#eufui (#eagora?)
Não entendo quem não entende o que está acontecendo nas ruas. Uma coisa todos hão de concordar: o melhor jeito de entender a rua é ir para a rua. Mas que político teria coragem hoje de enfrentar os indignados? Os gritos eram de "sem partido!", e nenhum político apareceu. Nenhum.
Estive em duas passeatas, ou melhor, protestos até aqui, pelo circuito Faria Lima-Marginal Pinheiros-Paulista, o quinto e o sexto ato. A sensação é estupenda, ver tanta gente nas ruas, ou melhor, tomando as ruas, em paz, alegres, diversas, empoderadas apenas pela compartilhada indignação. Que se mostrou forte o suficiente para parar o país.
Os aumentos do ônibus foram o estopim perfeito. A passagem ficou cara, o serviço é ruim, havia movimento estruturado de luta (o do passe livre). Mas não é o preço do ônibus, é muito mais.
A liga que juntou a multidão foi a indignação contra basicamente tudo, antiestablishment. Mas o establishment político. Surpreendentemente, ou não, a bandeira anticapitalista estava ausente. A UNE foi hostilizada, enquanto engravatados à la mercado participavam tranquilamente do protesto.
Se o Brasil tem bandeiras unificadoras, elas são o combate à corrupção e a eficiência do Estado. Quanto mais o movimento se desviar delas, menor será.
O sistema político não acompanhou o salto econômico do país, a não ser em gastos e receitas. As maiores manifestações políticas deste século no Brasil sintomaticamente não têm políticos. São, basicamente, contra eles.
Dados os últimos anos, décadas e séculos, a pergunta não é o que está acontecendo, mas por que só agora? Se tardio, o timing pelo menos foi poético, em plena Copa das Confederações. Ou, como dizia um cartaz, "copa das manifestações".
Imagina na Copa?
O gigante acordou, como gritavam na rua. A dúvida é se voltará a dormir ou se encontrará caminho novo, que contorne a política. Mas é possível contornar a política? Não. E aí começam os problemas. É possível reformar os políticos? Sim. E aí começam soluções.
A nova mobilidade e a nova comunicação fortalecem o cidadão como nunca antes, como estamos vendo. As formas de fiscalização e pressão são infinitas. Causas não faltam, nem alvos.
Mas não será fácil, existem riscos conhecidos e desconhecidos.
Quem saiu às ruas das metrópoles e das pequenas cidades mostrou desejo e força de transformação. Falta um caminho. O recuo rápido no preço das passagens é uma pequena vitória a ser transformada em grande começo.
Sérgio Malbergier é consultor de comunicação. Foi editor dos cadernos "Dinheiro" (2004-2010) e "Mundo" (2000-2004), correspondente em Londres (1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore" (1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve às quintas no site da Folha.
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