terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Tereza Cruvinel - Além da dor‏

Para além da dor, a das famílias e a coletiva, resta o dever de questionar, investigar, esclarecer, punir responsáveis e corrigir as falhas, legais ou normativas, que possibilitaram o absurdo 

Estado de Minas: 29/01/2013 
Muita coisa dói, no corpo e na alma. Dor de dente, dor do amor ausente, dores as mais diferentes. Nenhuma dói mais que a dor da morte. Quando ela colhe quem já viveu muito, sofremos, mas aceitamos. Já a morte dos que estavam na flor da idade machuca e revolta. É vida desperdiçada. Mais funda é a ferida quando tantos, todos tão jovens, perdem a vida desnecessariamente. Para além da dor das famílias que perderam seus jovens na tragédia de Santa Maria (RS), há uma dor que é do Brasil. É da nacionalidade ferida pela certeza de que isso poderia ter sido evitado. Dor que a presidente Dilma Rousseff encarnou ao abrir o encontro nacional de prefeitos pedindo um minuto de silêncio pelas vítimas e seus parentes e prometendo que tragédia igual não se repetirá.

Para além da dor, a das famílias e a coletiva, resta o dever de questionar, investigar, esclarecer, punir responsáveis e corrigir as falhas, legais ou normativas, que possibilitaram o absurdo. Embora não tenha avançado em detalhes, Dilma certamente referiu-se às providências que precisam ser tomadas, nos três níveis da Federação, em relação aos estabelecimentos de entretenimento e diversão, para que algo tão brutal não se repita. Agora, sob o impacto da tragédia, um mero olhar sobre a planta baixa da Boate Kiss, que circula na internet, nos leva a concluir, estupefatos, que o ocorrido está mais próximo do previsível que do absurdo. O espaço de 650 metros quadrados, com capacidade para receber mil pessoas, dispunha de uma porta única, que era ao mesmo tempo de entrada, de saída e de emergência. O espaço interno era exíguo e opressivo. Na noite de sábado, lá estavam não mil, mas 1,5 mil pessoas, que não tiveram a chance de escapar. Morreram asfixiadas porque os extintores não funcionaram. Numa casa de tal porte, os sprinklers deviam ser obrigatórios. Eles entram em ação automaticamente, dispensando o manuseio dos extintores rudimentares. Morreram pisoteadas porque não havia saída de emergência. Os seguranças, lembrando o pianista do Titanic, que seguiu tocando enquanto o navio afundava, barraram muita gente cobrando o pagamento da conta. Um frio nos perpassa quando pensamos que o horror poderia ter acontecido com o meu filho, com a sua filha. Não é muito diferente nos milhares de boates espalhadas pelo Brasil afora.

Sabe-se agora que o Corpo de Bombeiros vistoriou a boate em novembro e exigiu adequações. O Plano de Prevenção e Controle de Incêndios estava vencido, mas a casa continuou funcionando. O material acústico era altamente inflamável, mas não foi pedida a troca. Foi neste cenário que a casa ofereceu um show com uso de material catalogado como fogos de artifício, os tais sputniks no solo do palco e o sinalizador de mão usado pelo vocalista da banda. Uma fagulha no teto inflamável e o que era festa virou inferno: fumaça tóxica, pânico, pisoteio, centenas de mortos e feridos. 

Para que algo assim jamais se repita, como prometeu Dilma, a primeira providência será uma fiscalização intensiva Brasil afora. Depois, a aprovação de uma legislação nacional anti-incêndio, que hoje não existe. Cada prefeitura faz suas regras. No Distrito Federal, as brigadas anti-incêndio são obrigatórias em todos os estabelecimentos com mais de 750m² . Em alguns estados elas são exigidas, em outros não. A grande maioria deixa a normatização a cargo das prefeituras. Tramita na Câmara, desde 2007, projeto da deputada Elcione Barbalho tratando especificamente da segurança em boates e casas de espetáculos. Agora, deve ganhar urgência. É tarde para os que morreram em Santa Maria, para os feridos que ainda podem morrer, mas, diante da negligência nacional, devemos dizer “antes tarde do que nunca”. Para além da dor, o Brasil precisará  provar que tomou providências, com vistas à Copa do Mundo e às Olimpíadas. O mundo se comoveu, mas cobranças externas já começaram. 

Lula no mundo

Ontem, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva embarcou para Havana, onde visitará o presidente venezuelano Hugo Chávez, que ali trava sua luta contra o câncer, devendo se encontrar também com o presidente Raúl Castro e com o próprio Fidel Castro. Depois, visitará a República Dominicana, onde se encontra com o presidente Danilo Medina Sánchez e o ex-presidente Leonel Fernádez. No dia 3, em Washington, faz o discurso de abertura da conferência da central sindical da indústria automotiva e aeroespacial, a UAW.

Em março, Lula volta aos Estados Unidos para receber, em Nova York, prêmio especial conferido pelo International Crisis Groug (ICG), organização presidida pela ex-comissária da ONU Louise Arbour, que recebeu com Lula, em 2011, o Prêmio Norte-Sul, conferido pelo Conselho Europeu. O prêmio do ICG é oferecido aos que se destacaram na promoção da paz, a segurança e o desenvolvimento dos povos. Lula o dividirá com o atual presidente de Myanmar.
 
Dilma no alvo

Os tucanos vão mesmo entrar com representação contra a presidente Dilma por conta do pronunciamento em cadeia de rádio e televisão para anunciar a redução da tarifa elétrica, na semana passada. Se o pedido cair na mão da procuradora eleitoral Sandra Cureau, deve ser acolhido. Na campanha de 2010, quando Dilma se elegeu, ela foi tenaz.

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