Pesquisadores dos EUA desenvolvem modelo
matemático que, por meio da expressão de oito genes, prevê a taxa de
sobrevivência de mulheres com tumores na mama
Bruna Sensêve
Estado de Minas: 18/04/2013
Conjuntos de
assinaturas genéticas identificadas por pesquisadores de mais de 70
países por terem uma associação com o câncer podem ser a ferramenta mais
importante para prever a sobrevivência de pacientes com a doença.
Assinaturas genéticas são um padrão de expressão de um grupo específico
de genes que leva à manifestação de uma característica em determinado
grupo de células, também chamado de fenótipo. Os pesquisadores liderados
por Dimitris Anastassiou, do Centro de Biologia Computacional e
Bioinformática do Departamento de Engenharia Elétrica da Universidade de
Columbia, usaram um enorme banco global de assinaturas genéticas
recolhidas para outros estudos científicos e desenharam uma ferramenta
matemática capaz de prever qual é a taxa de sobrevivência de pacientes
com câncer de mama.
Anastassiou afirma que o algoritmo
desenvolvido por ele não se restringe ao câncer de mama, mas pode ser
usado para todos os tipos do mal. As descobertas foram descritas em
artigo publicado hoje na revista científica Science Translational
Medicine, após a equipe vencer a competição Desafio de prognóstico de
câncer de mama Sage Bionetworks. Em seus primeiros trabalhos na área,
Anastassiou e sua equipe identificaram assinaturas genéticas que estão
presentes de forma quase idêntica em vários tipos de câncer.
Segundo
ele, existem três tipos principais de marcadores como esses. O primeiro
está associado à “instabilidade cromossômica”, que eventualmente faz
com que as células cancerígenas se dividam incontrolavelmente. Outra
assinatura seria responsável pela transformação de células cancerígenas
em células com alta mobilidade e capacidade de invadir os tecidos
circundantes, causando eventualmente uma metástase. O terceiro indica um
recrutamento imunológico especial usado pelo organismo para combater o
câncer.
“Nós os encontramos sem o uso de qualquer associação com
prognóstico ou qualquer outro tipo de ‘fenótipo’ cancerígeno. Então,
quando começamos a participar do desafio, criamos a hipótese de que
essas assinaturas seriam características úteis no prognóstico do câncer
de mama”, detalha Anastassiou em entrevista ao Estado de Minas.
Anastassiou mostra-se bastante animado com o desdobramento do modelo,
que poderá desenvolver melhores produtos para diagnóstico, prognóstico
e, eventualmente, agentes terapêuticos. “O que é particularmente
interessante é que esses produtos podem ser aplicados em todos os tipos
de câncer porque essas assinaturas não são específicas para o câncer de
mama. Então, se eles provaram prognóstico para o câncer de mama, por que
não em outros tipos de câncer também? E por que não para outras
aplicações, como decidir se um determinado tratamento, como a
quimioterapia, é apropriado ou não?”, cogita.
Inovação A
professora titular da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de
São Paulo em Botucatu Sílvia Rogatto considera inovadora e desafiadora a
estratégia de usar uma competição de cientistas para buscar melhores
modelos preditivos de resposta ao tratamento do câncer. Ela reforça o
fato de estarem disponíveis inúmeras informações clínicas, de segmento e
tratamento de pacientes. Os pesquisadores tinham informações sobre
pacientes que foram acompanhados por muito tempo – alguns com mais de 4
mil dias de análise.
“Eles usaram assinaturas genéticas já
publicadas e começaram a desenhar algoritmos, que são ferramentas
matemáticas, para tentar identificar os preditores e avaliaram a
sobrevida global. (…) Encontraram oito genes que estariam relacionados
com resposta ao tratamento. São poucos, o que torna mais fácil
identificar a assinatura e pode ter uma importância prática muito boa”,
avalia. A especialista ressalta ainda que a maior inovação do trabalho é
a tentativa de agrupar as pacientes da melhor forma possível, sejam
elas de diferentes continentes ou países, para tentar usar uma
informação útil à comunidade inteira e não a um grupo específico de
pessoas. “Talvez, esse seja o maior impacto. É um modelo matemático,
baseado em modelo preditivo, com desenho de algoritmo, mas baseado na
vida real, em achados reais”, diz Rogatto.
