quinta-feira, 20 de junho de 2013

Editoriais FolhaSp - Charge

folha de são paulo

Vitória das ruas
Série de manifestações força prefeitos e governadores a rever tarifa; capitulação evidencia profundo desgaste, mas também bom-senso
A revogação do aumento das tarifas de transportes em São Paulo e no Rio é uma vitória indiscutível do Movimento Passe Livre. Já os prefeitos Fernando Haddad (PT) e Eduardo Paes (PMDB), bem como os governadores Geraldo Alckmin (PSDB) e Sérgio Cabral (PMDB), saem atônitos das manifestações que os encurralaram.
Menos mal que tenham demonstrado realismo. O movimento adquiriu tamanha repercussão no tecido social que ceder já se tornava imperativo de bom-senso. Agora lhes cabe enunciar de onde sairão as verbas para pagar a conta.
Não é fácil aquilatar, contudo, como o episódio reverberará no panorama partidário e eleitoral. Da revolta com a qualidade da saúde e da educação à crítica aos gastos com a Copa do Mundo, várias insatisfações vieram à tona durante os protestos.
No momento, nenhuma das forças políticas majoritárias no país pode colher benefícios do que acontece. Ao contrário: acumulam derrotas, sem exceção.
Haddad tornou-se, naturalmente, um alvo preferencial do movimento após anunciar decisão que, pela lógica administrativa, nada mais era do que um ato de rotina, apesar de seu caráter impopular.
A prefeitura confiou, e tinha motivos para isso, na possibilidade de que os protestos pudessem esgotar-se sem maior esforço de negociação. Pressionado, o prefeito paulistano terminou obrigado a rever uma medida que apresentava como positiva --o reajuste revogado em São Paulo, afinal, ficara abaixo da inflação.
O enfraquecimento de seu cacife político encontra paralelo no campo do governo estadual. Em tese representando uma força oposta ao PT de Haddad, o tucano Alckmin paga um duplo preço.
De um lado, a truculência policial verificada na quinta-feira passada despertou largos contingentes da classe média para o movimento. De outro, novos e repetidos atos de vandalismo se registraram. Entre o excesso e a omissão policial, o comando do Estado parecia oscilar, incapaz de definir-se quanto à alternativa de menor custo eleitoral.
Ironicamente, para uma administração que conta com índices de popularidade ainda altos, embora em queda, também o governo da presidente Dilma Rousseff (PT) se viu atingido por um sentimento de insatisfação difuso, expressado nas maiores cidades do país.
PT e PSDB se veem lado a lado, como faces da mesma moeda, diante de uma sensação de inconformismo geral. Nenhuma agremiação política parece dar conta, por enquanto, de fenômeno tão multifacetado e amplo.
Até o Congresso dá sinais de incômodo com a revolta. Cogita acelerar a votação de projeto para desonerar os transportes urbanos. Políticos tradicionais sentem a exigência de reinventar-se, mas para tanto as manifestações ainda não parecem ter força bastante.
É mais fácil parar metrópoles, como São Paulo e Rio, do que tirar do atraso a política nacional.
    EDITORIAIS
    editoriais@uol.com.br
    Projeto incurável
    É imprópria, no tempo e no mérito, a aprovação do projeto que legaliza a chamada "cura gay" pela Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados.
    Verdade que a proposta ainda precisa passar por mais duas comissões antes de ir para o plenário, mas a comissão, presidida pelo pastor e deputado Marco Feliciano (PSC-SP), perdeu excelente oportunidade de mostrar que não coloca a agenda religiosa de seus membros à frente da missão institucional de defender minorias.
    Se aprovado, o diploma suspenderá dois trechos de uma resolução de 1999 do Conselho Federal de Psicologia. Um deles impede que profissionais da área colaborem com serviços que se proponham a tratar homossexuais. O outro os proíbe de dar declarações que tratem da homossexualidade como se fosse uma desordem psíquica.
    À primeira vista, a medida poderia parecer positiva: ela amplia a liberdade de ação dos psicólogos e lhes assegura o direito constitucional de manifestar sua opinião.
    Num exame mais detido, verifica-se seu caráter descabido: ela retira de um conselho profissional a atribuição de definir o que seja atividade legítima, pois amparada em consensos científicos. Se a psicologia já não considera a homossexualidade um transtorno mental, não há como falar em cura.
    Caso algum psicólogo queira contestar esse consenso, pode fazê-lo de forma técnica, nos fóruns adequados, e terá ou não sucesso em convencer seus pares. Contudo, caso queira afirmar que a homossexualidade é um pecado aos olhos de Deus, é livre para fazê-lo como cidadão, porém não na condição de psicólogo.
    Regras de comunicação são importantes em outras áreas técnicas. Um médico não pode propagandear terapias para doenças incuráveis. Um advogado não pode prometer vitória líquida e certa. Cabe aos conselhos profissionais, e não ao Legislativo, determinar o que é charlatanice em cada campo.
    Não deixa de ser irônico que o deputado Feliciano e sua comissão tenham escolhido este momento para reforçar a ideia, já muito disseminada, de que os políticos estão mais preocupados com seus assuntos paroquiais do que com o bem-estar da população.

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