JANAINA CONCEIÇÃO PASCHOAL
Há 12 brasileiros sequestrados!
O país deve exigir a imediata devolução dos torcedores corintianos inocentes. Eles não podem ser usados como estandartes do rigor boliviano
Durante um jogo de futebol na Bolívia, alguém disparou um sinalizador e um jovem morreu. A comoção foi imediata e proporcional à situação. O desenrolar da história, entretanto, fugiu a todos os padrões, pois, por um sinalizador lançado, 12 cidadãos brasileiros foram e continuam presos, não se sabe em que condições.
A lição mais óbvia é a de que se deve abolir o uso dos fatídicos sinalizadores. Acontecimentos recentes provam que eles só causam problemas. Revistar o público antes dos jogos de futebol também constitui necessidade básica, valendo ficar atento para a Copa que se aproxima.
Há, ainda, as consequências desportivas como a da punição do time e, por conseguinte, da torcida.
Várias foram as manifestações na imprensa, todas em torno dos males causados pelas torcidas organizadas e do cabimento, ou não, das sanções aplicadas a todos os torcedores em virtude do ato de um.
Estranhamente, até agora, ninguém perguntou como pode o ato de uma única pessoa levar 12 a prisão! E, pior, não parece fazer diferença o fato de nenhum dos 12 presos ter sido o autor do disparo do sinalizador.
A situação resta ainda mais problemática quando se constata que, tendo aparecido um culpado, a Justiça boliviana se nega a libertar os brasileiros, mantendo-os em cárcere até que o indivíduo se apresente! Ora, o que é isso senão um sequestro?
Mesmo que o verdadeiro autor do disparo do sinalizador tivesse sido detido, por se tratar de uma conduta culposa (o sinalizador foi lançado sem qualquer intenção de matar alguém), a prisão provisória poderia ser contestada.
É certo que competiria às autoridades brasileiras zelar para que o preso fosse mantido separado dos demais encarcerados, até para a preservação de sua integridade física, dada a repercussão do caso e a hostilidade que costuma haver relativamente aos estrangeiros.
No entanto, diante da prisão de pessoas inocentes, o país deve exigir a imediata devolução de seus cidadãos, que não podem continuar sendo usados como estandartes do rigor boliviano.
É como se, por estar no lugar errado, na hora errada, toda arbitrariedade findasse legitimada. Poder-se-ia alegar que os detidos também estavam portando sinalizadores, o que, aliás, não restou evidenciado. Mas mesmo que isso fosse verdade, por acaso, quando alguém é atropelado, o motorista que passa ao lado pode ser responsabilizado, porque, afinal, também estava dirigindo? Não tem o menor sentido!
Nem sequer em casos de crimes dolosos, quando, por exemplo, um sujeito dá um tiro na cabeça de outro, querendo matá-lo, os amigos do atirador podem ser punidos.
O que está acontecendo na Bolívia contraria, flagrantemente, os fatos e a lógica jurídica de qualquer sociedade minimamente democrática.
Lançar o sinalizador foi uma idiotice. A morte do rapaz pode, sim, ser considerada um homicídio; entretanto, trata-se de homicídio culposo (sem intenção) e é impossível admitir que 12 pessoas sejam infundadamente mantidas presas como reféns. O Itamaraty tem que fazer alguma coisa, não só no âmbito jurídico, mas também no político!
LUIZ CARLOS BARRETO
As demandas estratégicas do século 21
A produção cultural já é, e cada vez mais será, a força mobilizadora do século 21. Mas, no Brasil, ainda é tratada como algo supérfluo
Em matéria de alimento, o Brasil vem se preparando bem, com a adoção de inteligente política de produção. No campo da energia limpa, nossa posição é confortável dado o potencial hidroelétrico, a política atômica para fins pacíficos e as reservas de água potável (16% de toda a reserva mundial). Dispensável falar do que representa o pré-sal.
O preocupante é pensar na nossa condição de produtores de conteúdos culturais com vistas ao abastecimento da extensa e moderna rede de difusão da informação, do lazer e do conhecimento que já está montada no Brasil.
Sabemos que nossa capacidade técnica e artística e o nosso saber fazer não estão ainda respaldados por estruturas empresariais sólidas, capitalizadas e capazes de manter um fluxo de produção contínuo.
O objetivo principal é, portanto, dotar o Brasil de estruturas empresariais privadas e públicas, capazes de atender à grande demanda de conteúdos genuinamente brasileiros, destinados não só a abastecer o mercado interno nacional como também exportar parte dessa produção de conteúdos.
O Brasil consome, só na área do entretenimento, mais de 800 milhões de horas de produtos que preenchem as grades de programação das redes de comunicação de massa hoje instaladas, cobrindo quase 100% do território nacional.
São oito redes de TV operando em escala nacional, mais de 400 programadoras de TV por assinatura, cerca de 30 milhões de antenas parabólicas, quase 220 milhões de telefones celulares e mais de 20 milhões de computadores nas mãos de vorazes navegadores da internet. E ainda vem por aí uma parruda banda larga já instalada em mais de 60% dos municípios brasileiros equipados com fibra ótica.
Em recente relatório divulgado pela conceituada Price Waterhouse, o Brasil e a China são os líderes mundiais do crescimento da indústria do entretenimento, cuja cifra de negócios atingiu US$ 1,7 trilhão entre 2001 e 2010. Dentre todas as atividades econômicas mundiais, foi o setor que mais cresceu, numa média de 8,5% ao ano. No Brasil e na China, o avanço foi de 8,7% e 12% ao ano, respectivamente.
Em outro relatório, prevendo o que acontecerá de 2010 a 2014, a Price Waterhouse afirma que ambos os países continuarão liderando esse crescimento da indústria do entretenimento. Com relação ao Brasil, o relatório revela que a cifra de negócios da indústria do entretenimento atingiu US$ 23 bilhões em 2010 e, até 2014, chegará perto de US$ 60 bilhões anuais.
Estamos vivendo com intensidade o nosso grande momento de país em desenvolvimento e o "boom" da convergência tecnológica e nem sequer produzimos 5% dos conteúdos veiculados nas grades de programação.
Assim como o petróleo tem sido até aqui o combustível gerador da energia do mundo contemporâneo, os conteúdos criativos já são, e cada vez mais serão, a energia, a força mobilizadora do século 21.
O poder e a força de influência dos países no concerto universal das nações serão medidos por sua riqueza cultural e capacidade de produzir e difundir sua criatividade. A cultura, geradora de saber, informação, conhecimento e entretenimento, será o diferencial que os povos poderão apresentar. A almejada sustentabilidade é resultado do processo cultural.
As culturas nacionais são ativos ainda não contabilizados. A riqueza cultural que decorre dos hábitos e costumes de cada povo são reservas naturais como as florestas e precisam ser transformados em bens de consumo. O cinema, a música, a literatura, as artes plásticas etc. são produtos artísticos e devem ser usufruídos democraticamente.
Bens culturais, assim como a água, as fontes de energia limpa e alimentos, são as grandes commodities do século 21. Mas aqui no Brasil a produção cultural ainda é tratada como algo supérfluo, ou, quando muito, um ornamento que ameniza as agruras do cotidiano.
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