O país da rasteira 2
Amigo torcedor, amigo secador, estou aqui em Paraty, cidade da Flip, que este ano homenageia o maior escritor brasileiro de todos os tempos, o nosso russo das Alagoas de nome Graciliano Ramos, o cabra seco do Nordeste, couro e osso, o bode do capim minguante, donde lembro do palpite infeliz desse mesmo gênio, mais de resmungo do que de fala, sobre o futebol, ora veja.
O velho Graça, repito, o maioral, o maior escritor brasileiro messssmo, dizia que tal esporte não vingaria por estas plagas.
O alagoano odiava o futiba.
Dizia o autor de "Vidas Secas" que o autêntico esporte nacional era a rasteira, não o ludopédio.
Isso tudo em 1921, quando o futebol, invenção dos gringos, começava a germinar em nossas várzeas. Nossas várzeas têm mais flores.
E não é que tinha razão o peste. Razão não sobre a bola, razão porém sobre a rasteira.
Vencemos no 11 contra 11, somos bons nessa desgraça, os pobres espanhóis que o digam, coitados, ó dolor, sinto muito, mas a rasteira continua imperando como a nossa mais nobre prática democrática.
É só nego passando a perna no outro. A rasteira do presidente da Câmara e do ministro que pegam um avião da FAB para fazerem bonito lá, com licença família brasileira, na casa do caralho.
Perdão mesmo, mas indignação não tem glossário nem código do bom tom, amigo, sorry você aí de Moema que tem educação inglesa.
Quando falava da rasteira, o velho Graça se referia a passar a perna no outro, a mais genuína das nossas modalidades, uma brincadeira originada da capoeira, pelo que me lembro. A rasteira nunca esteve tão em alta. Repeteco.
Como pode, por exemplo, o cabra safado, em pleno fervor das ruas, amigo, levar a família de jatinho da FAB ao Maraca?
Desculpa, Graciliano, pelos palavrões, acontece. Mas te pergunto, velho Graça, como esse homem pode ficar no cargo mais um dia que seja? Nem meio dia, você não acha?
Como pensa que o verbo é apenas ressarcir quando a sentença é simplesmente pedir o boné e ter vergonha na cara.
Eis a velha política da República gagá. Desde 1900 e antigamente.
Pegar um jatinho oficial pra ver Brasil x Espanha, aí sim, não passa do patriotismo como o primeiro e mais imediato refúgio do canalha.
Xico Sá, jornalista e escritor, com humor e prosa, faz a coluna para quem "torce". É autor de "Modos de Macho & Modinhas de Fêmea" e "Chabadabadá - Aventuras e Desventuras do Macho Perdido e da Fêmea que se Acha", entre outros livros. Na Folha, foi repórter especial. Na TV, participa dos programas "Cartão Verde" (Cultura) e "Saia Justa" (GNT). Mantém blog e escreve às sextas, a cada quatro semanas, na versão impressa de "Esporte".
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