segunda-feira, 29 de abril de 2013

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CONSUMIDOR » Garantias para as órteses e próteses
Materiais especiais necessários principalmente em procedimentos ortopédicos ou cardíacos têm de ter cobertura garantida pelos planos. Quando há recusas, Justiça deve ser acionada 



Marinella Castro

Estado de Minas: 29/04/2013 

Para manter a saúde em forma, o corretor de imóveis Rubens Cunha faz diariamente caminhadas de até 10 quilômetros. Há cerca de um ano ele quase não conseguia movimentar sua perna porque sofreu um desgaste no fêmur que praticamente o impediu de andar. Rubens recuperou o movimento depois de colocar uma prótese. O material indicado pelo seu ortopedista de confiança foi negado pelo plano, mas a Justiça autorizou a cirurgia. O consumidor mineiro não está sozinho na busca do Judiciário para garantir procedimentos médicos. As órteses e próteses estão entre os temas mais demandados nos tribunais do país, nos assuntos relacionados aos planos de saúde.

Os conflitos envolvem especialmente os usuários dos chamados planos antigos, contratados antes da lei que regulamentou o setor em 1998, e também os artigos de tecnologia mais recente, e portanto mais caros. No ano que vem, novos itens devem ser incluídos no rol de coberturas obrigatórias do setor, acirrando ainda mais o debate. As órteses, próteses e materiais especiais são usados em muitas especialidades médicas, e com grande frequ”encia na cardiologia e na ortopedia. Todas os materiais inerentes ao ato cirúrgico e que tenham registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) devem ser cobertos pelos planos médicos, segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que regula os planos contratados após 1998. Mas, na prática, a cirurgia muitas vezes depende do Judiciário.

No caso de Rubens Cunha, a negativa foi motivada pelo material escolhido pelo médico. Segundo o consumidor, a prótese indicada pelo especialista custaria para o plano mais de R$ 30 mil, enquanto o material utilizado pelo convênio era bem mais barato, orçado em R$ 2,5 mil. “Não foi apenas o médico, o hospital também se negou a realizar o procedimento com o produto indicado pelo plano.” Segundo o corretor, desde que fez a cirurgia sua saúde foi de fato restabelecida e ele retomou sua vida normal, com trabalho e atividade física.

ALTO CUSTO Os gastos com órteses, próteses e materiais especiais movimentam cerca de R$ 20,5 bilhões ao ano e são destaque na internação hospitalar, despesa que mais cresce na conta dos planos de saúde. José Cechin, diretor-executivo da Federação Nacional da Saúde Suplementar (Fenasaúde), que representa 15 grandes grupos de operadoras e seguros de saúde, diz que é um pleito do setor a melhor regulamentação do mercado de órteses e próteses. Segundo o executivo, uma intrincada trama envolve o segmento, inclusive no que diz respeito a conflitos de interesses. “Nem sempre a prótese mais moderna é a melhor para o paciente”, defende. Ele cita como exemplo a reavaliação de procedimentos, que ocorreu recentemente no Hospital Albert Einstein, em São Paulo. O caso foi citado no Fórum de Qualidade e Segurança do Paciente, realizado em Londres. “De 1.679 pacientes encaminhados para cirurgias e reavaliados pelo hospital em uma segunda opinião, 683 tiveram confirmação para o procedimento. O restante foi encaminhado para outros tratamentos.”

Para os contratos antigos, ou seja, firmados até dezembro de 1998, e grande fonte de ações judiciais, não está previsto o fornecimento de próteses e órteses, mas o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) entende que os usuários desses planos também têm o direito de recebê-las. “O entendimento do instituto se estende também aos contratos adaptados. É importante observar que existem inúmeras decisões judiciais nesse sentido”, lamenta Joana Cruz, advogada do Idec. Ela defende uma regulação da ANS para o setor, a fim de preservar o direito desses consumidores.

