Difícil é convencer sua mulher de que ela
está bem, quando aparece com o primeiro vestido entre os oito que vai
experimentar, antes de sair para uma festa
Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 20/06/2013
Minto adoidado;
no bom sentido, naturalmente. Elogio textos que me mandam, acho bonitas
todas as namoradas que me são apresentadas pelos amigos, mentiras que
não fazem mal a ninguém. Mentirosos patológicos, geralmente nos
autoelogios, podem ser divertidos.
Tive um patrão assim. Burro
não era, nem analfabeto, mas mentia sem parar. Pior que isso: exigia meu
testemunho de empregado para as lorotas que espalhava. Mais de uma vez,
quando chegamos à cidade distante da empresa rural hora e meia de jipe,
só o patrão e o seu assessor, ele contava das onças imensas que
avistamos pelo caminho, com o seguinte refrão: “Não foi, Eduardo?”. E o
Eduardinho, morrendo de rir do potoqueiro, confirmava o encontro com o
felino de grande porte.
Mentirinhas sociais são normais e
louváveis. Difícil é convencer sua mulher de que ela está bem, quando
aparece com o primeiro vestido entre os oito que vai experimentar, antes
de sair para uma festa. Ao perguntar: “Estou bem assim?”, não adianta o
deus do lar afirmar que está ótima, porque há sete vestidos na lista de
espera para experimentação e consulta.
A moda masculina, agora, é
a gola da camisa polo virada para cima. Já foi moda nos anos 70 e
voltou com a corda toda: aprendi na tevê. Escrevo na véspera de um
almoço com a família e já decidi: Lacoste de gola virada para cima.
Aprendi,
também, que a camisa polo foi invenção de René Lacoste, o tenista
número 1 do mundo nos anos de 1926 e 1927, que levantava a gola para
proteger o pescoço das queimaduras solares. Depois, fundou a Lacoste,
aquela dos jacarezinhos. Morreu em outubro de 1996 sem tempo de conhecer
as diversas “lacostes” que tenho com os jacarés costurados nos mais
diversos lugares. Furou com charuto, jacaré para esconder o buraquinho,
que não vou jogar a camisa fora.
Coisa curiosa: evito fumar
charutos com as camisas Lacoste originais de fábrica, que somam sete,
porque são caras, bonitas e não merecem buraquinhos feitos pelos
charutos.
O imenso Abgar Renault escreveu: “Há pessoas que não
mentem, mas possuem várias verdades para o mesmo fato”. Conheço inúmeras
pessoas assim e o leitor conhece outras tantas. Se a mentira é social,
tudo bem; o diabo é que os mentirosos sociais são raros e não abundam
como abunda a pita, grande erva rosulada da família das agaváceas.
Supimpa!
Sabemos
que de pretensão e água benta cada um toma a que quer, ditado com
diversas redações. Também sabemos que, neste país grande e bobo, o
substantivo masculino escritor se amontoa nos passeios e mesmo nas ruas
sem calçadas, motivo pelo qual tantos patrícios se intitulam ou são
intitulados escritores, podendo mesmo ser eleitos para a Academia
Brasileira de Letras.
É, portanto, uma surpresa da melhor
supimpitude encontrar um texto divertido, bem escrito e com ensinança,
como aquele publicado na primeira página do nosso caderno Direito e
Justiça, edição de 15 de março. Com a agravante de ser da lavra de um
doutor em direito comercial pela USP, quando se sabe que o direito
comercial é chatíssimo e os advogados, condição primeira para o
cavalheiro se tornar mestre e doutor em direito, geralmente escrevem
mal, tantos são os números das páginas e os títulos dos livros de Pierre
Marie Nicolas Léon Duguit, Rudolf von Ihering, Pontes de Miranda e
outros, que fazem questão de citar como se os tivessem lido.
Perdi
a conta das vezes que entrevistei Francisco Cavalcanti Pontes de
Miranda, autor de um monte, mas um monte mesmo, de livros nos campos da
matemática, sociologia, psicologia, política, poesia, filosofia e
sobretudo direito, obras publicadas em português, alemão, francês,
espanhol e italiano. Oitentão, achava tempo de jantar fora todos os dias
e curtir seu uisquinho. Entrevistei-o sobre os mais diversos assuntos,
ele sempre muito educado e simpático encerrando a entrevista com a
seguinte recomendação: “Não se esqueça de dizer que sou da Academia de
Ciências do Vaticano”. Criada no século 15, é a mais antiga instituição
científica do mundo. O jovem repórter atendia o pedido e o secretário de
redação, invariavelmente, cortava a referência à pontifícia Academia,
que tinha 29 Prêmios Nobel até 2003.
Cuidemos, agora, do jovem
que escreve muito bem: Leonardo Netto Parentoni, procurador federal,
autor do texto “Spam na tela dos outros é colírio”. A começar pelo
título, em que spam pode ser pimenta, e colírio, que se aplica no olho,
pode ser refresco, o texto é divertidíssimo, instrutivo, nota dez.
Permito-me sugerir à coordenadora Isabella Souto que convide o
procurador para escrever sempre: o jovem doutor nasceu para esse mister,
que parece fácil, mas não é.
O mundo é uma bola
20
de junho de 1890: a França é a primeira nação europeia a reconhecer a
República brasileira, chamada República Velha, mil vezes pior que o
Império e um milhão de vezes melhor que a atual República, ainda outro
dia presidida pelo muriciense José Renan Vasconcelos Calheiros. Em 1960,
independência do Mali e do Senegal, como se adiantasse alguma coisa.
Hoje é o Dia Nacional do Revendedor e o Dia do Vigilante.
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