segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Democracia na China? - Luiz Carlos Bresser-Pereira


LUIZ CARLOS BRESSER-PEREIRA
Desenvolvimento econômico está criando uma imensa classe média que demanda ser ouvida
Na última semana, a China escolheu seus novos dirigentes de forma meritocrática e autoritária, não obstante o incrível desenvolvimento econômico por que passou nos últimos 30 anos.
Tenderá a China a se transformar em uma democracia? Minha resposta é afirmativa, mas o processo de democratização deverá ser lento.
A democracia seria impossível se o país continuasse uma sociedade estatista. Mas o estatismo de Mao Tse-Tung foi, afinal, a primeira fase da revolução capitalista chinesa; foi a fase da revolução nacional, que transformou o país em uma verdadeira nação, e foi a fase de sua industrialização pesada.
Depois veio a extraordinária fase da abertura econômica. Hoje a China é um país tecnoburocrático-capitalista, como são todos os países ricos e de renda média do mundo. Por enquanto, é uma sociedade mais tecnoburocrática do que capitalista, mas está em plena mudança.
Nenhuma revolução nacional e industrial aconteceu em país algum no quadro de uma verdadeira democracia, mas depois que a revolução capitalista se completa em cada país, seu Estado tende necessariamente a se tornar democrático.
A principal exceção a essa regra é Cingapura, mas a transição democrática lá deverá ocorrer em breve.
A China está longe do nível de desenvolvimento de Cingapura, mas as modificações que já aconteceram na sua sociedade e na política vêm sendo muito grandes e apontam no sentido da liberalização do regime.
O Partido Comunista continua a ser partido único, e seu poder está colocado fora de discussão, mas isto não significa que exista lá um sistema político monolítico.
Conforme assinalou Jamil Anderlini em um excelente artigo no "Financial Times", as elites dentro e fora do Partido Comunista podem ser divididas entre as "reformistas" e as "autoritárias" -e as primeiras estão avançando.
Mesmo o jornal "Diário do Povo" -porta-voz oficial do Partido Comunista- disse em um editorial há duas semanas que "a sociedade vem tomando consciência do seu direito de saber e participar e a garantia dos direitos civis avança, mas a democracia na China não alcançou o nível que muita gente espera".
Este debate não terá solução a curto prazo. A China continua voltada para sua própria estratégia nacional de desenvolvimento, em que o Estado mantém o controle dos setores monopolistas e das finanças administrando ou planejando suas atividades, ao mesmo tempo em que atribui a um mercado livre o setor competitivo da economia.
Entretanto, esse desenvolvimento está criando uma imensa classe média que demanda ser ouvida.
As manifestações nesse sentido estão se multiplicando. Essa nova classe média e mesmo as classes populares já estão sendo ouvidas a nível local, mas nas grandes cidades o nível local perde identidade, e é preciso pensar em uma participação política mais ampla.
Conseguirão os chineses realizar essa transição sem uma crise maior?
Não é possível assegurar nada a respeito, mas o pragmatismo e a busca de "harmonia social" (expressão chave para os chineses) que têm caracterizado a política chinesa sugerem que sim. Há um objetivo maior, o desenvolvimento econômico, mas o avanço político, o social, e mesmo ambiental não estão sendo nem serão desconsiderados, porque a sociedade assim exige.

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