sexta-feira, 10 de maio de 2013

Filme canadense lança com eficácia questões relevantes de educação

folha de são paulo

CRÍTICA - DRAMA
Filme canadense lança com eficácia questões relevantes de educação
Longa mostra professor com métodos tradicionais que desafia a divisão entre atribuições de escola e de família
DO CRÍTICO DA FOLHAEm dado momento de "O que Traz Boas-Novas", o pai de uma aluna diz ao professor, textualmente, que sua função é ensinar, não educar. É sobre essa dúvida que, parece, o canadense Philippe Falardeau articula seu filme.
A crer nesse pai, educar é uma tarefa privada: valores, comportamento etc. são da alçada doméstica. O ensino, língua, contas etc. seriam atribuições do professor.
Com isso, está lançada a confusão. A afirmação do pai é o corolário de um sistema marcado pela incapacidade de delimitar responsabilidades numa cultura em que a esfera pública e a privada já não se comunicam (não fluentemente, em todo caso).
Essa confusão desemboca, no filme, no suicídio de uma professora de escola primária. Diante da catástrofe, dois problemas se abrem para a direção: 1) como não traumatizar os alunos mais do que já estariam traumatizados; 2) como dar sequência ao ano escolar.
É quando surge M. Lazhar. Ele vem da Argélia, assume o posto porque ninguém está disposto a substituir a professora e logo surpreende os alunos com seus métodos.
Começa por colocar as carteiras nos lugares tradicionais (e não mais agrupadas "para favorecer a dinâmica do grupo" ou algo assim), dá um texto de Balzac como ditado e chega mesmo a bater na cabeça de um aluno mais irrequieto.
Lazhar é adepto, talvez intuitivo, de uma pedagogia tradicional, na qual o professor ensina, como queria aquele pai, mas também deve ajudar os alunos a cultivar valores que, teoricamente, seriam partilhados também pelos pais (pois dizem respeito à sociedade, não à família ou ao indivíduo).
Os problemas, é claro, aparecerão de vários lados (inclusive alguns que será melhor omitir aqui). O essencial, no entanto, é que "Boas-Novas" propõe-se a discutir uma questão que surgiria a partir de um certo tipo de ideologia pedagógica (liberdade para crianças, constrangimentos vários para seus mestres), mas logo se revela um problema cultural mais amplo.
Daí a presença do mestre argelino constituir uma bela ferramenta narrativa. Com suavidade, induz o espectador a questionar uma sociedade avançada que pode estar se mostrando mais atrasada ou conservadora do que culturas tradicionais (ou antiquadas).
Mais: que a vida escolar pode revelar sinais de desagregação cultural mais profunda.
Se não é o melhor cinema do mundo, este ao menos lança suas questões eficazmente.

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