quarta-feira, 17 de julho de 2013

Eduardo Almeida Reis-Hospitalares‏

Devo admitir que a sensação de ser deificado, peço ao leitor que não espalhe, é realmente gostosa 


Eduardo Almeida Reis

Estado de Minas: 17/07/2013 

No Hospital Albert Schweitzer, Bairro do Realengo, Rio, faltam remédios, leitos, médicos, enfermeiros, só não faltam as filas imensas dos pobres patrícios que recorrem ao SUS. Dia desses, Márcio Cotrim nos deu deliciosa explicação sobre o nome do bairro, que teria sido inspirado na placa dos bondes que se dirigiam para lá: Real Engº, isto é, Real Engenho, transformado em Realengo, pertinho de Bangu, onde fica o complexo penitenciário do Rio.

Schweitzer (1875–1965) foi aquele médico e filósofo alemão que realizou belo trabalho em África; andou a pique me inspirar obra semelhante nos rios amazônicos. Prêmio Nobel da Paz em 1952, Schwitzer era primo de Jean-Paul Sartre e dizia das ideias do priminho imbecil: “Todas as opiniões são respeitáveis quando sinceras; por conta disso, Deus seguramente o perdoará”.

Na flor dos meus 15 aninhos, um mês antes de inteirar 16, passei as férias de julho no Pantanal do Mato Grosso. O dono da fazenda pediu-me que levasse a uma senhora moradora em um rancho distante uma hora de barco, Rio Cuiabá abaixo, os remédios que lhe mandava de seis em seis meses. Canoa piracicabana, motor de popa, Colt .38 no coldre, caixas de remédios protegidas num saco plástico, temos o jovem philosopho chegando ao primeiro rancho da margem direita.

Embiquei a piracicabana e desliguei o motor Evinrude. Pausa para explicar que piracicabana não era canoa escavada num tronco, mas barco feito de tábuas, fundo chato e equilíbrio instável, anterior aos abençoados barcos de alumínio, então raros e caros. Navegava, sim, mas era danado para emborcar pinchando n’água os passageiros sem coletes salva-vidas, inexistentes por lá.

À porta do rancho miserável uma senhora velhíssima, que talvez tivesse uns 55 anos, descalça, em andrajos, recebeu-me como se fosse a materialização de um Deus de botas e Colt .38. Devo admitir que a sensação de ser deificado, peço ao leitor que não espalhe, é realmente gostosa. De repente, era o que sentia Schweitzer nos rios africanos.

Naquela mesma tarde, piracicabana de volta rio acima, meti-me na moleira a ideia de estudar medicina para sair fazendo o bem pela Amazônia. Ideia que felizmente durou pouco, porque voltei das férias, conheci o chope, o charuto e a farra em companhia feminil, prazeres difíceis de trocar pela deificação nos ranchos ribeirinhos.


Língua portuguesa
Cristão-novo de segunda geração, meu amigo Alfredo ainda não está suficientemente cristianizado e odeia a Opus Dei, que não conheço, mas vou ver no Google. Em telefonema do Rio, o cristão-novo estava furioso com um advogado ligado à Opus Dei, cavalheiro famoso, que me parecia gente boa e teria dito em entrevista ao Jornal nacional: “Se o Congresso propor...”. Realmente, se o Congresso propuser o aprendizado da língua portuguesa para advogados famosos terá o meu aplauso, porque nosso idioma vem sendo vítima de uma série de ataques capazes de transformá-lo em língua morta antes mesmo de 2020.

Basta dizer que os mais altos escalões desta sofrida República têm a coragem de falar em “plebiscito popular” e um plebiscito, consulta sobre questão específica feita diretamente ao povo, geralmente por meio de votação do tipo “sim ou não”, só pode ser popular. Embaladas pela mistura de prepotência, incompetência e ignorância, as mesmas autoridades falam em “corrupção dolosa”, como se existisse corrupção sem dolo, quando em direito penal corrupção é a deliberação de violar a lei, por ação ou omissão, com pleno conhecimento da criminalidade do que se está fazendo.

Tudo isso, caro e preclaro leitor, no mesmo dia em que um repórter do SporTV perguntou ao jogador Fred se os “fluídos” do Mineirão o ajudam a fazer gols e um importante jornal, em manchete imensa, disse que determinado atleta “subiu ao alto do pódio na Polônia”. Sabemos todos que é meio difícil subir sem ser para o alto. Na rubrica esportes, pódio é plataforma onde os primeiro colocados numa competição se apresentam ao público.

Agora, se me dão licença, vou estudar a Opus Dei depois que dei uma olhada rápida no Google para aprender que é instituição hierárquica da Igreja Católica, composta por leigos, casados, solteiros e sacerdotes, fundada em 1928 por Josemaria Escrivá de Balaguer, sacerdote espanhol canonizado em 2002.


O mundo é uma bola

17 de julho de 180: em Silio, Norte da África, doze pessoas são mortas sob a acusação de cristianismo. Diz a Wikipédia que é a primeira notícia que se tem de execuções de cristãos. Em 1769, alvará para proteção dos sapais e marinhas de Tavira. Sapal é terra alagadiça, geralmente junto a rios; marinha, no caso, deve ser terreno à beira-mar. Tavira é cidade algarvia no distrito de Faro. Como dá para perceber, o alvará régio de 1769 já se preocupava com o meio ambiente, o que me faz supor que dom José I, rei de Portugal, fosse do Partido Verde, mas a historiografia diz que o monarca só tinha gosto para os regalos e as aventuras escusas.

Em 1955, inauguração da Disneylândia.

Nenhum comentário:

Postar um comentário