sábado, 6 de julho de 2013

Agora, festa da literatura também fala o espanhol

folha de são paulo - FLIP 2013
Juan Pablo Villalobos foi chamado às pressas para o evento em Paraty
Peça 'Festa no Covil', em cartaz, lançou luz sobre mexicano que mora em SP e foi traduzido para dezenas de línguas
SYLVIA COLOMBODE BUENOS AIRES
Chamado de última hora para substituir o norueguês Karl Ove Knausgård, que cancelou sua vinda à festa de Paraty, o mexicano Juan Pablo Villalobos, 40, é um dos poucos representantes hispano-americanos no evento.
Com isso, a organização corrigiu uma falha na montagem da grade que havia causado estranheza ao próprio mexicano. "Tinha ficado muito surpreso quando li a programação. Parece um fenômeno relacionado à distância que existe entre a cultura brasileira e a desses países, é algo histórico", disse Villalobos à Folha, por telefone.
"O único país com que a produção brasileira tem mais intercâmbio é a Argentina, e há alguns selos pequenos se esforçando para levar novos autores para o português. Mas nos outros países do continente isso é quase nulo. O México não é uma exceção."
Ele chama a atenção, porém, para iniciativas pontuais brasileiras de apostas em novos autores mexicanos, como Valeria Luiselli ("Rostos na Multidão" foi lançado pela Alfaguara), Mario Bellatin ("Flores" e "Cães Heróis" saíram pela Cosac Naify) e Ignacio Padilla ("Amphytryon" e "Espiral de Artilharia", da Companhia das Letras).
Radicado em Campinas, onde vive com mulher, brasileira, e dois filhos, Villalobos fez de São Paulo seu centro de operações. É a partir dali que escreve e traduz textos para revistas estrangeiras e trabalha em seus romances.
Seus livros já foram traduzidos para mais de dez idiomas, como inglês, alemão, francês, italiano, holandês, húngaro, turco, búlgaro, romeno e japonês. Russo e hebraico estão a caminho.
No Brasil, seu nome ganha projeção pelo fato de seu primeiro romance, "Festa no Covil" (Companhia das Letras), ter sido levado aos palcos pela atriz Mika Lins, em cartaz no Sesc Consolação até 30/8.
A história é narrada por um menino, filho de um traficante, cercado pelo imaginário e pela linguagem do narcotráfico. É o primeiro volume da trilogia cujo segundo tomo ("Si Viviéramos en un Lugar Normal") saiu em setembro nos países hispânicos.
O pano de fundo da novela é o México dos anos 1980 de hiperinflação, quando teve lugar uma mudança profunda na estrutura social do país.
Os livros de Villalobos costumam ser vinculados ao que se passou a chamar de narcoliteratura. País cindido por uma guerra do governo contra o crime organizado, o México já coleciona mais de 60 mil mortos desde que essa política teve início, em 2006.
FICÇÃO E CONFISSÃO
"Nós não podemos fechar os olhos para isso, é preciso trazer o tema à tona, mas também não é possível achar que a ficção possa fazer muito para mudar essa situação. Nesse sentido, o jornalismo e o cinema são mais atuantes. Nós, ficcionistas, colaboramos para um olhar crítico e poético do que está acontecendo", diz.
Villalobos diz que sua obra dialoga om a tradição da literatura mexicana. E menciona entre as principais influências as escolas fundadas por Carlos Fuentes (1928-2012) e Sergio Pitol (nascido em 1933).
"Sou mais vinculado a Pitol, que é um escritor mais cosmopolita, brincalhão, realista e lida muito com o autobiográfico. Já Fuentes está mais vinculado à narrativa mais memorialista, historicista."
Sobre o convite feito a Villalobos, que entrou na programação oficial da festa no lugar do norueguês Ove Knausgård, o curador da Flip, Miguel Conde, afirmou: "Era uma substituição difícil por causa do tempo curto e tema específico [O autor debateria ontem, na mesa "Ficção e Confissão", com o norte-americano Tobias Wolff]. Os livros de Villalobos têm uma circunscrição histórica e social clara, mas ao mesmo tempo se valem de protagonistas que lançam sobre esse meio bem delimitado olhares abertos ao devaneio e à fabulação. Por isso, são livros em que a questão da relação entre fatos, experiência e invenção assume uma importância central."
Mesa reúne dois expoentes do ensaísmo
Geoff Dyer e John Jeremiah Sullivan discutem o gênero amanhã, na mesa que encerra a festa literária em Paraty
Apontado como novo caminho, trabalho de ambos se diferencia por usar primeira pessoa e impressões subjetivas
DANIEL BENEVIDESISABELLE MOREIRA LIMACOLABORAÇÃO PARA A FOLHAMais livre dos gêneros, na definição do crítico Jean Starobinski, o ensaio surgiu como tema transversal em diversas mesas da Flip e encerra amanhã o evento.