Palavra de especialista
Edison Mantovani
chefe da equipe de Mastologia do Instituto Brasileiro de Controle do Câncer (IBCC)
Revolução do tratamento
“O
impacto do conhecimento do tempo de sobrevida e do prognóstico frente a
um determinado tipo de tratamento é fundamental para permitir a seleção
de grupos com características semelhantes e podermos obter o melhor
tipo de resposta possível para essas pacientes. A utilização da
assinatura genética no tratamento do câncer de mama vem sendo
estabelecida na última década e, à medida que novos genes são
descobertos e novas vias biológicas determinadas, poderemos estabelecer
novos medicamentos e obter melhores respostas terapêuticas
individualizadas. Em um futuro próximo, passaremos a determinar novas
vias proteicas alteradas pela oncogênese e poderemos interferir de forma
direta nessas proteínas, corrigindo essas alterações e estabelecendo
novas formas de tratamentos.”
1.700 modelos
O
Desafio de prognóstico de câncer de mama Sage Bionetworks é uma
competição internacional aberta a qualquer grupo de cientistas que
queira desafiar os modelos computacionais atuais de predição da
sobrevivência ao câncer de mama com o objetivo de avançar na pesquisa e
no desenvolvimento de modelos mais precisos de prognóstico para a
doença. O desafio contou com 354 participantes de mais de 35 países.
Foram apresentados mais de 1.700 modelos. Um dos “prêmios” finais era a
publicação de um artigo científico na Science Translational Medicine. Em
artigo relacionado ao desafio na mesma edição, os editores da revista
reforçam que o estudo publicado pela equipe de Dimitris Anastassiou
passou por todos os processos de avaliação por pares, assim como o
restante do material.
Melhor cenário para a quimio
Pesquisadores da
Faculdade de Medicina da Universidade Nacional de Taiwan e da Academia
Sinica sugerem que a assinatura de oito genes também seria capaz de
prever a taxa de sobrevida de pacientes depois da quimioterapia livres
de reincidência. A descoberta foi descrita na revista científica BMC
Medicine. Os primeiros genes identificados estavam envolvidos na invasão
celular, uma propriedade de muitas células cancerosas. Assim como os
pesquisadores americanos, eles usaram um painel de linhagem de células
humanas já existente no Instituto Nacional do Câncer.
Ao comparar o
padrão de ativação de cada um desses genes de diferentes linhagens com a
forma como essas linhas celulares respondem a 99 drogas de combate ao
câncer, os pesquisadores conseguiram diminuir uma lista de inúmeras
possibilidades para apenas os oito genes que poderiam, potencialmente,
influenciar o resultado da quimioterapia.
Ao testar essas
ligações, segundo o professor Ker-Chau Li, da Academia Sinica e da
Universidade da Califórnia, em Los Angeles, o grupo também descobriu que
alguns genes de invasão tinham padrões únicos de expressão que resultam
em respostas diferenciadas das células para cada um dos agentes
quimioterápicos estudados. Segundo o professor Pan-Chyr Yang, da
Universidade Nacional de Taiwan, a descoberta de biomarcadores de
prognóstico para pacientes de quimioterapia permanece crítica para
melhorar a eficácia do tratamento do câncer. “A assinatura de oito genes
obtida aqui pode ajudar na escolha do tratamento como parte da terapia
individualizada do câncer e nosso método de descoberta do gene pode ser
aplicável em estudar outros tipos de câncer”, declarou o autor à
imprensa. (BS)
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