Foto publicada na revista Visionaire, em 1995 |
Em 1990, o paulistano Marcelo Krasilcic, então com 20 anos, chegou a Nova York para estudar fotografia. Ao terminar a New York University, foi convidado para uma coletiva, sua primeira, que contou com Nan Goldin entre os participantes. A norte-americana, judia como ele, já era uma das referências da fotografia pautada por imagens pessoais, que contassem uma história. “Havia, naquele momento, uma abertura para o tipo de foto que eu também estava fazendo: imagens com ‘cara de verdade’”, comenta Krasilcic, que logo começou a trabalhar em revistas como Purple e Dazed & confused, publicações de moda que também colaboraram para definir a linguagem do período.
Porque para Krasilcic aquela década não terminou com a entrada da próxima. “Considero que somente a partir de 2001 a década chegou ao fim. O 11 de Setembro foi o marco de uma mudança grande no mundo, o que refletiu na moda e na fotografia. Os anos 1990 foram muito importantes para mim, pois me definiram como fotógrafo”, acrescenta. Tanto por isso, há muito tempo Krasilcic começou a recolher todo o material que fez na época para fazer seu próprio registro definitivo. 1990s reúne 179 imagens em que Krasilcic conta sua própria história, seja na moda, na música ou no comportamento. A bem cuidada edição – lançada simultaneamente nos EUA e no Brasil pela Cosac Naify – foi realizada em dois volumes, com caixa em tecido.
A influência de Nan Goldin no trabalho do brasileiro é marcante. “Tanto ela, quanto Larry Clarke e (o japonês) Nobuyoshi Araki são fotógrafos que admiro muito, que abriram caminho para minha geração. A grande diferença entre eles e eu é que eles documentam a realidade, mostram o que está acontecendo. Já as minhas realidades são criadas. Utilizo a linguagem mais realista para criar o que quero contar.” A linha divisória é tênue, tanto que sua imagem mais conhecida (a da capa do álbum Walking wounded, que o duo Everything but the Girl lançou em 1996) costuma ser confundida. “Já veio gente falando comigo que aquela foto havia sido feita quando eles estavam indo para um prêmio da MTV. Não, ela foi inspirada numa outra que fiz de uma produção de moda. Para captar aquele momento, utilizei três rolos de filme.”
Mistura
Há artistas nas imagens – Caetano Veloso (para a revista norte-americana de música Spin) e Marina Lima (para um CD da cantora) entre os brasileiros – mas a maioria dos personagens que Krasilcic escolheu para contar a sua história são anônimos. “É uma mistura grande de pessoas. Estão meus pais, minha irmã. Há nus de pessoas com quem tive relacionamento sexual, mas a grande maioria não. Tento não fazer diferença quanto a isso. Não importa se quem está nu ali é minha irmã, e sim o que aquela imagem conta.” Nessa viagem ao passado ele comenta que, quando imaginou o livro, sabia que fotos iria separar. “Vinte por cento do material acabou entrando para preencher espaços da história. Há fotos inclusive que eu nunca tinha visto, como a de uma cabeça de um manequim numa cadeira numa feira em Berlim.”
Todo o material foi produzido na era pré-digital. “Sou o mesmo fotógrafo, tenho hoje uma maneira parecida à do passado de trabalhar. A diferença na moda, por exemplo, é que nos anos 1990 não se dava importância para a roupa. A ideia da imagem era mais importante, ela que tinha que ser interessante. Se era boa, seria boa para a roupa também. Hoje em dia não, e o desafio é até maior, pois a roupa tem que estar no centro da foto, então você tem que trazer outras ideias”, continua Krasilcic, que mesmo radicado em Nova York atua bastante no Brasil. Em abril, ele vai a São Paulo para lançar 1990s durante a SP Arte.
1990S
De Marcelo Krasilcic
Editora Cosac Naify, 332 páginas, R$ 160
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