Medicamento é o primeiro em 50 anos específico contra a doença autoimune
No Brasil, cerca de 200 mil pessoas têm a doença; novo tratamento custa mais de R$ 50 mil ao ano
O tratamento é caro. Cada infusão da droga, administrada por injeção intravenosa, custa R$ 3.800 para alguém com até 60 kg. Só no primeiro ano do tratamento, é preciso desembolsar R$ 57 mil pelas 15 doses previstas, mas o custo pode ser maior, de acordo com o peso do paciente, segundo a fabricante GSK.
O tratamento existente hoje, à base do anti-inflamatório cortisona, não custa mais do que R$ 2.000 ao ano. A droga também é distribuída pela rede pública de saúde.
Estima-se que o Brasil tenha 200 mil pessoas com lúpus. Por ano, mais de mil casos são diagnosticados. Segundo o Ministério da Saúde, em 2012, a doença levou à internação 4.475 pessoas. As mulheres são as mais afetadas. Em cada grupo de dez doentes, nove são mulheres em idade reprodutiva.
NOVO TRATAMENTO
O lúpus é uma doença autoimune. Morton Scheinberg, reumatologista que coordenou parte dos testes clínicos da nova droga no Hospital Abreu Sodré, explica que os linfócitos B, células de defesa, produzem anticorpos que atacam o organismo das pessoas que têm a doença.O lúpus mais "leve" causa artrite, fadiga, perda de cabelo e problemas na pele. Em fase moderada, a doença leva a uma queda no número de plaquetas e glóbulos brancos no sangue. Casos graves acometem os rins e o sistema nervoso central, causando desde dores de cabeça até convulsões e paralisia.
O novo remédio, que também é um tipo de anticorpo, dificulta o amadurecimento dos linfócitos B para reduzir seu ataque aos tecidos saudáveis do organismo.
Segundo Roger Levy, professor da Uerj (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) e pesquisador que avaliou o Benlysta no Brasil, os efeitos adversos da cortisona aparecem com o tempo. "Anos de uso podem causar diabetes, hipertensão, aumento de peso, queda de cabelo e necrose nos ossos", afirma.
A nova droga, porém, não é isenta de efeitos colaterais, incluindo infecções graves, náuseas, diarreias e febre.
De acordo com o reumatologista Luiz Coelho Andrade, da Unifesp, o Benlysta não vai substituir o tratamento existente. "O uso deverá ser complementar ao tratamento convencional."
O médico nota avanços no tratamento da doença. "Há 40 anos, mais da metade das pessoas com lúpus morria. Hoje, quando o paciente descobre que tem a doença, dizemos que ele vai levar uma vida normal, apesar de eventuais complicações."
A FDA (agência reguladora de fármacos nos EUA) autorizou a venda do Benlysta após oito anos de pesquisa. Os estudos foram feitos em 31 países, incluindo o Brasil. A GSK diz que pretende comercializar o medicamento também na versão para injeção subcutânea em três anos.
DEPOIMENTO
"Não tinha força nem para abrir a pasta de dente"
DA EDITORA DE "CIÊNCIA+SAÚDE"
A consultora de moda Astrid Sekkel, 48, tem lúpus há seis anos e participou dos testes da nova droga aprovada para o tratamento da doença.
(DM)
"Comecei a perceber manchas arroxeadas na perna, dores nas articulações da mão e um cansaço muito grande. Fui ao dermatologista e ele disse que era uma picada de bicho. Tratei um ano como alergia e não melhorava.
A primeira reumatologista que procurei me disse que a doença era uma morte silenciosa'. Saí do consultório apavorada, chorando. Então decidi procurar uma segunda opinião. O médico me ofereceu para entrar no estudo clínico.
Muita gente próxima foi contra, porque você corre os riscos de ser a cobaia. Mas pensei que se o remédio não servisse para mim, poderia servir para outras pessoas.
Cada pessoa do teste reagiu de um jeito. Algumas ficaram enjoadas. Eu tinha sonolência no dia em que aplicava o remédio, mas acordava ótima.
As dores articulares pararam. Antes, não conseguia abrir a pasta de dente de manhã. Você fica absolutamente dependente. Hoje estou levando uma vida normal, faço pilates.
Acordo sem dizer ai'."
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