Sob o título, "A Arte do Ensaio", a última mesa da Festa Literária de Paraty vai reunir, às 17h, dois dos maiores ensaístas do momento, o inglês Geoff Dyer, 55, e o norte-americano John Jeremiah Sullivan, 39. O mediador é Paulo Roberto Pires, editor da "Serrote", a principal revista brasileira do gênero.
Autor do recém-lançado "Todo Aquele Jazz", Dyer é frequentemente citado como um dos expoentes do chamado novo ensaísmo, o qual se distingue pelo uso da primeira pessoa por impressões subjetivas e elementos autobiográficos.
Ainda que se entusiasme com essa retomada do gênero entre novos autores ("hoje prefiro ler os ensaios do John Jeremiah Sullivan a qualquer romance"), ele é o primeiro a rejeitar o rótulo: "Meus livros são muito difíceis de classificar, não dá para generalizar".
Sullivan também descarta o hype; para ele, o que há é um interesse renovado pelo ensaio, não propriamente um novo movimento.
Os pontos de contato entre ambos e autores como David Shields e Tom Bissell são numerosos. O que salta aos olhos em seus textos é a própria experiência do autor, não raro contada com humor autopejorativo, tiradas espirituosas e referências à cultura pop.
MÉTODO DE TRABALHO
E uma boa dose de obsessão, como ressaltou Sullivan em entrevista à Folha. Ele pode ficar meses ou até anos ruminando um assunto, reunindo informações e buscando um ângulo original, como mostram os ensaios de "Pulphead".
Mais flexível, Dyer já escreveu livros em poucas semanas e outros em alguns anos. Sua principal questão é achar o tom certo, aproximar ao máximo a forma do conteúdo.
Ao contrário de Dyer, Sullivan é terrível para falar de suas influências ("Nunca lembro o que dizer quando me perguntam. Shakespeare e Hemingway?").
O americano diz achar animador trabalhar com um gênero tão vivo e discutido. "Seria loucura se irritar com o interesse das pessoas pelo tipo de escrita que você faz."
Quando começou a escrever, achava que, além de "quente", o ensaio era uma forma nova. Mais que desilusão, sentiu excitação ao descobrir que estava pisando em um terreno realmente sólido.
"O ensaio é tão velho quanto o romance. Quando entendi isso, passei a me interessar por quem eram os praticantes, os fundadores, os que chegaram e mudaram a forma."
Ensaísta desde os anos 1990, Sullivan acredita que há limitações no gênero. "Algumas vezes penso que queria dizer exatamente o que acho, mas estamos falando de seres humanos reais e há uma certa matrix' social a que pertencemos e que temos que respeitar", diz.
Para vencer esses limites criativos da não ficção, Sullivan descobriu a liberdade na voz do narrador. "Como não posso enfiar um unicórnio na história que estou contando, posso condicionar a resposta do narrador ao que está acontecendo. E não tenho vergonha de fazer isso para alcançar força narrativa."
Embora seja figura constante em seus ensaios, Sullivan não se vê nos próprios textos --para ele, o narrador é um personagem como outro.
"Não sou eu. Não me identifico com aqueles narradores mais do que me identifico com quem é parecido comigo. Eu me uso sempre que posso, uso o que quer que eu tenha. Mas quando olho para essas versões de mim, não estou olhando para um espelho, mas para essa outra pessoa que anda dentro de uma história.

CRÍTICA - ENSAIO
Com humor, autor faz retrato atual da sociedade americana
RODRIGO LEVINOENVIADO ESPECIAL A PARATYNum ensaio publicado em 1945 em que tratava da decadência da linguagem, George Orwell alegava que "toda a tendência da prosa moderna é se afastar da concretude". Ensaísta consagrado, Orwell atacava a falta de clareza nas palavras e o que chamava de "abismo entre nossos objetivos declarados e os reais", o que era prejudicial ao leitor.
Quase 70 anos depois, o americano John Jeremiah Sullivan aparenta, em seu livro "Pulphead", lançado agora no Brasil, ter sido um leitor dedicado de Orwell. Em 14 ensaios, ele demonstra um apreço incomum por clareza e sinceridade, alicerçado em características fundamentais do gênero --a valorização da experiência individual, a reflexão filosófica e o didatismo.
