quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Escândalo sexual na BBC respinga no 'NYT


Ombudsman do jornal americano questiona contratação de Mark Thompson, ex-diretor da rede britânica

Thompson alega que não sabia da decisão da BBC de barrar programa com acusações contra ex-apresentador da TVDAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS

A editora pública (cargo correspondente ao de ombudsman) do "New York Times", Margaret Sullivan, questionou a atitude do jornal americano em manter a contratação do novo diretor-executivo, Mark Thompson, que até setembro deste ano era diretor-geral da BBC.
Thompson comandava a emissora britânica quando foi tomada a decisão de cancelar uma investigação do telejornal "Newsnight" sobre acusações, de abuso sexual, contra o ex-apresentador Jimmy Savile. O editor responsável pela decisão, Peter Rippon, foi afastado.
Savile morreu em outubro de 2011, aos 84 anos. No último dia 3, a emissora ITV, também britânica, exibiu uma reportagem especial com depoimentos de mulheres que dizem ter sido violentadas pelo ex-apresentador na década de 70, quando eram ainda menores de idade.
Após a exibição do programa, a polícia disse ter recebido um número "chocante" de denúncias contra Savile. Já são mais de 200 acusações.
A previsão inicial era que Thompson assumisse o cargo no NYT na última segunda-feira, mas houve adiamento para o dia 12 de novembro próximo.
Em entrevista à Reuters ontem, Thompson afirmou que "todos os colegas do NYT têm dado bastante apoio" a ele. Ele afirma que não sabia do caso Savile. Mas para Sullivan sua contratação deveria ser repensada.
"Qual é a probabilidade de que (Thompson) não soubesse de nada?", escreveu a ombudsman em sua página do jornal na internet. "Sua integridade e suas decisões devem afetar profundamente o 'Times' e seu jornalismo. Vale a pena considerar se ele é a pessoa correta para o cargo", continuou Sullivan.
Segundo a agência Reuters, um analista de Wall Street propôs que a empresa que edita o jornal adie novamente a posse de Thompson.
Executivos da companhia estão sendo pressionados a discutir o assunto ainda esta semana, durante teleconferência agendada para tratar de resultados financeiros.
No início da semana, o premiê britânico, David Cameron, cobrou publicamente a emissora sobre o escândalo dizendo que a BBC tem "sérias questões a responder".
"O país está chocado com as acusações contra Jimmy Savile, e parece que elas pioram a cada dia", afirmou.
O diretor-geral da BBC, George Entwistle, disse anteontem em depoimento ao Comitê de Cultura da Câmara dos Comuns [câmara baixa britânica] sobre seu envolvimento com o caso, que a emissora está colaborando e fazendo tudo a seu alcance para ajudar a polícia.
As investigações no Reino Unido não apontaram, até o momento, interferência de Thompson no trabalho do "Newsnight". O "NYT" não comentou as declarações da ombudsman.

ANÁLISE
Jornal se arrisca e passa pelo teste da transparência on-line
NELSON DE SÁ
DE SÃO PAULO
Em resposta a um leitor na semana passada, a editora-executiva do "New York Times", Jill Abramson, saudou a ombudsman Margaret Sullivan, que "traz nova energia ao cargo por se sentir confortável em blogs e outras formas digitais".
Anteontem, diante do escândalo sobre acobertamento de pedofilia na BBC, Sullivan blogou que a cobertura do "NYT" não vinha questionando Mark Thompson, ex-diretor-geral da rede britânica, escolhido para presidente-executivo do próprio "NYT". Ele estava naquele momento no prédio do jornal e deveria ser entrevistado "agressivamente".
Ainda anteontem, surgia no site uma entrevista com Thompson. O executivo respondeu aos questionamentos, disse não ter ordenado a suspensão de uma reportagem da BBC sobre pedofilia envolvendo uma estrela da rede, mas os repórteres Christine Hauchney e David Carr apontaram contradições, evidenciando a possibilidade de estar mentindo.
Thompson deu pelo menos mais duas entrevistas, ontem, uma à Reuters, outra ao "Guardian", e se contradisse ainda mais, alterando versões sobre o que sabia do episódio, como foi informado, como reagiu. Declarou que continuava com o apoio da direção do "NYT" e que esperava ser "grelhado", questionado, pelo jornal.
Paralelamente, o editor-executivo do jornal até o ano passado, Bill Keller, surgiu ao vivo na própria BBC para afirmar que a cobertura do "NYT" chegaria "ao fundo" da história e que, sim, seria um problema se concluísse que Thompson mentiu.
De volta à ombudsman, Sullivan foi elogiada ontem não só por Keller, mas pelo próprio Thompson, dizendo que ela está "completamente certa" em questionar sua nomeação. E no Twitter, em resposta a um leitor, ela escreveu que, "para permanente crédito do 'NYT', todos parecem entender que o editor público [ombudsman] é uma voz independente".
Qualquer que seja o resultado da cobertura, se vai ou não acabar derrubando o presidente-executivo que ainda nem tomou posse, o "NYT" parece estar passando pelo teste da mais ampla transparência, em "blogs e outras formas digitais".


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