O Hamlet dos quelônios
Menino que vende trufas por Paraty é o protagonista real de uma sórdida trama shakespeariana
Quem vê de longe não imagina a contundência de sua história, desenvolvida soberbamente num arco narrativo que durou cinco minutos.
Onisciente, ele sempre soube que sua antiga babá não era uma pessoa boa, embora o aparentasse. "Ela fritou a minha tartaruga", acusa, "e eu soube disso porque instalei uma câmera".
A ex-babá defendeu-se dizendo que o quelônio fugiu e que ela não conseguiu apanhá-lo, mas a desculpa era inverossímil e as imagens, incontestáveis. Como todo bom arquétipo de herói, Leonardo transformou o incidente em cruzada. "Já faz uns dois anos que me dedico a fazer da vida dela um inferno", declara.
Demitida, a assassina de quelônios virou professora da turma dele. Botar cola na cadeira da docente e bagunçar os papéis da aula é o mínimo que os justiceiros mirins costumam praticar contra a vilã: "Um dia ela cochilou na aula e acordou de ponta-cabeça", garante.
Outra passagem dramática desta Flip ocorreu na Tenda dos Autores, pouco antes da conferência de abertura sobre Graciliano Ramos. Seguranças barraram a entrada de uma sofrida cadela manca, que tinha um olhar literário e talvez fosse uma reencarnação da cachorra Baleia, de "Vidas Secas".
Defensor dos aflitos, Leonardo não se pronunciou sobre o assunto. Especula-se que o dinheiro das trufas seja empregado em atividades clandestinas voltadas à reparação de crueldades aleatórias.
Leonardo é o herói trágico do ano.
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