A justiça dos homens
A resposta da justiça humana não será rápida. Será muito mais lenta do que desejarão ver os parentes das vítimas
Nas manifestações públicas, especialmente no Rio Grande do Sul e em outras partes do país, foi forte o traço comum. Estava nos cartazes referentes à morte de mais de duas centenas de jovens, na boate incendiada. Letras maiúsculas traziam a palavra "JUSTIÇA!". Era o claro anseio de que as mortes resultem na condenação de todos os culpados. Por ação ou omissão. De entes públicos ou privados. Todos os que deram causa ao resultado pavoroso (Constituição, art. 5º, incisos 35 a 37 e 40).
Trata-se, como evidente, de fazer a justiça dos homens, da lei escrita, para o processo punitivo dos responsáveis e absolutório dos inocentes (Constituição, art. 5º, inciso 57). Serão penas compatíveis com as circunstâncias agravantes, não acolhida a alegação de imprevisibilidade do resultado ou outra que as defesas criarem.
Para os familiares das vítimas, nenhuma punição lhes trará de volta os seres queridos, mas a gravidade do efeito sugere a equiparação da conduta dos responsáveis às alternativas de crime doloso (Código Penal, art. 18, ao fim). Os controladores da boate, direta ou indiretamente -segundo as informações divulgadas- agravaram o resultado, por omissão, ou se impediram os frequentadores de saírem (sem que pagassem pelo consumo), se adotaram fogos de artifício no espaço interno. Ou se admitiram o ingresso de clientes acima do possível. A prova das agravantes há de ser cabal.
A resposta da justiça humana não será rápida. Será muito mais lenta do que desejarão ver os parentes das vítimas. O resultado almejado, da resposta em tempo breve, poderia sacrificar o direito de defesa dos que o quiserem defender? Essa é a pergunta mais comum, ouvida quanto aos fatos. É sempre respondida pela última alternativa possível: não. Não poderá. Na área da segurança pública a apuração inclui a polícia civil, à qual incumbe o levantamento do que aconteceu antes, durante e depois dos fatos, na produção do inquérito. Haverá cooperação da polícia militar quanto aos banheiros.
O julgamento é centrado no Poder Judiciário. Vai do juiz de direito (na comarca local) passar pelas cortes intermediárias, até os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). O Ministério Público tem autonomia para a promoção da ação penal (Constituição, arts. 127 e 18, inciso II). A Carta Magna inclui, ainda, o advogado (privado ou público), assim como o defensor público para atuarem imprescindivelmente em favor dos acusados.
No processo, os elementos técnicos serão definidos em laudos, por peritos nomeados pelo juiz e por assistentes das partes.
O leitor pode acompanhar o desenvolver dos fatos, até -no fim do processo- saber o resultado com as condenações e absolvições. Trilhas diversas acolherão ações cíveis, movidas pelas famílias das vítimas, contra os responsáveis, sejam eles privados (empresários da boate e seus contratados) ou públicos (autoridades encarregadas do controle administrativo das condições do local e de sua fiscalização).
Quanto tempo se passará, com os procedimentos envolvidos da apuração à condenação ou à absolvição? É impossível prever. A experiência permite arriscar um mínimo de dez anos. A previsão pode parecer exagerada, mas é muito pouco provável que o fim do processo chegue antes.
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Nina Stocco Ranieri, orientadora desta dissertação de mestrado (Fadusp), diz no prefácio que "a doutrina dos direitos humanos", sustentada pelo autor, é pressuposto do Estado. Ungaro diz que "já vai longe o tempo do arbítrio absoluto", reafirmando o Estado de Direito.
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Dissertação de mestrado da UFMG foi distinguida por Humberto Theodoro Júnior, ao dizer que "assiste razão à autora", quando enuncia com clareza que o contraditório se completará "pelo controle de legalidade e justiça da sentença". O ensaio dá contribuição à visão do tema e de seus consequentes.
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