Durante séculos meu sonho de consumo foi o Omega 6, isto é, o Chevrolet de seis cilindros que voava baixo
Eduardo Almeida Reis
Estado de Minas: 02/07/2013
Não faço a menor
ideia da quantidade de Omega 3 no salmão e devo confessar que não gosto
de salmão, que me parece peixe idiota. Salvo engano, é aquele que volta
ao rio em que nasceu para se reproduzir e morrer. Peixes e pessoas
inteligentes transam longe dos lugares onde nasceram e não associam o
love à morte. No máximo, gritam: “Me mata!”.
Durante séculos meu
sonho de consumo foi o Omega 6, isto é, o Chevrolet de seis cilindros
que voava baixo. Depois, tive notícia de muitos deles, seminovos,
blindados, à venda em São Paulo por R$ 20 mil. Noite dessas, na tevê, o
médico turco-americano Dr. Öz dizia que a farinha de chia tem Omega 3
igual ao do salmão. Mehmet Cengiz Öz é o Dráuzio Varella da tevê
americana.
Nascido em Cleveland, Ohio, United States, Mehmet é
casado com Lisa Oz e pai de Daphne Oz, Oliver Mustafa Oz, Arabella Sezen
Oz e Zoe Yasemin Oz. Na internet, só o cirurgião tem trema no Ö, o que
me faz supor que sua mulher e os quatro filhos aderiram ao Acordo
Ortográfico inventado pelos idiotas para vender livros brasileiros aos
187.356 moradores da República Democrática de São Tomé e Príncipe,
são-tomenses que elegeram presidente o senhor Manuel Pinto da Costa.
Faz
tempo que compro um pão de fôrma com chia e macadâmia. Mas é tão pouca
chia que o Omega 3 deve entrar como Omega 0,0000000003. Bom, mesmo, é
escrever no estilo são-tomense, como andei fazendo quando redigi alguns
trabalhos para empreiteira brasileira, que tinha por lá negócio
petrolífero. O texto rococó-salamaleque me divertia à beça. Antes de
entrar no assunto, você gasta 500 palavras elogiando e alinhando os
títulos do destinatário. Só aí, nos elogios, faturei charutos a montões.
Philosophar
Língua
é um sistema de representação constituído por palavras e por regras,
que as combinam em frases que os indivíduos de uma comunidade
linguística usam como principal meio de comunicação e de expressão,
falado ou escrito. Linguista e chato, Ferdinand de Saussure (1857-1913)
fala em sistema abstrato de signos inter-relacionados, de natureza
social e psíquica, obrigatório para todos os membros de uma comunidade
linguística. E uma coisa é certa: o sistema é vivo. Como tal, pode ser
morto. Há notícia de milhares de línguas mortas. E a língua portuguesa,
ainda viva e com 280 milhões de falantes, tem sofrido cada agressão que
vou te contar.
Temos pequena saliência cartilaginosa à entrada da
orelha externa, que se cobre de pelos nas idades mais avançadas: é o
trago ou trágus. Nos morcegos, também mamíferos, o trágus ajuda na
orientação em voo. Se não me falha a memória, morcegos que avoam em
áreas de muitos obstáculos têm trágus proporcionalmente maiores.
Três
séculos antes do trágus entrou em nosso idioma o trago, aquilo que se
traga ou bebe de uma só vez; gole, sorvo, hausto. E aqui temos agressão
constante à língua de Camões: milhões de brasileiros usam trago em lugar
do particípio trazido do verbo trazer. Verbo que tem trago, mas na
primeira do singular no indicativo presente: “Trago as bebidas”, mas não
tem cabimento quando dizem: “Se soubesse do frio eu teria trago o meu
casaco”.
Temos, agora, outra agressão que ouvi na tevê de um
craque no vôlei, acho que gaúcho, explicando como conheceu sua
companheira, também atleta, que teria vindo de um estado nordestino: “A
gente tinha chego aqui”. Pois é: se a gente tinha chego, pintou um clima
de aconchego. Que sejam felizes.
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