úlceras, ele é trocado de posição a cada duas horas, mesmo à noite.
A mãe de Thiago, Rosana Ribeiro, diz que os cuidados que o filho recebe na clínica são "infinitamente melhores" do que os que recebia no hospital. "Lá, ele era mais um. Vivia rígido, não mexia nada e não respondia aos chamados. Agora, até dá gargalhadas, especialmente quando o assunto é o time do coração."
Então, você é corintiano?, pergunto. Uma piscada bem forte é a resposta.
Nenhum comentário:
Postar um comentário