Hitchcock no Morumbi
Amigo torcedor, amigo secador, o Brasileirão, quase sempre entediante até a reta final, chega a agosto, o mês do cachorro louco, apresentando um suspense digno de filme de Alfred Hitchcock. Na sua 15ª de 38 rodadas, um espectro ronda o Morumbi e a prosa dos botequins: o rebaixamento do São Paulo.
Cai ou não cai?
O corvo Edgar, minha agourenta ave que representa os secadores, está eufórico. É a pior campanha entre rebaixados das últimas temporadas. Ele vibra. Peço calma ao estimado bicho. Ainda é cedo, amor, ironizo. O lazarento não dá bola. Eis a obsessão do miserável neste 2013.
Com um belo repertório de filmes de terror e suspense, afinal todo corvo é parente da ave assombrada do poema de Edgar A. Poe, Edgar sacaneia o técnico Paulo Autuori: "Chegou no papel de 'O Homem que Sabia Demais' e logo se revelou 'O Homem Errado'", diz, retomando a lista de filmes do Hitchcock.
O agourento toca o terror como na invasão, inclusive de corvos, de "Os Pássaros", outra fita do mestre do cinema. Calma, ainda estamos na 15ª rodada. O tricolor enfrenta amanhã o Flamengo, no estádio Mané Garrincha, em Brasília.
O momento do São Paulo é tão negativo que o zagueiro rubro-negro Wallace chegou a comparar um triunfo do time carioca com o ato de bater em bêbado. Embora não tenha sido em tom de provocação, a fala do beque da Gávea pode atiçar os ânimos da equipe de Rogério.
O corvo, aqui no ombro qual um repetitivo papagaio de pirata, não amacia: "Se o campeonato fosse um filme do Hitchcock para os tricolores, estimado cronista, o cartaz do Morumbi seria 'O Corpo que Cai'", sapeca, com a sua habitual irresponsabilidade secadora.
E sai o agourento com a sua interminável resenha de terror. Lembra que o momento para a torcida não chegou no auge de "Psicose". Não deixaria fora da sua provocação barata, embora com essa capa chique hitchcockiana, a ansiedade permanente dos são-paulinos pelo nome de Muricy Ramalho. "Eis a eterna 'Trama Macabra'", cita mais um filme. "Mais dias menos dias recorrem ao homem, que vai rejeitar o papel de salvador na história".
Se fosse apostar no botequim, jogaria minhas fichas na permanência do tricolor na elite. O elenco não é forte o suficiente para títulos, mas não tem perfil de queda. Temos aí um Náutico, uma Portuguesa, um preocupante Santos...
O suspense para o lado do Morumbi, no entanto, é real. Veio cedo demais para a histeria do meu corvo e o desespero da torcida. Bom para matar o tédio que costuma contaminar o Brasileirão a essa altura.
Na parte positiva, quem tem dito um retumbante "xô, pasmaceira" é o time do Botafogo, com a sabedoria do Seedorf, o holandês voador, e o poder ultrajovem de Vitinho. Melhor equipe não apenas na pontuação. Melhor em tudo até agora.
Xico Sá, jornalista e escritor, com humor e prosa, faz a coluna para quem "torce". É autor de "Modos de Macho & Modinhas de Fêmea" e "Chabadabadá - Aventuras e Desventuras do Macho Perdido e da Fêmea que se Acha", entre outros livros. Na Folha, foi repórter especial. Na TV, participa dos programas "Cartão Verde" (Cultura) e "Saia Justa" (GNT). Mantém blog e escreve às sextas, a cada quatro semanas, na versão impressa de "Esporte".
Nenhum comentário:
Postar um comentário