Márcia Maria Cruz
Estado de Minas: 19/11/2012
Indicada para a perda de peso em obesos mórbidos, a cirurgia bariátrica tem suas aplicações ampliadas para o tratamento de doenças relacionadas à síndrome metabólica. Associada ao ganho excessivo de peso, a síndrome engloba doenças como o diabetes tipo 2, hipertensão, alterações na glicose e no colesterol. Essas condições são unidas por um elo chamado resistência insulínica, que tem relação direta com o metabolismo no organismo. “O foco dessa cirurgia sempre foi a perda de peso e secundariamente a melhora de doenças como diabetes e hipertensão”, afirma o presidente da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica Almino Cardoso Ramos.
Durante o 14º Congresso da Sociedade Brasileira de Cirurgia Bariátrica e Metabólica e 4º Congresso Pan-americano para Tratamento do Diabetes Mellitus Tipo 2: Alternativas Clínicas e Cirúrgicas, realizados no fim de outubro em Maceió, especialistas de todo o Brasil discutiram a ampliação dos efeitos da intervenção cirúrgica principalmente para o tratamento do diabetes tipo 2, cujo dia mundial de prevenção foi lembrado na quarta-feira passada. Ao longo dos anos, os especialistas e também pesquisadores encontraram evidências de que, dias depois da cirurgia, os pacientes tinham melhora no nível de glicose e outros marcadores, não só porque ocorria uma perda de peso, mas por se verificar uma alteração na produção de hormônios e, consequentemente, no processo metabólico.
A mudança na aplicação da cirurgia engloba também a flexibilização dos critérios para a indicação do tratamento aos pacientes. O índice de massa corporal (IMC) ainda é o principal critério para determinar se alguém deve ou não se submeter a uma intervenção cirúrgica. Para ser elegível à cirurgia bariátrica, o paciente deve estar com IMC igual ou superior a 40 kg/m2 ou igual ou superior a 35 kg/m2 em casos que há outras doenças associadas (comorbidades), como o diabetes, a pressão alta e a gordura visceral. Como o IMC é encontrado pela divisão do peso pela altura ao quadrado, o cálculo indica de forma matemática se o indivíduo está com o peso normal, sobrepeso ou obeso.
No entanto, somente a classificação pelo IMC, mesmo acima do que se considera como obeso, não demonstra se o paciente é saudável ou não. “O risco não é ser gordo. É ter enfermidades metabólicas”, afirma Almino. De acordo com o especialista, há uma mudança na avaliação que deixa de ser baseada em apenas aspectos matemáticos para englobar análise mais complexa do quadro de saúde do paciente. O IMC continuará sendo um dos parâmetros, mas a tendência é olhar outros marcadores relacionados à síndrome metabólica. Almino informou que está sendo criada junto com o Conselho Federal de Medicina uma câmara multidisciplinar para discutir esses novos parâmetros.
A mudança nos parâmetros pode abrir caminho para que a cirurgia metabólica seja usada para o tratamento do diabetes tipo 2 para pacientes com IMC abaixo de 35. Ao perceber que os pacientes obesos mórbidos que eram diabéticos controlavam as taxas de glicose uma semana depois da cirurgia, os médicos perceberam que a melhora não se devia exclusivamente à perda de peso. Isso se deve ao fato de a cirurgia aumentar a produção de hormônios estimuladores do pâncreas, onde a insulina, por sua vez, é sintetizada. O diabetes tipo 2 não é hereditário como no tipo 1, geralmente a doença se desenvolve em adultos com maus hábitos alimentares.
Ao desenvolver a doença, esses indivíduos criam uma resistência insulínica. A medicação tenta normalizar nesses pacientes a produção e absorção desse hormônio. De acordo com Almino Ramos, a cirurgia potencializa em até 20 vezes o efeito que a medicação teria no organismo – o que torna a intervenção uma opção bastante eficiente. As diferentes técnicas cirúrgicas atuam de forma restritiva, promovendo a redução do tamanho do estômago, e desabsortiva, mudando o trajeto do intestino, o que leva a uma alteração na absorção de nutrientes.
A mudança, porém, também atua na produção dos hormônios, o que resulta nos ganhos metabólicos que explicam as melhoras na produção de insulina. “Estamos em uma nova era para o tratamento do diabético obeso”, afirma o cirurgião geral Marcelo Girundi, que está à frente da equipe que opera nos hospitais Mater Dei, Lifecenter e São Francisco, todos em Belo Horizonte. O médico apresentou durante o congresso resultados obtidos ao longo de 12 anos de estudos. Foram acompanhados 5.211 pacientes, sendo que, desses, 468 eram diabéticos. “Desse número de diabéticos, 410 tiveram a remissão total da doença. Foram 88% de resolução, um índice muito alto”, ponta Girundi.
São aprovadas no Brasil quatro modalidades de cirurgia: bypass gástrico, banda gástrica ajustável, as derivações bíleo-pancreáticas (duodenal switch e Scopinaro) e a gastrectomia vertical (veja quadro). Todas podem ser feitas por videolaparoscopia, método menos invasivo e mais confortável para o paciente. De acordo com Almino, os riscos da cirurgia são cada vez menores, com mortalidade em 0,15% dos casos. As complicações aparecem em 1% dos casos.
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