sexta-feira, 1 de fevereiro de 2013

Editoriais FolhaSP

FOLHA DE SÃO PAULO

Congresso rebaixado
Escolha de políticos do PMDB sem estatura para presidir o Senado e a Câmara mergulha em descrédito um Legislativo perdulário e domesticado
A começar pelo Senado, hoje, o Congresso Nacional renova seus presidentes para dois anos de mandato. Renova, ressalte-se, só no sentido formal do termo -raras vezes, como agora, os favoritos representaram tão bem o que há de atrasado na política brasileira.
Renan Calheiros é o favorito para voltar a presidir o Senado. O peemedebista de Alagoas, cabe lembrar, não conseguiu concluir sua primeira passagem pelo posto. Renunciou, em 2007, quando foram expostos vínculos comprometedores, ainda não esclarecidos, entre ele e um lobista de empreiteira.
Nem se questione a atitude de um homem público capaz de inscrever-se novamente para tarefa da qual abriu mão em circunstância tão constrangedora. O alheamento diante do anseio da sociedade por lisura e caráter na política tornou-se um traço indelével de certas figuras nacionais.
O que não deveria ser mais tolerado é a conduta coletiva de alçar políticos sem estatura aos cargos mais importantes. Esse endosso irresponsável -que inclui a presidente Dilma Rousseff e mesmo setores da oposição- mergulha em descrédito o Legislativo.
Não bastasse o longo e notório currículo de Calheiros, uma pequena dose de pragmatismo e bom-senso bastaria para evitar sua indicação. Ele é alvo de denúncia no Supremo Tribunal Federal, em torno do escândalo que o levou à renúncia em 2007. Há probabilidade de que se torne réu e enfrente julgamento em pleno exercício da presidência. O Senado deveria poupar-se desse desgaste.
Melhor destino dificilmente se reserva para a Câmara, que elege na segunda-feira seu presidente. Conhecido como "Henriquinho" no ambiente de Brasília, não é pelo epíteto que Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), o candidato favorito, inspira expectativas reduzidas.
Uma série recente de reportagens desta Folha ilustrou como ele trafega há décadas no circuito paroquial de verbas, obras e cargos da administração federal. Dinheiro de suas emendas foi parar na conta da empreiteira de um assessor seu -cuja sede oficial, depauperada, era guarnecida pelo bode Galeguinho, que terminou como emblema da história diminutiva.
O orçamento anual de R$ 8,5 bilhões do Congresso, que emprega 21 mil pessoas, supera a disponibilidade somada de recursos para Salvador e Recife, onde vivem 4,2 milhões. A despesa mensal de R$ 130 mil por deputado equivale a 72 vezes o salário médio do trabalhador nas principais metrópoles.
Câmara e Senado precisam de lideranças que compreendam e revertam tamanho divórcio entre representados e representantes, além de eliminar a atual subordinação ao Executivo. Esse é o requisito para o resgate da imagem do Legislativo, tarefa que passa por um drástico corte de despesas e privilégios nas duas Casas.
Não se espere dos favoritos nas eleições legislativas tal choque de sobriedade. O que falta à dupla em estatura para o cargo sobra na disposição de manter tudo como está.

    Crédito para a floresta
    A queda fenomenal do desmatamento na Amazônia, de 27 mil km² (área maior que a de Sergipe), em 2004, para menos de 5.000 km², em 2012, teve muitas causas. Entre elas, parece ter sido particularmente eficaz o uso de instrumentos econômicos para induzir fazendeiros a preservar a mata.
    Menos conflituosa que a fiscalização e a repressão, porém não menos efetiva, mostrou-se a restrição do crédito rural para propriedades em situação ambiental irregular. A comprovação está em um estudo do Núcleo de Avaliação de Políticas Climáticas da PUC-RJ.
    O trabalho se debruça sobre os efeitos da resolução 3.545 do Banco Central, de 2008. Ela exigia de produtores, como precondição para obter crédito de bancos oficiais, documentação de que estavam em dia com exigências ambientais.
    O trabalho concluiu que R$ 2,9 bilhões deixaram de ser emprestados à região, entre 2008 e 2011, por força da resolução. Como resultado, nos anos seguintes um total de 2.700 km² de desmatamento teria sido evitado, uma vez que os fazendeiros dispunham de menos capital para ampliar atividades.
    Claro está que o aumento de produção também pode ser obtido com melhor produtividade, e não só com a abertura de novas áreas à custa da floresta. Mas não é essa a realidade na Amazônia, onde a posse de terras nuas ainda é o maior signo de riqueza.
    O estudo também sugere que essa correlação entre crédito e desmatamento é mais forte no caso da pecuária do que no da agricultura.
    Os dados indicam que a concessão de financiamento caiu mais, após a resolução, nos municípios em que predomina a criação de gado. Um indicativo de que pecuaristas tendem a usar o capital na compra de áreas e no desmate, para acumular mais pastos e cabeças.
    A saída racional, assim, está na regularização ambiental das fazendas para obter crédito e investi-lo na melhoria da produtividade.
    O instituto Imazon, do Pará, estima ser factível produzir 300 quilos de carne por hectare na Amazônia (a média hoje é de meros 80 quilos). Alcançar tal produtividade em um quarto das pastagens da região, até 2022, permitiria atender toda a demanda futura -sem derrubar uma só árvore.

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