Esse é o caso da aposentada Neuza Rodrigues. Usuária de um plano de saúde antigo, o marca-passo que precisou para garantir a saúde lhe foi negado pelo convênio. “A operadora disse que o contrato não cobria o procedimento”, conta a filha da aposentada, a analista de sistemas Rosa Magalhães. Rosa explica que a cirurgia foi feita mediante pagamento particular. Depois, a família recorreu ao Judiciário e foi reembolsada pelo plano. “Minha mãe precisou ser submetida a duas cirurgias para colocação do marca-passo. Nas duas vezes precisamos acionar a Justiça”, informou.

Operadoras de planos de saúde defendem a adaptação dos contratos antigos, que hoje atingem 7 milhões de brasileiros. Os usuários, segundo o setor, devem migrar para os novos contratos. “Mas essa migração inviabiliza o plano de saúde. O valor da mensalidade mais que dobra”, diz Rosa Magalhães. Antônio Carlos Teodoro, presidente do SOS Vida, diz que órteses, próteses e tratamentos para o câncer estão entre os principais conflitos que chegam ao Judiciário. Ele diz que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem decisões que garantem ao consumidor de planos antigos a ter acesso aos materiais inerentes ao ato cirúrgico. “A Justiça tem entendido que o convênio tem a função de preservar a saúde e a vida. Se a vida depende da prótese, o procedimento deve ser coberto no plano antigo”, diz.

Coqueluche de pedidos

A indicação precisa para o uso de órteses e próteses, o preço do material, a qualidade e a relação de similaridade e qualidade entre produtos, assim como os materiais importados, estão na ordem do dia na agência reguladora do setor, a ANS. O alarme foi acionado pelo mercado que reúne as operadoras, seguradoras e cooperativas médicas. As operadoras de saúde afirmam que o uso desses produtos cresceu tanto nos últimos anos que se tornou uma espécie de “coqueluche” no país, compara o diretor executivo da Federação Nacional da Saúde Suplementar, José Cechin. Segundo ele, no último ano, enquanto as despesas assistenciais de modo geral avançaram 110%, os gastos com internações cresceram 214%, quase o dobro, sendo que desse percentual as órteses, próteses e materiais hospitalares têm peso de 55%. “É preciso haver maior transparência nesse mercado, sob o ponto de vista de custos e da saúde do usuário.”

O presidente da ONG SOS Vida, Antônio Carlos Teodoro, diz que no momento em que recebe a indicação para uma cirurgia, a vida complica para o consumidor. “De um lado está o médico de sua confiança; de outro, o plano de saúde indicando um material a princípio similar, mas mais barato. O consumidor não tem como decidir qual é o melhor produto para ele.” Teodoro defende uma espécie de selo de qualidade. “Sociedades como as de cardiologia e ortopedia poderiam dar aos materiais um selo de recomendação, como já ocorre com alguns produtos.”

No mercado brasileiro ainda não há um trabalho para garantir ao consumidor a similaridade entre próteses e órteses, como ocorre com os medicamentos genéricos, por exemplo. “Esse é um dos temas que estamos trabalhando, atribuir similaridade aos produtos”, diz Martha Oliveira, gerente-geral de Regulação Assistencial da ANS. A discrepância que existe de preços no mercado também é outro ponto em estudo. O segmento deriva sem nenhuma referência, podendo ter variações que levam o consumidor realmente a desconfiar, como ocorreu no caso do corretor Rubens Cunha. O preço de sua prótese variava no mercado de R$ 2,5 mil a R$ 30 mil. Outros temas abordados este ano pela agência e que estão na mira de uma regulamentação conjunta entre a agência reguladora, Ministério da Saúde e Anvisa é a qualidade dos produtos, para clarear as indicações médicas.

Martha Oliveira aponta ainda que ao indicar o material a ser usado em uma cirurgia, o médico deverá apontar três produtos distintos e não apenas uma única opção. (MC)

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