sexta-feira, 10 de maio de 2013

Retrato que a diretora Petra Costa faz da irmã suicida exagera na doçura em certas cenas, mas vale pelo ritmo vertiginoso

folha de são paulo

CRÍTICA - DOCUMENTÁRIO
"Elena" traz jorro de imagens impressionistas
FILME TEM RITMO VERTIGINOSO, EM QUE AS IMAGENS FLUEM COMO UM RIO CAUDALOSO
SÉRGIO ALPENDRECOLABORAÇÃO PARA A FOLHADe certa maneira, toda expressão artística é narrada em primeira pessoa, seja do singular ou do plural. Caso contrário, não seria expressão artística, ou seja, a expressão de um ponto de vista, de uma maneira de se entender o mundo.
Existem, porém, obras com as quais os diretores expõem suas angústias e frustrações, na esperança de atingir alguma universalidade. Essas geralmente são chamadas de "visão do próprio umbigo", o que é mais ou menos justo.
"Elena" é uma dessas obras. O que parece ter movido a diretora Petra Costa a filmar foi o desejo de compreender melhor sua relação com a irmã, 13 anos mais velha.
Elena foi a Nova York tentar uma carreira de atriz e acabou por encerrar sua própria vida aos 20 anos, vítima de uma profunda desilusão.
Convém lembrar: 1990, quando Elena se suicidou, é o ano em que o governo Collor (1990-1992) fechou a Embrafilme, interrompendo a produção de cinema no Brasil.
A conexão pode ser fortuita, embora pareça haver uma preocupação de entender a tragédia dentro de um contexto histórico.
Já disseram que a diretora transforma o luto em marketing. Mas seria preciso que o luto durasse, então, mais de 20 anos. Não creio que seja possível encontrar marketing em "Elena", a não ser aquele mais indireto (autopromoção de uma subjetividade), inerente à proposta.
É possível rejeitar tal proposta? Claro que sim. Um crítico não precisa, necessariamente, julgar uma obra pelo que ela se propõe. Propostas são recusáveis.
BOA DOSE DE AÇÚCAR
Um problema do filme reside no exagero de doçura presente em algumas sequências --quando a poesia é calculada a priori, ao contrário daquela que surge naturalmente do desencanto, da procura ou dos anseios.
Nisso a canção do The Mamas and the Papas ("Dedicated to the One I Love", uma escolha óbvia) colabora com sua dose de açúcar, embora seja bonita.
"Elena", contudo, tem dois elementos que dificultam uma possível recusa. O primeiro é o tratamento das imagens, que busca uma representação da memória, sempre fugidia, e acaba tornando essas imagens impressionistas pelo modo como usa a cor e as luzes e como trabalha o foco.
O segundo envolve certo risco. Ao se filiar a um cinema de fluxo, Petra Costa impõe um ritmo vertiginoso, em que as imagens fluem como um rio caudaloso.
Podem levar o espectador com a correnteza ou fazer com que ele agarre o primeiro tronco de madeira que vir pela frente (o plano das meninas boiando acontece quando passamos por uma parte calma do rio, quando tudo está em harmonia).
"Elena" se aproxima de documentários ensaísticos como "Rocha que Voa" e "Pachamama", ambos de Eryk Rocha, pelo jorro de imagens (incluindo as de arquivo) que Petra Costa amarra com alguma habilidade.

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