domingo, 1 de setembro de 2013

Alceu Valença diz não ligar para dinheiro nem para direito autoral

folha de são paulo
RODRIGO LEVINO
DE SÃO PAULO
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Alceu Valença foi atropelado --e mudou de nome. "Aqui quem fala é Alceu Tipoia", se apresenta à reportagem da Folha, antes de soltar uma gargalhada.
Com o braço direito imobilizado há duas semanas, desde que foi atingido por um ciclista na orla do Rio ("Foi uma dor da porra, fiquei urrando na calçada"), o cantor teve de adaptar para os shows arranjos de canções como "Tropicana" e "Tesoura do Desejo", pérolas de seu repertório.

Lucas Landau/Folhapress
O músico Alceu Valença em seu apartamento, no Rio
O músico Alceu Valença em seu apartamento, no Rio
"Não posso tocar violão, então chamei sanfoneiro, encorpei mais o negócio, ninguém vai sentir nem falta", diz o pernambucano, que a partir do dia 7, faz em São Paulo sete shows, seis deles (no Circuito Sesc) dedicados ao cancioneiro nordestino.
Leia trechos da entrevista.
Direitos autorais
Não me interesso por essas coisas porque eu não ligo para dinheiro. Não faço ideia do que ganho, do quanto tenho. Tem lá um advogado contratado para cuidar dessas burocracias, Deus me livre! Minha mulher é quem sabe.
Quando quero comprar uma coisa, peço um dinheirinho a ela. No Leblon, como todo mundo me conhece, faço pendura em banca de revista, lanchonete, taxi...
Redes Sociais
Adoro o Facebook. Escrevo sobre política, literatura, compartilho músicas. Esses dias publiquei um vídeo cantando nas ruas de Paris, cheias de neve. Os fãs adoram, é outra relação.
Música
Não faço download, nada disso. Para dizer a verdade, mal ouço música. Gosto mais de ler, tenho uma vasta biblioteca em casa.
Inéditas
Tenho um monte de música aqui, mas eu pergunto: lançar um disco para quem? Para quê? Não existe mais mercado, não vale a pena. É mais futuro eu pegar um punhado delas e jogar no Facebook, né?
Novo forró
Não existe novo forró! Isso [o forró eletrônico, que domina as paradas no Nordeste] que cantam por aí é outra coisa, é apelativo, é musicalmente pobre.
O forró de verdade tem métrica, rima, harmonia e melodia típicas, ora!
Você pode misturar com qualquer outra coisa --como eu misturo--, mas aí não vai poder chamar de forró.
Novos nomes
Não acompanho músicos da nova geração. A oferta é muito grande e falta curadoria. Nesse ponto, as gravadoras fazem falta, pois havia algum tipo de filtro, de recorte, mas hoje em dia é um mar de coisas, é muito difícil lidar com tanta informação.
Manifestações de junho
Observei tudo com muita atenção e acho que foi um levante fantástico. Discordo do quebra-quebra, mas é bonito ver o povo nas ruas. Deixou os políticos todos apavorados. Quem é político e é corrupto deve estar em pânico pensando nas próximas eleições e em como vai se apresentar.
Posicionamento
Desde o começo das manifestações eu me pronunciei a respeito, em apoio ou com críticas, nos shows, no meu blog. Mas entendo que é muito difícil artistas brasileiros se posicionarem publicamente. Há um medo danado de desagradar. Ainda mais em se tratando de uma coisa tão difusa como essas marchas.
Eleições 2014
Conheço [o governador de Pernambuco] Eduardo Campos [PSB] desde criança. É um sujeito decente, capacitado, muito inteligente e fez um governo fantástico. Capacitado ele é, mas se vai entrar na disputa é outra coisa --ele ainda não firmou isso.
ALCEU VALENÇA AO VIVO
QUANDO sáb., 7/9, às 22h
ONDE Credicard Hall (av. das Nações Unidas, 17.955, tel. 0/xx/11/4003-5588)
QUANTO de R$ 30 a R$ 50
CLASSIFICAÇÃO 12 anos
CIRCUITO SESC
QUANDO dias 10, 11, 25, 26
e 27/09, às 21h
ONDE Sesc Bertioga, Sesc Piracicaba e Sesc Ipiranga
QUANTO de R$ 6 a R$ 30

ANÁLISE
Artista é, no mínimo, o mais incendiário de sua geração
LUIZ FERNANDO VIANNAESPECIAL PARA A FOLHADa talentosa geração que despontou no Nordeste no início da década de 1970 (Zé Ramalho, Geraldo Azevedo, Fagner, Belchior, Ednardo), Alceu Valença foi, no mínimo, o mais explosivo.
Sua combinação de forró, baião e embolada com rock e performance teatral era incendiária e cativante.
Em seus shows com Jackson do Pandeiro, em 1978, ele fazia uma versão de "Pisa na Fulô" que resume isso: acordeom mais solo de guitarra; trejeitos vocais de repentista mais postura de roqueiro.
Já se passaram quatro anos de seu último disco, "Ciranda Mourisca", em que apresentou versões suaves de alguns de seus sucessos. Um disco com momentos bonitos, refletindo um homem com mais de 60 anos, que deixava um certo gosto de saudade do Alceu incendiário.
Ouvindo-se, por exemplo, "Dia Branco", "Molhado de Suor" e "Dente de Ocidente" no CD de 2009 e no LP de 1974 (seu primeiro solo, intitulado "Molhado de Suor"), percebe-se que as canções em nada envelheceram, mas perderam um pouco de intensidade nas interpretações.
Como 35 anos não são 35 dias, Alceu ainda pode enternecer, mas não levanta mais a poeira. Talvez nem queira.
E, também, o país dos anos 1970, sob a ditadura militar, inspirava uma agressividade que hoje pode soar deslocada, apesar dos protestos nas ruas.
Mas Alceu continua sendo quem combina melhor Olinda e Leblon, Luiz Gonzaga e baladas, irreverência forrozeira e dores de amor. O lugar que conquistou com suas grandes composições ("Maracajá", "Íris", "Espelho Cristalino", "Coração Bobo", "Anunciação") é só dele e ninguém tasca.

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