Ao talento visível para a ficção, que dá ritmo impecável às narrativas, se une um apurado senso de humor, a curiosidade e o respeito a todo personagem como fonte de conhecimento.
A tudo ele se dispõe a escrutar em busca de empatia que, quando alcançada, é imediatamente repassada ao leitor. Quando escalado para cobrir um festival de música cristã, por exemplo, confessa que seria muito fácil desdenhar do que consideraria o retrato clássico de interioranos dominados pela religião.
Mas Sullivan se furta dos clichês e dos estereótipos. Movido pela certeza de que há algo lá, ele deixa a zona de conforto e descobre pessoas marcadas pela violência, em busca de uma experiência real numa sociedade de aparências. Por fim, confessa uma improvável ligação com aquele universo, resgatada por uma memória longínqua.
Em cada um dos personagens com que vai cruzando ao longo do livro, Sullivan encontra um ponto de contato com sua vida e desenha um retrato atual da sociedade americana. Sempre tendo como ponto de partida o olhar desassombrado de um intelectual para quem erudição e mundanidade são faces da mesma moeda.
    Zeca Camargo escreve livro sobre chegada aos 50 anos
    Apresentador lança título apenas em formato digital neste semestre
    'A idade me fez repensar meu corpo', conta ele, que participa hoje de uma mesa na Casa Folha, em Paraty
    DA ENVIADA ESPECIAL A PARATY (RJ)O jornalista e apresentador de Zeca Camargo ainda não sabe se dará a seu próximo livro o título "Nu" --que ele escolheu para batizar a mesa da qual participa hoje, às 11h30, na Casa Folha 2, em Paraty, sob mediação do repórter da Folha Paulo Werneck.
    "É uma palavra muito explícita. Queria passar a noção de transparência que tem a ver com o livro, mas talvez tenha uma conotação forte demais", diz o autor, que falará sobre a obra em criação, a ser lançada no início deste semestre pelo selo exclusivamente digital e-galáxia.
    A transparência diz respeito à forma pessoal como Zeca se coloca no livro, espécie de autobiografia sobre a chegada aos 50 anos, completados em abril. Em capítulos como "Memória" e "Rosto", faz uma leitura bem-humorada sobre não ser mais um garotão.
    "A idade me fez repensar o meu corpo. Fui dançarino, sempre trabalhei a parte física e percebi que queria escrever sobre isso", diz.
    A opção pelo formato digital teve a ver com o fato de ser sua primeira obra estritamente pessoal --os livros anteriores, publicados pela editora Globo, são relacionados ao seu trabalho. "Fui fisgado pela novidade. Eu me senti mais à vontade para falar de mim assim, sem o peso do papel."
    Idealizado por Mika Matsuzake, Tiago Ferro e Antonio Carlos Espilotro, o selo e-galáxia terá obras de Ricardo Lísias, com um livro de ensaios, e Ricardo Ramos Filho, com seu primeiro título adulto.
    Livro traz faceta pouco conhecida de Eduardo Coutinho: a de crítico
    Textos dos anos 1970 abordam Hollywood, política e surrealismo
    MATHEUS MAGENTADE SÃO PAULOEduardo Coutinho, 80, documentarista conhecido por extrair a essência de seus entrevistados em filmes como "Edifício Master" (2002) e "Jogo de Cena" (2007), curiosamente teme as palavras.
    Para ele, se por um lado a fala esconde "segredos e armadilhas", por outro, a escrita agrava o problema metafísico da escolha das palavras.
    "A tarefa mais difícil para mim no cinema é a de elaboração do texto da narração, o qual não é possível eliminar do filme. Por isso, não fossem os compromissos inevitáveis, escolheria agora o silêncio."
    O texto escrito em 1992 funciona como prefácio para o livro "O Olhar no Documentário", lançado em tiragem limitada de 200 exemplares nesta Flip (Festa Literária de Paraty). A obra da Cosac Naify traz um lado pouco conhecido de Coutinho: o de crítico.
    Entre 1973 e 1974, ele assinou 40 comentários como crítico interino do "Jornal do Brasil". Sete deles estão no livro. "Gilda" (1946), "Cantando na Chuva" (1952) e mostras de filmes surrealistas ou nacionais são alvos de textos com sarcasmo, análise política e reflexões sobre estética e atuação.
    "Hoje, a palavra surrealista entrou para o domínio público despida de qualquer provocação específica --pode designar tudo que é absurdo num determinado contexto. Podendo ser tudo, é, portanto, nada", escreve. E conclui citando Buñuel, como se antevisse suas futuras obras: "Não tenho respostas prévias. Eu olho, e olhar é uma maneira de colocar perguntas."

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