quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Quero ser Broadway - Gustavo Fioratti


Folha de São Paulo
'O Rei Leão' inaugura novo patamar de investimento em musicais no país com custo de R$ 50 milhões
GUSTAVO FIORATTIDE SÃO PAULOEstá aberta a temporada de musicais de São Paulo, e os orçamentos não são tímidos. É verdade que timidez nunca foi uma qualidade desse gênero consagrado na Broadway, em Nova York, mas as cifras deste ano prometem versões ainda mais robustas do que em anos anteriores.
A começar pela chegada, no dia 28 de março, no teatro Renault, do musical "O Rei Leão". A versão brasileira para a produção da Disney tem custo estimado em R$ 50 milhões, segundo a T4F, responsável pela montagem.
O sucesso das temporadas de "Mamma Mia!" e de "A Família Addams" determinou a aposta. "Existe demanda sólida pelo teatro musical. O público criou o hábito de frequentá-lo", diz Stephanie Mayorkis, diretora de um departamento chamado "family entertainment".
O crescimento do setor, conclui ela, "dependerá da disponibilidade de novos teatros e da criação de uma base de público ainda maior no médio e longo prazo".
Do valor total da produção, R$ 11 milhões foram captados via Lei Rouanet. O restante, diz Mayorkis, será custeado por receita gerada pelo próprio musical a partir de bilheteria e merchandising. Nos nove meses de temporada, estima-se que a venda de ingresso totalize R$ 31 milhões. Os ingressos custam entre R$ 50 e R$ 280 e estão à venda no site ticketsfortun.com.br.
Para equilibrar as contas, a temporada pode ser prorrogada até 2014.
As cifras não são só um recorde entre musicais nacionais. O valor de produção da peça sobre o leão Simba, com letras assinadas por Gilberto Gil e música de Elton John, supera inclusive filmes como "Tropa de Elite 2", orçado em cerca de R$ 15 milhões.
O investimento acompanha a expansão do cenário. Com a estreia de "O Mágico de Oz", no teatro Alfa, na sexta (ingressorapido.com.br), e de "Quase Normal", amanhã, no teatro Faap (faap.br/teatro), o circuito paulistano chega mais perto do sonho de ser Broadway.
"O cenário de musicais está bem favorável, mas a concorrência atual é enorme", lembra o diretor Cláudio Botelho, de "O Mágico de Oz".
Nos R$ 50 milhões de "O Rei Leão" estão embutidos negociações sobre direitos autorais (o que inclui viagens para o exterior), o período de produção da peça e a temporada de nove meses.
Também entram na conta valores destinados à divulgação do espetáculo, dos quais R$ 2,24 milhões são subsidiados via Lei Rouanet, segundo consta no projeto enviado ao Ministério da Cultura.
Se houve inchaço nos orçamentos, a captação de recursos incentivados não subiu na proporção. Contra os R$ 11 milhões captados pela peça "O Rei Leão", "Mamma Mia!", em 2010, captou 12,6 milhões. Em 2011, "A Família Addams" custou R$ 25 milhões, com R$ 11,3 milhões de recursos via Lei Rouanet.
A aposta em "O Rei Leão" é grande e pode ser explicada pelo enorme sucesso que o espetáculo teve no mundo.
Em abril do ano passado, o musical da Disney bateu recorde histórico de bilheteria em Nova York, com receita de US$ 853,8 milhões.
Desde sua estreia em 1997, o musical foi visto por 66 milhões de pessoas em 15 países.
A produtora norte-americana não divulga o orçamento da produção de "O Rei Leão" nos EUA. Os aportes por lá, no entanto, também estão ganhando volume.
A produção de "Spider-man" (Homem-Aranha), por exemplo, já ultrapassou as cifras dos US 100 milhões.

    Temporada curta é vilã dos musicais daqui
    DE SÃO PAULOApós analisarem os valores de produção e captação de musicais, dois diretores de teatro não musical debateram sobre os recursos que o gênero capta via Lei Rouanet.
    Para Aderbal Freire-Filho, empresas de entretenimento devem ser incentivadas a se aperfeiçoarem nas suas relações com o mercado.
    "Não digo que não devam ter algum tipo de apoio na fase em que ainda estamos. Mas que sejam incentivadas a alcançar logo o que é a vocação delas: um grande negócio, o negócio do entretenimento."
    Freire-Filho explica que boa parte do teatro americano é subvencionado, mas essa regra não se aplica aos espetáculos da Broadway.
    Grupos do circuito alternativo americano, como La Mama e Wooster Group, dependem de fundações, mecenatos ou incentivos públicos. "Não é o caso da Broadway, que precisa do lucro, quer o lucro, merece o lucro. Sem subvenções."
    A boa receita desses espetáculos, lembra Cláudio Botelho, diretor do espetáculo "O Mágico de Oz", depende da extensão de suas temporadas, em geral muito maiores nos EUA do que as temporadas brasileiras.
    REI DA SELVA
    Para conseguir cifras na casa dos US$ 853 milhões (em abril de 2013), "O Rei Leão" ficou 15 anos em cartaz nos EUA. Em Nova York, o ingresso custava entre US$ 80 (R$ 152) e US$ 142 (R$ 270). No Brasil, a entrada varia de R$ 50 a R$ 280.
    Segundo Aniela Jordan, diretora da Aventura Entretenimento, produtora de "O Mágico de Oz", musicais da Broadway dão lucro apenas no terceiro ano da temporada. "Nossas temporadas são curtas. Por isso dependemos de patrocínio e leis de incentivo", defende. "Na Broadway é possível fazer temporadas longas porque por lá passa gente do mundo inteiro. Ou seja, eles têm público."
    Produzida pela Aventura, "O Mágico de Oz" custou R$ 9 milhões, incluindo quatro meses no Rio de Janeiro e quatro meses em São Paulo. Na capital carioca, atingiu 90% de sua lotação, mas a bilheteria não é suficiente para gerar lucro, diz Jordan. "A meia entrada é nosso vilão".
    Para Sérgio de Carvalho, diretor da Cia. do Latão, "a lei autoriza o 'privatismo' no uso do dinheiro público em nome de uma ideia cada vez mais mercantilizada de cultura".
    "Falta senso de importância: com R$ 13 milhões, seria possível sustentar a base de um grupo como o Teatro da Vertigem ou a Companhia do Latão por dez anos."

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