Gustavo Werneck / Enviado especial
Estado de Minas: 10/05/2013 04:00
Em 2013, quando a igreja completa 270 anos do início da construção e passa por obras, principalmente na cobertura, o pároco se entusiasma com o projeto de recuperação do instrumento, considerado muito importante pelos especialistas para que a cidade participe de um roteiro musical incluindo São João del-Rei, Tiradentes e Mariana.
Minas e Bahia são os estados com maior número de órgãos musicais do século 18 e início do 19 preservados. Aqui há o de Mariana em perfeito funcionamento na Catedral da Sé e um dos principais atrativos turísticos da Região Central; de Tiradentes, nos Campos das Vertentes, restaurado há quatro anos e meio e expoente da Matriz de Santo Antônio; de São João del-Rei, pronto há dois anos e quatro meses; de Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, que deverá ser reinaugurado até o fim do ano; e do distrito de Córregos, em Conceição do Mato Dentro, ainda em compasso de espera.
Até ser redescoberto, o instrumento de Barbacena passou por caminho sinuoso, sempre dentro da Matriz da Piedade, perdendo totalmente a função litúrgica – tocar durante as missas, casamentos e demais celebrações no templo, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Desmontadas, as peças foram levadas para a parte de baixo da torre da igreja, onde hoje se encontra a imagem francesa da padroeira.
Padre Geovane explica que no fim da década de 1990, “graças à sensibilidade do então pároco padre Paulo Dionê Quintão”, o instrumento foi remontado apenas para compor o espaço físico do coro. “Não durou muito, foi guardado na torre esquerda do sino e abandonado novamente”.
“Está em condição precária”, lamenta o pároco, ao mostrar a caixa de 2,20m de altura por 2 de largura, com tubos ornamentais pintados de dourado e uma cruz no alto. “Felizmente, sobraram alguns tubos de chumbo, que serão referência para a confecção dos novos”, comemora. Moradores mais antigos nunca ouviram o som do instrumento. Nascida e criada em Barbacena, Lygia Stella de Araújo Lima, de 98 anos, é testemunha de que o órgão está calado. “Gostaria muito de ouvi-lo, quem sabe fica pronto e vou à igreja ver a apresentação de um concertista”, diz Lygia.
ESPECIALISTA Considerada uma das maiores especialistas do país, a organista e professora de música Elisa Freixo, que divide suas atividades entre Mariana e Tiradentes, já avaliou três vezes o órgão. Ela aguarda pesquisas mais apuradas para identificar a época e local de fabricação do instrumento, mas acredita que seja do início do século 19 e produzido no país.
O primeiro passo do projeto de restauração é a igreja se responsabilizar pela criação de uma comissão, seguindo-se a avaliação das condições por um organeiro (técnico) e posterior busca de recursos, via lei de incentivo. “Este órgão é importante, tem valor histórico. A restauração não é simples, o instrumento está bem ‘machucadinho’, mas poderá voltar a tocar”, afirma Elisa, lembrando que, ao serem mandadas para restauro, as peças são medidas, descritas, limpas e embaladas.
Fiéis ajudam na revitalização
A festa dos 270 anos do Santuário de Nossa Senhora da Piedade ocorre tradicionalmente em 9 de dezembro, mas, como cairá numa segunda-feira, será no domingo, avisa o padre Geovane. Ele está mais do que empenhado na recuperação da cobertura da igreja, com uma campanha para troca de 36 mil telhas, substituição de calhas e das as ripas, com reparos no forro das capelas laterais As obras começaram há duas semanas, orientadas pelo Iphan. Os serviços do telhado estão orçados em R$ 250 mil e até agora a paróquia conseguiu R$ 132 mil de doações.
“Este é o início da revitalização do santuário, que terá sistema de proteção contra raios, pintura externa e recuperação do adro. A campanha continua e é sempre bom lembrar que precisamos de 36 mil telhas, para evitar goteiras e infiltrações”, diz o padre. Quem quiser ajudar pode deixar a oferta no Santuário da Piedade, na secretaria paroquial ou fazer depósito na conta 87000-5, no Banco do Brasil, agência local. O santuário ficará aberto até junho. De julho a dezembro, por segurança, missas, casamentos e batizados serão na Capela do Educandário. A restauração dos elementos artísticos está programada para 2014.
SONS DE MINAS
MARIANA
Primeira vila, cidade, diocese e capital de Minas, Mariana tem boa referência na história dos órgãos musicais. Na Catedral da Sé está o instrumento construído no século 18, em Hamburgo (Alemanha), por Arp Schnitger (1648-1719). Enviado a uma igreja franciscana em Portugal, o órgão chegou ao Brasil em 1753, como presente da Coroa portuguesa ao primeiro bispo da cidade. Entre os exemplares sobreviventes da manufatura Schnitger, trata-se de um dos mais bem conservados e o único que se encontra fora da Europa.
SÃO JOÃO DEL-REI
Construído na segunda metade do século 18, com jacarandá, cedro e pau-pereira, madeiras dos Campos das Vertentes, o órgão de São João del-Rei foi restaurado e ficou pronto há dois anos e quatro meses. Inicialmente, pertenceu a uma fazenda da região e depois à Ordem Terceira do Carmo. Desde 1963, o instrumento, que tem o estilo de um armário, ficou sem funcionamento e depois foi guardado na biblioteca do museu administrado pelo Iphan, no Centro Histórico da cidade.
TIRADENTES
O órgão musical da Matriz de Santo Antônio é um dos primores barrocos de Minas e do circuito da Estrada Real. Com a caixa em estilo rococó, tem oito fileiras de tubos, com 632 flautas feitas de uma liga de estanho e chumbo, douramentos na saída do som e corpo prateado, um teclado, dois foles com cerca de 1,20m de diâmetro cada (aberto) e duas alavancas. A caixa de madeira do século 18, de 5m de altura por 3m de largura, foi feita em Tiradentes, a partir de um desenho do entalhador Salvador de Oliveira.
DIAMANTINA
A joia musical de Diamantina, no Vale do Jequitinhonha, saiu da cabeça e das mãos do padre Manoel de Almeida Silva, entre 1782 e1787, quando a cidade ainda era Arraial do Tejuco. O instrumento obedece aos parâmetros construtivos da arte ibérica, com influência italiana, como era costume em Portugal. No histórico da peça está o seu uso pelo compositor José Joaquim Emerico Lobo de Mesquita (1746-1805), que foi organista na Igreja do Carmo entre 1787 e 1794. As peças para recuperação do instrumento, vindas da Espanha, já estão na alfândega.
CONCEIÇÃO DO MATO DENTRO
No distrito de Córregos, a 40 quilômetros de Conceição do Mato Dentro, no Caminho dos Diamantes da Estrada Real, está em compasso de espera a recuperação do órgão da Matriz de Nossa Senhora Aparecida. A peça esculpida em cedro tem pouca documentação. Em 1905, o instrumento passou por um restauro. Originalmente, o órgão da igreja de Córregos, templo católico tombado pelo Iphan, tinha 329 tubos, sendo 235 de metal e 94 de madeira. Hoje restam 118. No teclado há 47 notas.
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