Estado de Minas: 13/01/2013
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Quando eu era adolescente, um entregador típico do que seria hoje a classe C foi à minha casa deixar uma encomenda e, ao ouvir um concerto de música clássica que soava no rádio, perguntou se podia ficar ali também ouvindo. E ficou mais meia hora encostado na porta, em êxtase.
Quando eu era adolescente, um entregador típico do que seria hoje a classe C foi à minha casa deixar uma encomenda e, ao ouvir um concerto de música clássica que soava no rádio, perguntou se podia ficar ali também ouvindo. E ficou mais meia hora encostado na porta, em êxtase.
Outro dia, ao entrar num táxi, o chofer me perguntou que música gostaria de ouvir, porque ele ouvia música clássica.
Toda vez que abrem o Municipal ou fazem concertos populares há uma avalanche de pessoas. Penso nessas coisas depois de ler uma mensagem discreta de Heloísa Fischer na Agenda VivaMúsica. Deixem-me explicar: Heloísa não só edita aquela agenda, que dá ideia do movimento musical em todo o país. Ela tem programa na Rádio MEC e faz tudo para que a música clássica atinja todas as classes sociais.
Acontece que abri a agenda deste mês e de repente encontro uma noticia fúnebre: “A partir de março os voos da TAM deixam de transmitir o programa Clássicos VivaMúsica no canal 4”. Heloísa foi informada de que “as grandes transformações da aviação comercial implicam mudanças também no entretenimento a bordo”.
No entanto, durante seis anos, de maio de 2007 até janeiro de 2013, foram produzidos por ela 33 programas bimestrais. Heloísa apresentou assim, aos milhares de passageiros, a produção de compositores brasileiros e estrangeiros. De repente, a música clássica saiu literalmente do ar.
Uma coisa me preocupa nessas “grandes transformações da aviação comercial”: o afã de medir o gosto dos clientes de forma deturpadamente populista. Quem disse que as festejadas classes C e D só gostam de pagode e cantoria sertaneja universitária? E ainda que gostem, por que ignorar os demais passageiros e nivelar todos por um gosto único?
Adorava ouvir musica clássica nos aviões, sobretudo internacionais. Havia até um canal de ópera. Por que as companhias aéreas não pensam mais alto? Explico-me: sempre achei que as companhias de aviação deveriam ter, além de música clássica, pelo menos um canal dedicado à literatura. Pensava em como seria interessante a pessoa estar ali sentada e ouvir uma crônica de Rubem Braga ou Fernando Sabino; como seria instigante ouvir um poema de Augusto dos Anjos, Bilac, Drummond ou Vinicius. Nem sempre a pessoa quer ler aquelas revistas feitas de picadinhos de notícias e muito anúncio. Aníbal Machado tem uns textos ótimos, Nelson Rodrigues ia divertir as pessoas.
E como aconteceu de ter uma aluna que era aeromoça da antiga Varig, ela se ofereceu para levar meu projeto literário àquela companhia. Deu em nada. Eu propunha voos mais altos.
Acho que estamos indo de mal a pior. Há alguns anos, havia no Rio uma rádio comercial chamada Opus 90, que só transmitia música clássica. Era um sucesso. Mas acabaram com ela. Na ocasião desse desastre, falei com Roberto Marinho para entrar nisso. A seguir, num jantar na casa de José Roberto Marinho, sugeri que fizesse algo. De nada adiantou.
As pessoas continuam achando que arte é coisa do governo. Digo isso no mesmo momento em que ligo a TV e vejo surgir, pela Sky, o canal 101: Arte 1. De quem é? Está em fase experimental.
Nem tudo está perdido aqui na Terra.
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