LAURA MATTOS
EDITORA DA "FOLHINHA"
EDITORA DA "FOLHINHA"
Maitê Proença, 53, entrou em contato com o caos absoluto há duas décadas, quando passou três anos frequentando cerimônias do Daime.
Com oito quilos a menos e olheiras profundas, olhava para o espelho e tinha crises nervosas de riso: "Isso aqui é uma 'sexy simbol'", dizia, irônica, para si mesma.
"Aquilo te leva para o caos, dá muito medo, te desarruma, te derruba do pedestal. Não recomendo para qualquer um. Mas, para quem tem um colhão daqueles de couro, pode ser uma maravilha, trazer liberdade criativa."
Victor Moriyama/Folhapress | ||
A atriz Maitê Proença,em hotel de São Paulo |
Com o Daime, diz ter aprendido a organizar o caos. Foi um aprendizado essencial para o projeto de seu novo livro. Em "É Duro Ser Cabra na Etiópia" (ed. Agir, R$ 39,90), a atriz escritora estreia como editora. O processo de elaboração durou três anos e foi caótico desde o início -paralelamente, ela escreveu uma peça de teatro, em que atua e faz a direção.
Primeiro, Maitê pinçou a frase do título de uma conversa maluca com amigos sobre grãos de café que teriam sido encontrados em fezes de cabras africanas.
Depois fez um concurso em seu site para achar os 169 textos que formam a obra. As únicas regras eram ter humor e, no máximo, 1.500 toques.
"Para elevar o nível", pediu a colaboração de escritores como Carlos Heitor Cony, José Eduardo Agualusa e Mario Prata, que acabaram mesclados aos anônimos na obra.
E passou incontáveis horas de cócoras ou de joelhos, com textos espalhados pelo chão de seu sítio, na tentativa de organizar o caos.
O resultado é divertido. Maitê escreve comentários à mão em várias passagens -"Para retardar o gozo até que a parceira esteja no ponto, um homem precisa pensar na sogra, no carro enguiçado...", anota, ao lado de um conto de Agualusa. Com humor, dá sentido a histórias aparentemente desconexas, e o caos se organiza.
Em seu livro anterior, "Uma Vida Inventada" (2008), Maitê misturou ficção a realidade para organizar a narrativa de passagens caóticas de sua vida, para dizer o mínimo (a mãe foi morta pelo pai, em um crime passional, entre outros dramas).
A seguir, Maitê responde a perguntas inspiradas aleatoriamente em capítulos de seu novo livro. No final, a entrevista fez algum sentido, pelo menos para ela, que passou pela escola do Daime...
*
RETÓRICA SEXUAL
Folha - Lançar um livro tem algo a ver com orgasmo?
Maitê Proença - Sim. Todo orgasmo é uma conquista. Aquela delícia não vem de graça, há uma elaboração para se chegar ao clímax. Mas digamos que esse livro foi um amante complexo. Foram vários amores que precisavam se complementar, conversar entre si de forma instigante. E agora precisa vender, então, em vez de relaxar e gozar, continuamos com a sedução. Esta entrevista, por exemplo, é para conquistar o leitor.
Maitê Proença - Sim. Todo orgasmo é uma conquista. Aquela delícia não vem de graça, há uma elaboração para se chegar ao clímax. Mas digamos que esse livro foi um amante complexo. Foram vários amores que precisavam se complementar, conversar entre si de forma instigante. E agora precisa vender, então, em vez de relaxar e gozar, continuamos com a sedução. Esta entrevista, por exemplo, é para conquistar o leitor.
SALADA FÚNEBRE
Dar vida à escritora é uma tentativa de matar a atriz?
Minha atriz melhorou quilômetros depois que comecei a escrever. Estava estagnada, me mandei para a escrita e voltei muito melhor. Agora visito meus porões sem medo. Um belo dia acordei sem medo, sabe-se lá como, mas é certo que trocar a forma de expressão teve reflexo nisso.
Minha atriz melhorou quilômetros depois que comecei a escrever. Estava estagnada, me mandei para a escrita e voltei muito melhor. Agora visito meus porões sem medo. Um belo dia acordei sem medo, sabe-se lá como, mas é certo que trocar a forma de expressão teve reflexo nisso.
DE VEZ EM QUANDO A RAZÃO É OUTRA
Dar sentido ao caos é algo que você aprendeu com a vida?
Quando a forma é muito conhecida, a gente tende a se repetir. Dali onde tudo parece caótico é que pode sair algo realmente criativo e novo. Dói mais, é mais confuso e difícil, mas, quando se consegue uma organização dentro disso, o prazer do resultado é imenso. A vida ensinou.
Quando a forma é muito conhecida, a gente tende a se repetir. Dali onde tudo parece caótico é que pode sair algo realmente criativo e novo. Dói mais, é mais confuso e difícil, mas, quando se consegue uma organização dentro disso, o prazer do resultado é imenso. A vida ensinou.
A BUNDA OU PONTO G
A bunda é algo que ainda lhe preocupa?
A bunda caiu. Ainda está digna, mas não tem a abundância de outrora, se é que me entende. Não me preocupo porque tenho mais o que fazer, mas também não comemoro.
A bunda caiu. Ainda está digna, mas não tem a abundância de outrora, se é que me entende. Não me preocupo porque tenho mais o que fazer, mas também não comemoro.
LÍNGUA DE FORA
Para quem dá vontade de mostrar a língua?
Sou malcriada, tenho vontade de mostrar para muita gente. Tento me controlar, mas em geral não consigo. Depois peço desculpas, passa tão rápido quanto veio.
Sou malcriada, tenho vontade de mostrar para muita gente. Tento me controlar, mas em geral não consigo. Depois peço desculpas, passa tão rápido quanto veio.
NÓS PEGA OS PEIXE
A conta corrente da atriz é quantas vezes maior do que a conta corrente da escritora?
A da atriz é mais recheada, apesar de os livros terem ótima saída e de o teatro vender ingressos 6% mais baratos do que há 15 anos. Mas a atriz tem mamãe Globo a amparar há 30 anos.
A da atriz é mais recheada, apesar de os livros terem ótima saída e de o teatro vender ingressos 6% mais baratos do que há 15 anos. Mas a atriz tem mamãe Globo a amparar há 30 anos.
ERROS E PSIQUÊ
Que aspecto da vida profissional mobiliza sua psicoterapia?
Não faço psicoterapia, me dei alta quando entrei para o Daime. Hoje faço minhas catarses só nos palcos e livros. Está tudo ali, basta folhear.
Não faço psicoterapia, me dei alta quando entrei para o Daime. Hoje faço minhas catarses só nos palcos e livros. Está tudo ali, basta folhear.
MACACOS ME MORDAM
O que é mais difícil do que ser cabra na Etiópia?
Ser pessoa na Etiópia não deve ser mole.
Ser pessoa na Etiópia não deve ser mole.
TEATRO
Atriz encarna personagem de 86 anos
Maitê Proença criou uma senhora de 86 anos para falar sobre a vida sem censura e com humor. A personagem, que ela interpreta, é protagonista de "À Beira do Abismo me Cresceram Asas". A peça, escrita e também dirigida pela atriz, está em cartaz desde ontem em São Paulo, no Teatro Faap (r. Alagoas, 903), de sexta a sábado, às 21h, e aos domingos, às 18h. Ingressos custam entre R$ 70 e R$ 80.
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