quarta-feira, 17 de julho de 2013

Nova marcha chinesa e Família de equívocos - Editoriais FolhaSP

folha de são paulo
Nova marcha chinesa
O crescimento do PIB chinês no segundo trimestre é mais uma evidência de que a segunda maior economia do mundo continua a desacelerar.
Verdade que investidores imaginavam que a velocidade da expansão chinesa pudesse diminuir de forma abrupta. Não foi o que aconteceu. O avanço de 7,5%, na comparação com o segundo trimestre de 2012, representou redução suave em relação aos três meses anteriores, quando a China cresceu 7,7%.
Mesmo que o PIB chinês se estabilize em 7,5% neste ano, já será registrado o menor incremento em quase duas décadas e meia. Não se descarta, todavia, que o governo venha a aceitar um crescimento menos expressivo.
O motivo é a inflexão no modelo de desenvolvimento da China. Aos poucos, as exportações e o investimento governamental deixam de ser o motor da economia, substituídos pelo consumo privado.
Há muito a avançar nesse campo. Enquanto o consumo das famílias brasileiras equivale a 62% do PIB, na China essa proporção é de apenas 35%.
Não se trata de transição simples. Para focalizar um exemplo atual, analistas internacionais consideram premente a reforma do sistema financeiro chinês, hoje pouco transparente. Nada menos que um terço do crédito do país, segundo a agência de classificação de risco Fitch, circula em uma espécie de mercado paralelo.
Como nem o governo pode aferir a real qualidade desses empréstimos, é difícil assegurar que a expansão do consumo tenha base sólida para sustentar o crescimento.
A mudança de marcha é sentida de forma mais intensa em importantes parceiros comerciais da China. Na Alemanha, principal economia europeia, as exportações diminuem. No Brasil, o preço dos produtos vendidos no exterior declina.
A desaceleração chinesa pode ser particularmente dura para a economia brasileira, uma vez que ocorre ao mesmo tempo que a retomada do crescimento dos EUA --ao refluxo de capitais para o mercado americano, já em curso, se somaria uma crescente perda de receitas com vendas ao exterior.
O desafio é enorme, e o Brasil não conseguirá enfrentar a nova situação sem repensar amplamente sua estratégia. Torna-se cada vez mais importante gastar melhor os impostos que arrecada, incentivar a eficiência das empresas exportadoras e oferecer condições mais atraentes aos investimentos produtivos.
    EDITORIAIS
    editoriais@uol.com.br
    Família de equívocos
    Polícia Federal conclui que onda de boatos sobre programa social do governo não teve origem criminosa; Caixa ainda deve explicações
    Após 55 dias de investigação, a Polícia Federal esclareceu que não foram cometidos crimes na onda de boatos sobre o fim do Bolsa Família em maio. Reiteradas mentiras das autoridades envolvidas, porém, contribuem para que permaneçam obscuras as explicações sobre os acontecimentos.
    Ontem, esta Folha revelou que a Caixa Econômica contrariou norma federal ao antecipar a distribuição dos benefícios sem autorização do Ministério do Desenvolvimento Social. A pasta é a principal responsável pelo Bolsa Família e única instituição apta a alterar o calendário de pagamentos.
    Isso não havia ficado claro. Dois meses atrás, o presidente do banco público, Jorge Hereda, afirmou, de forma esquiva, que o procedimento "foi comunicado" ao ministério. Era, agora se sabe, uma artimanha: a lei é clara ao dispor que a antecipação dos pagamentos precisa ser aprovada pela pasta, e não apenas informada a ela.
    Esse não foi o único episódio no qual a direção da Caixa faltou com a lisura que se espera de autoridades públicas. Revelou-se falsa a primeira versão do banco para a confusão verificada em maio.
    Entre os dias 18 e 20 daquele mês, uma multidão correu às agências da Caixa em 13 Estados para sacar o dinheiro do Bolsa Família. Temia-se que o benefício se extinguisse em breve. Houve tumulto e depredação de unidades do banco.
    A direção da Caixa então declarou que havia antecipado o pagamento justamente para evitar que o alvoroço aumentasse.
    Reportagem desta Folha mostrou, no entanto, que a versão oficial não se sustentava: no dia 17 de maio --antes de os tumultos ganharem força no país--, uma beneficiária do programa na região metropolitana de Fortaleza já havia recebido o pagamento antecipado.
    Ela não estava sozinha. Os R$ 2 bilhões em benefícios foram depositados de uma só vez nas contas das 13,8 milhões de famílias atendidas pelo Bolsa Família. Normalmente, a liberação ocorre de forma escalonada ao longo de dez dias. Foi essa mudança súbita, e sem aviso, um dos principais fermentos para toda a confusão, segundo apuração da Polícia Federal.
    Ou seja, os boatos surgiram de forma espontânea, e não sob a liderança de alguém "criminoso" e "desumano". Desmentiu-se, assim, a afirmação da presidente Dilma Rousseff, cujo governo, não sem alguma dose de oportunismo político, tratou de imputar à oposição a responsabilidade pelo ocorrido.
    Faria melhor a presidente se cobrasse conduta mais transparente de seus subordinados. Seu silêncio diante da trapalhada ainda mal esclarecida faz crer que aumentou a tolerância do governo com os próprios erros.

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