terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Tendências/Debates

FOLHA DE SÃO PAULO

PEDRO TAQUES
O cidadão tem toda razão
O país desconfia do Senado e se espanta com o continuísmo no poder. A mudança deve começar pela coragem de mostrar a cara e se posicionar
Desconfiar dos políticos é uma maravilhosa tradição republicana. Eu, que me orgulho de ser político, percebo que as instituições no Brasil ainda precisam caminhar muito para que o povo se sinta devidamente representado. Isso vale para os cargos do Poder Executivo, do Legislativo e até para o Judiciário, embora seus membros não sejam eleitos.
Como senador da República, vejo claramente que a Praça dos Três Poderes não tem um banco cômodo e aconchegante, no qual o cidadão brasileiro se sinta convidado a se sentar.
Isso pode mudar, evidentemente. E deve mudar. A democracia se constrói com instituições fortes, arejadas e atentas à realidade nacional. Elas são legitimadas pelo voto, nos casos do Executivo e do Legislativo, mas, também, por sua própria atuação.
A mudança no ambiente do Legislativo deve começar pela coragem de "mostrar a cara", de atuar com transparência e de defender, com firmeza, seus pontos de vista. Vencer ou perder votações e disputas não é o mais importante, porque o Senado e a Câmara devem ser, justamente, casas de debates das questões do país.
Outra exigência é a ética mais estrita, a conduta que não gera dúvidas sobre se o objetivo dos políticos é servir o Brasil ou servir-se dele. E, por fim, deve existir renovação. A dinâmica sociedade brasileira muitas vezes se espanta com o continuísmo que parece imperar em tantas instâncias de poder.
Por essas razões -transparência, ética e renovação-, resolvi lançar minha candidatura à presidência do Senado. O resultado não é o mais importante -se vou ganhar ou perder-, mas faço questão de mostrar as minhas propostas e de me lançar como alternativa. A omissão me parece sempre a pior solução.
Tenho trânsito na base de sustentação ao governo e, também, na oposição (que está excessivamente desanimada...). Participo da disputa para evitar que tudo pareça um "acordo de cavalheiros".
O Senado não pode ser um clube para poucos, que vira as costas para a sociedade que representa. Ainda que os cargos sejam ocupados de acordo com a força dos partidos e blocos partidários, a disputa interessa ao país inteiro.
As minhas propostas procuram concretizar aqueles três requisitos necessários para a mudança dos costumes políticos: transparência, ética e renovação. Não procuro confrontar ninguém, mas zelar pelo cumprimento da Constituição.
Por exemplo, as funções próprias do Legislativo, fiscalizar e legislar, devem ser prestigiadas. Hoje, elas estão diminuídas pelo agigantamento do Poder Executivo e seu gosto de legislar por medidas provisórias.
O Brasil desconfia do Senado da República, de sua atuação, de sua administração e de sua utilidade. É uma desconfiança legítima e válida. Afinal, foram tantos os escândalos em tempos recentes!
Cabe a nós, senadores, criar caminhos para que essas desconfianças sejam afastadas, mostrando trabalho honesto e duro, sempre no sentido de resolver conflitos entre os Estados e de aprimorar nosso pacto federativo. Quero ampliar as funções de ouvidoria administrativa e o papel da Comissão de Ética.
Todo candidato que se bate contra uma maioria presumida é um "anticandidato", como o foi, a seu tempo, o grande brasileiro Ulysses Guimarães.
Sou, então, um dos anticandidatos à presidência do Senado. Estou "mostrando a minha cara". Não sou o candidato da volta, mas da reviravolta. Até os peixes do rio Cuiabá sabem que não há vida se não houver coragem.
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ANDREA MATARAZZO
Omissão de socorro é crime
É covarde esperar que o usuário de droga tome a iniciativa de se proteger. Você abandonaria seu filho se o visse fumando crack na rua?
"Tio, tira a gente da pedra?" O apelo de três garotos de nove, dez e 12 anos de idade me sensibilizou para a tragédia da dependência química no centro de São Paulo, há quase uma década.
Eu era subprefeito da Sé e encaminhei os meninos aos centros de assistência social. Desapareceram em poucos dias. Localizamos um deles, que comentou a monotonia das atividades nos abrigos.
Palestras e horários rígidos são ineficazes para seduzir quem vive em liberdade. Foi o que nos desafiou a criar um programa piloto capaz de atrair o interesse das crianças que moram na rua e usam crack.
Desde 2005, o Programa Equilíbrio, sob coordenação da professora Sandra Scivoletto, do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas, mantém um time de médicos, psiquiatras, fonoaudiólogos, assistentes sociais, educadores e animadores culturais, para oferecer atenção individual e atividades atraentes aos jovens em situação de risco social. Até 2012, foram mais de 64 mil atendimentos. A taxa de reintegração familiar tem sido de 44%.
Cruzar os braços diante do aumento do consumo de crack, problema grave de saúde pública, é atitude criminosa. A droga não distingue classes sociais ou geografia. Exige do poder público medidas urgentes visando a proteção dos usuários, das famílias e dos grupos de convívio. Especialmente da população carente, que não sabe a quem recorrer. E o país tem falhado na oferta de alternativas para as famílias de baixa renda.
O tratamento da dependência química é um processo doloroso, que exige vigilância e suporte médico especializado nas crises de abstinência, estrutura inexistente nos Centros de Atenção Psicossocial (Caps), do governo federal. O Ministério da Saúde sequer elaborou um protocolo. Orienta apenas a chamada Redução de Danos, inócua diante da gravidade da questão.
As vítimas das cracolândias são cidadãos que foram parar nas ruas por problemas anteriores. Dos 16 mil moradores de rua de São Paulo, 75% usam drogas ou têm transtornos mentais. É absurdo esperar que alguém nessas condições tenha iniciativa de buscar ajuda, ou se mantenha longe do vício pela força de vontade. Os que vagam em busca da "pedra" perderam a consciência do próprio sofrimento. Vivem apenas para consumir a droga, definhando à espera da morte.
Famílias que têm condições financeiras e informação internam seus entes queridos em clínicas de desintoxicação, mesmo contra a vontade dos mesmos. Para a maioria dos pais, filhos, irmãos e companheiros dos usuários de drogas que hoje perambulam pelas ruas, inexistem alternativas.
Sensível a esse drama, o governador e médico Geraldo Alckmin articulou um programa de internação involuntária dos dependentes de crack se o risco de morte em decorrência do vício for reconhecido por equipes de saúde e da Justiça. Não se trata, como insinuam os oportunistas, de "limpar as ruas". E, sim, de salvar gente que vai morrer se não receber ajuda.
Medida a ser adotada apenas quando todos os recursos forem esgotados, depende da autorização de um juiz depois que uma junta médica atestar a perda do domínio sobre a saúde e condição física do usuário. E exige aval do Ministério Público e de advogados voluntários da OAB.
É covarde, cruel e desumano esperar que o próprio dependente da droga tome a iniciativa para se proteger. Se você visse seu filho fumando crack, maltrapilho, cambaleante, o abandonaria na rua? Criticar a internação involuntária é politizar a tragédia dos que não podem se defender. Cruzar os braços é omissão de socorro.
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