Zero Hora: 05/01/2013
O cientista político americano Francis Fukuyama ficou famoso no final
dos anos 80 desenvolvendo a tese de que o liberalismo havia triunfado.
Fukuyama não foi o primeiro nem o mais notável defensor do liberalismo,
mas talvez tenha sido o mais engenhoso na hora de bolar um chamariz de
leitura altamente manchetável. Boa parte da repercussão que suas ideias
alcançaram nos anos seguintes pode ter sido impulsionada pelo título
provocativo do artigo que publicou em 1988: “Fim da História?”.
Dá para entender por que tanta gente ficou incomodada. Imagine que
seu time está perdendo por 3 a 0 aos 30 minutos do primeiro tempo, e um
gaiato do time adversário decide levantar a placa “Fim do Jogo” (ou
mesmo “Fim do Jogo?”). Decretar o final da partida no primeiro tempo não
é apenas precipitado, mas soa arrogante e pouco inteligente. Como
prever, em 1988, o 11 de Setembro, o Facebook, a Primavera Árabe, o
iogurte grego? Olhando para trás, fica óbvio que o mundo deu cambalhotas
nos últimos 25 anos.
E mesmo que o tal “fim da história” fosse apenas uma provocação
circunscrita ao campo das grandes ideologias, parece contraintuitivo
(até mesmo para os mais ardorosos defensores do liberalismo) imaginar
que chegamos a qualquer tipo de desfecho, quando a sensação em relação
às mudanças da nossa época talvez seja exatamente a oposta.
Um curioso estudo publicado há pouco na revista Science, coordenado
pelo psicólogo Daniel Gilbert, sugere que todo mundo é um pouco
“Fukuyama” em relação ao próprio futuro. Ou seja: tende a acreditar que
chegou, se não ao fim, pelo menos ao ápice da própria história.
O eu do passado pode ter sido inconstante, volúvel e ter o péssimo
hábito de chorar ouvindo Abba, mas o eu do presente sabe exatamente quem
é e o que quer da vida – já o eu do futuro seria apenas uma versão mais
barriguda do eu do presente. É o que os autores do estudo apelidaram de
“ilusão do fim da história”.
Entrevistando voluntários entre 18 e 68 anos, a equipe de Gilbert
chegou à conclusão de que as pessoas percebem com muita facilidade que
mudaram nos 10 anos anteriores (mesmo os mais velhos), mas não imaginam
que vão continuar mudando. Da escolha da carreira à do parceiro amoroso,
do planejamento familiar ao financiamento da casa própria, muitas
decisões de longo prazo partem da ilusão de que sabemos exatamente quem
seremos no futuro. Esperamos que os outros mudem, que o mundo mude, mas
temos certa dificuldade para aceitar que nossos valores, preferências e
mesmo traços de personalidade também podem se alterar.
Se todo mundo levasse em conta as possíveis mudanças de opinião do
futuro, tatuagens nunca teriam virado moda e casamentos provavelmente
seriam mais a exceção do que a regra. Talvez seja preciso depositar
alguma esperança no fato improvável de que o futuro não vai nos
surpreender tanto assim para não sermos completamente paralisados pela
angústia de fazer escolhas erradas.
Ninguém pode prever o futuro, é verdade, mas todo mundo pode olhar
para os lados de vez em quando. “A melhor maneira de fazer previsões
sobre o que você vai querer no futuro não é imaginar-se daqui a alguns
anos, mas observar os mais velhos”, sugere Daniel Gilbert. “São os
outros que vão lhe dar as melhores informações sobre o que você pode
esperar do futuro”.
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