sábado, 25 de maio de 2013
O poema e a prece - João Paulo
Estado de Minas: 25/05/2013
Na quarta-feira, Ouro Preto tem encontro com a poesia. Na abertura do Fórum das Letras a palavra vai estar com Adélia Prado. Ela faz conferência sobre o tema escolhido para abrir o evento este ano, Literaturas de origem. Mas, com a sinceridade que faz parte de seu modo de ser, confessa: “Não sei se se trata de uma expressão acadêmica. Posso me aventurar poeticamente sobre o assunto”, sugere.
Quem escuta Adélia falar sente que a poesia é real, que tem voz. Mas a autora de Solte os cachorros não se sente assim, criadora, mas portadora da poesia. “O que torna uma poesia verdadeira, tão parecida a uma oração também verdadeira, é a marca divina que observamos em ambas. E não depende da ‘bondade’ de seus autores, sempre será maior e melhor que qualquer deles”, diz.
E é com essa disposição, de servir à poesia e ao sagrado, que ela parece vencer uma reserva bem mineira para participar de eventos literários pelo país. Perguntada se sente prazer em encontrar o leitor face a face, confessa que desde que a poesia seja tema e objeto, sente-se “fazendo um passeio bom”.
Adélia pode ter dúvidas sobre o sentido preciso das “literaturas de origem” que a levam a Ouro Preto, mas sente, cada vez mais, que sua poesia se aproxima de suas próprias origens, tocada pela força mais renitente das lembranças antigas. “A memória nunca esteve ausente, mas é certo que se acentua de uma outra maneira na obra, quando envelhecemos”, afirma.
Na poesia de Adélia há o sagrado e a memória, mas sobretudo o amor. “Ele pode absolutamente tudo, mas é bom acentuar: não o amor erótico em si e por si mesmo apenas, mas o verdadeiro amor, o que supõe a morte do ego”, diz.
Se ao leitor a recorrência aos poetas de eleição é um exercício de humildade, para a poeta pode ganhar uma dimensão ainda mais radical. Ao selecionar poemas para uma antologia de bolso, que lança em breve, a escritora confessa: “Reler antigos poemas é recobrar o espanto que os gerou”.
Da poesia para a política, Adélia Prado reafirma a força necessária da presença do feminino no mundo: “Se não tiver, estamos perdidos”. Mas defende que a mulher no poder não pode ser uma contrafação de um governo masculino. Em seu modo poético ela já havia confessado que “ser coxo na vida é maldição pra homem” e que mulher é desdobrável.
Ela é: Adélia Prado, poeta, mãe, mulher e avó, que mira o mistério de sua janela de Divinópolis – todo lugar é uma janela – já não pergunta pela raiz das coisas e pelo sentido da vida. Quem habita o mistério sabe que poesia e prece são uma e mesma coisa, que nasce da aceitação de uma verdade que precede o mundo e o justifica. Eros e sagrado numa síntese luminosa.
Quando Adélia fala, as pedras deixam de ser pedras. Logo retornam ao sono mineral. Mas, por um momento, a beleza nos justifica.
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