O Congresso precisa perder o medo de
legislar sobre questões polêmicas. Se continuar preferindo a zona de
conforto, outros poderes e instituições vão avançar sobre suas
competências
Estado de Minas: 12/05/2013
Afora as
trepidações no Congresso entre o governo e sua base, que poupam o
trabalho da oposição, e alguns ruídos na economia, que os adversários
estariam ampliando, Lula, Dilma e seus generais enxergam um horizonte
limpo pela frente, no plano político-eleitoral. Parte do otimismo vem de
uma pesquisa, feita pelo Instituto Vox Populi para consumo interno do
PT, examinada no almoço de quarta-feira passada entre a presidente, seu
antecessor, os ministros Fernando Pimentel e Aloizio Mercadante, e o
presidente do PT, Ruy Falcão.
Mais qualitativa do que
quantitativa, a pesquisa avaliou a preferência pelos principais
pré-candidatos a presidente, mas esses resultados, hoje, não têm muita
importância. Retratam um momento ainda muito distante da eleição. Não
divergiram quase nada, segundo quem teve acesso aos números, dos
resultados da pesquisa – também exclusiva – encomendada pelo PSDB, já
divulgada aqui: nela, Dilma tem 53%, a ex-senadora Marina Silva 18%, o
senador Aécio Neves (PSDB-MG) 15% e o governador de Pernambuco, Eduardo
Campos (PSB), 5%. Na consulta espontânea, as citações de Dilma e de Lula
também os colocam como favoritos. Da parte qualitativa da pesquisa é
que o grupo extraiu conclusões mais otimistas sobre a disputa de 2014.
Para
começar, ela revela que, para o eleitor, Lula é Dilma e Dilma é Lula.
Embora isso pareça óbvio para quem lida com a política, no imaginário do
eleitorado a associação poderia já não ser tão forte: Lula deixou a
Presidência há quase três anos, os dois têm estilos e imagens diferentes
que os poderia ter dissociado.
Segundo a “quali”, como dizem os
pesquisadores, a grande maioria acha que o governo está no caminho
certo, que o país está progredindo, que a vida pessoal melhorou e que
continuará melhorando. A visita da inflação não foi ignorada, mas, para a
maioria, o governo está tomando as medidas certas de controle.
Registraram que o emprego cresceu e acham que não haverá aumento do
desemprego. As políticas públicas continuam bem avaliadas, embora tenham
destacado os problemas com saúde e segurança. O PT aparece, apesar de
todo o desgaste com o julgamento do mensalão, como o partido que inspira
mais simpatia e confiança. Esse céu de brigadeiro, naturalmente, pode
escurecer daqui até o pleito, por causa de circunstâncias externas e
internas. Mas, para aquele grupo do almoço, o sentimento atual da
população é amplamente favorável a Dilma.
Isso posto, foi com
frieza e sem ansiedade que examinaram a candidatura do governador
Eduardo Campos. Todos acham que ele passou do ponto de retorno e que
errou ao avaliar que os problemas da economia se agravariam, minando o
apoio a Lula-Dilma. Não haverá mais esforços para evitar que ele se
candidate, e a saída do PSB do governo, por ora, será problema dele. Os
próprios socialistas, como o ministro Fernando Bezerra e os irmãos Gomes
(Cid e Ciro), do Ceará, vão aumentar a pressão por uma definição antes
de setembro, quando acaba o prazo para a migração partidária com vistas a
2014. E, como Lula é Dilma e vice versa, daqui para a frente o
ex-presidente será cada vez mais ativo no cenário político, ajudando na
gestão da coalizão, apoiando um aliado aqui e outro ali, como fez em
Brasília, dando uma força ao governador Agnelo Queiroz (PT). Contra
essas boas circunstâncias, a oposição ainda não descobriu o discurso.
Além das tamancas
O
Congresso precisa perder o medo de legislar sobre questões polêmicas.
Se, temendo igrejas e grupos sociais com poder de grito, continuar
preferindo a zona de conforto, deliberando apenas sobre temas de boa
repercussão (como a PEC das Domésticas) ou votando o que o Executivo
propõe – ainda que desafiando o governo, como na MP dos Portos – seguirá
perdendo terreno para os outros poderes e, até, para instituições da
sociedade civil com algum poder normativo. Um exemplo, a Resolução
2013/13 do Conselho Federal de Medicina (CFM) sobre uso das técnicas de
reprodução assistida, aprovada na quarta-feira. Cabe mesmo ao conselho
estabelecer regras para as práticas da medicina, no que se relaciona com
a ciência e a boa prática médica.
Como fez no artigo que fixa
em 50 anos o limite de idade das mulheres para engravidar com reprodução
assistida. A resolução, entretanto, legisla sobre uma questão que o
Congresso vem evitando enfrentar, a união de pessoas do mesmo sexo. Com
todo o respeito e sem qualquer preconceito, a resolução vai além da
competência do CFM quando diz que “é permitido o uso das técnicas de
reprodução assistida para relacionamentos homoafetivos e pessoas
solteiras, respeitado o direito da objeção de consciência do médico”.
A
lei – logo, o Congresso – deverá regular essas questões. Na falta da
lei, os casais podem providenciar filhos, mas enfrentarão problemas para
registrá-los e garantir-lhes outros direitos. A resolução parece
exceder-se também quando proíbe o comércio de óvulos e embriões, mas diz
que uma mulher que aspire ao tratamento para engravidar pode doar
óvulos para outra, que não os produz, desde que esta ajude a financiar o
tratamento da doadora. Isso é comércio disfarçado. A lei já proíbe a
venda de órgãos e tecidos.
O Congresso enfrenta a concorrência do
Executivo, que legisla por medidas provisórias, a do Ministério
Público, da Polícia Federal, da CGU e de outros órgãos na tarefa de
fiscalizar, e a espada do Judiciário, que o desautoriza e, agora, até o
impede de deliberar. Há quem bata palmas. Esses nunca viram o Congresso
fechado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário