domingo, 16 de junho de 2013

Editoriais FolhaSP

folha de são paulo
O DNA é de todos
Com vários anos de atraso em relação a outras partes do mundo, os Estados Unidos se renderam ao que parece óbvio até para quem ignora as minúcias da biologia molecular: se os genes são comuns a todos os seres humanos, que os recebem por via natural dos pais, o código de DNA neles contido não pode ser reconhecido como propriedade intelectual.
A lei brasileira, por exemplo, impede a concessão de patentes para material genético humano.
Na quinta-feira, a Suprema Corte americana determinou por nove votos a zero que genes humanos não podem ser objeto de patentes. Derrubou, assim, a interpretação até então vigente, do Escritório de Patentes dos EUA, de que as sequências de DNA podiam receber tal privilégio.
A decisão se deu na ação movida por médicos e instituições de saúde contra as patentes dos genes BRCA 1 e BRCA 2 conferidas à empresa Myriad Genetics, de Utah (Oeste dos EUA). A abreviação se refere a "breast cancer", câncer de mama em inglês.
"A Myriad nada criou", escreveu o juiz Clarence Thomas pelo tribunal. "Certamente descobriu um gene importante e útil, mas separar o gene do material genético em volta não é ato de invenção."
Variações truncadas dos dois genes estão associadas com um considerável aumento da probabilidade, entre 11% e 65%, de uma mulher desenvolver tumores de mama ou de ovário ao longo da vida.
Essas sequências de DNA só explicam uma parcela pequena dos tumores mamários; a maioria deles tem origens não hereditárias, como mutações sofridas após o nascimento. Apesar disso, tornaram-se um teste diagnóstico a mais no arsenal de oncologistas.
Foi após descobrir que portava uma dessas variações que a atriz Angelina Jolie, cuja família apresenta outros casos de tumores ginecológicos, decidiu extirpar ambas as mamas como forma de prevenção. Uma opção extrema e controversa, na opinião de vários especialistas, que preferem lançar mão de drogas antitumorais e exames mais frequentes.
Com a decisão da Suprema Corte, restringe-se o monopólio da Myriad sobre os genes. O custo dos exames correspondentes pode cair. E, mais importante, restaura-se a liberdade de qualquer pesquisador trabalhar com essas sequências sem ter de pedir licença à empresa.
    EDITORIAIS
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    Poderes separados
    STF se inclina a não intervir na tramitação de projeto sobre partidos; tribunal dever examinar norma só após debates no Congresso
    Falta computar alguns votos, mas parece selado no Supremo Tribunal Federal (STF) o destino de uma liminar particularmente polêmica, concedida pelo ministro Gilmar Mendes em abril deste ano.
    A decisão de Mendes atendia aos pedidos de um senador do campo oposicionista, Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), que buscava sustar a tramitação do projeto de lei que dificulta a criação de novos partidos.
    No que foi visto como um claro casuísmo para prejudicar sobretudo a formação da Rede Sustentabilidade, agremiação com que Marina Silva pretende disputar as eleições presidenciais do ano que vem, a Câmara dos Deputados aprovou um conjunto de regras que restringe fortemente o acesso de novas legendas ao tempo de TV e às verbas do fundo partidário.
    É certo que a proposta tem uma faceta oportunista, pois sufoca a oposição e aumenta as chances de a presidente Dilma Rousseff ser reeleita no primeiro turno. Não é menos certo, porém, que teria o efeito de inibir manobras para driblar a fidelidade partidária.
    Gilmar Mendes, agora no plenário do STF, voltou a apoiar a reivindicação do senador Rollemberg. O ministro José Antonio Dias Toffoli, tido como simpático aos interesses governistas, acompanhou a decisão de seu colega.
    Foram os únicos, contudo. Prevaleceu na corte o entendimento de que não cabe ao Judiciário manifestar-se, desde já, sobre o projeto.
    Afinal, depois de aprovada na Câmara, a iniciativa tem ainda de passar pelo exame do Senado; em seguida, depende de sanção do Executivo para virar lei.
    Seria uma extravagância, raciocinaram outros ministros do STF, interromper o caminho do projeto antes mesmo de sua votação pelos senadores. O ato equivaleria a uma espécie de censura, por parte do Judiciário, sobre os debates internos ao Parlamento.
    O expediente seria admissível se houvesse grave vício formal, como o descumprimento de ritos legislativos ou a inobservância de prescrições regimentais --questões de tramitação, e não de conteúdo.
    Por inconstitucional que se considere o projeto da Câmara, reside ainda no Legislativo o campo legítimo da sua contestação.
    Apesar dos muitos argumentos de Mendes e de Toffoli, acertou a maioria dos ministros do STF em preservar um princípio tão ou mais importante que o da pluralidade partidária. A saber, o da independência entre os Poderes.
    No calor das disputas entre Congresso e Judiciário, prevaleceu um espírito de contenção e equilíbrio. Mesmo um ministro notoriamente cioso das prerrogativas do Supremo, como o presidente Joaquim Barbosa, deu a entender que, se for o caso, a constitucionalidade da iniciativa só poderá ser examinada depois de esgotados os debates parlamentares. O Judiciário avalia a constitucionalidade das leis, não de projetos ainda em curso.

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