quarta-feira, 20 de março de 2013

Meu nome é TRABALHO (Marco Nanini )-Sérgio Rodrigo Reis‏

Marco Nanini se divide entre o palco, a TV e o projeto social que desenvolve em área carente do Rio de Janeiro. Workaholic, ele se desdobra para revigorar Lineu, seu famoso personagem 


Sérgio Rodrigo Reis

Estado de Minas: 20/03/2013 

Os 64 anos, Marco Nanini quer sossego. “Hoje, procuro um pouco mais de descanso para a contemplação, para aterrissar numa boa e curtir a vida. Mas tenho projetos para o teatro e para a Gamboa”, diz ele, referindo-se ao espaço cultural que coordena, instalado em área carente do Centro do Rio de Janeiro. A nova fase é bem diferente da correria do passado. “Quando era jovem, fazia televisão durante o dia, peça de teatro à noite, show de boate e ainda filmava. Ou seja, não dormia”, relembra.

A questão é que nem sempre Nanini – um dos melhores atores do Brasil – pode controlar a repercussão de seu próprio trabalho. Bom exemplo disso está no monólogo A arte e a maneira de abordar seu chefe para pedir um aumento, que ficará em cartaz no fim de semana em BH.


Há 10 anos, quando o diretor Guel Arraes o apresentou ao texto do escritor francês Georges Perec, a intenção era encenar algo que desafiasse ambos. “Não há uma trama específica. O que o escritor fez foi pensar em desafios para a literatura, como não usar a letra A no texto. Sua grande obra é Vida modo de usar, romance que pode ser lido em qualquer ordem”, explica Nanini. O monólogo segue regras semelhantes. Ele foi estruturado como um livro de autoajuda; porém, à medida que se ensina algo, tudo vai dando errado. “Queríamos aproveitar esse texto para fazer um exercício de interpretação e direção”, explica o ator. Resultado: o que surgiu como uma experiência breve acabou dando origem a temporadas mais longas, com turnês fora do Rio de Janeiro. Mais uma vez, Nanini teve que ceder. Em vez de sossegar, pegou no batente.


Esse é também o caso de A grande família, um dos maiores sucessos da Rede Globo. Em cartaz desde 29 de março de 2001, a segunda versão da série (exibida inicialmente na década de 1970) modernizou protagonistas e ganhou outros personagens. Inicialmente, Nanini foi convidado para interpretar o patriarca Lineu em 12 episódios. Nada além disso. Mas o sucesso foi tanto que a atração se tornou a mais longeva da emissora: 440 episódios – até hoje.


Se depender dos fãs, Lineu e sua divertida família não deixarão a telinha tão cedo. “O mais difícil é lidar com a rotina. Às vezes, isso chega a ser maçante. Não estou entediado com o Lineu, até gosto dele. O que tento fazer é criar mecanismos para driblar a rotina, 12 anos depois do primeiro episódio”, diz o ator.


A nova temporada de A grande família começa a ser exibida em abril. E chegará com novo clima, revela Nanini. “Tivemos várias conversas. A proposta é promover modificações a partir da reflexão de que o tempo é também personagem importante. Não dá para fingir que tenho a mesma idade de quando começamos. Estou mais para o avô daquela família. Isso vai acabar gerando disputa entre o Lineu e o Agostinho, que cada vez mais assumirá o papel do pai. O tempo passou para todos e isso ficará evidente”, antecipa “Lineu”. Entretanto, as novidades não modificarão a essência do programa. “O ovo de colombo é o núcleo familiar”, compara.

Vacinado
O sucesso não tira o foco de Marco Nanini. “Tive certa vacina contra essas coisas do destino, não me deslumbro. Meu pai era hoteleiro, sempre morei em hotéis. Pude ver de perto as pessoas entrando e saindo, aquele clima de frivolidade. Desde ali me distanciei desse mundo”, confessa. Contar histórias é o que lhe interessa. “A minha preocupação é a dramaturgia. Não gosto de me exibir”, resume.


Obrigado a driblar a dificuldade de conviver com o que chama de “as coisas da realidade”, o ator confessa: “Não tenho traquejo de lidar com banco, fazer compras. Ainda bem que dei a sorte de encontrar alguém para me ajudar nessa parte, o que me permitiu ter presença mais ativa nas outras coisas”.


Nanini e o produtor Fernando Liboneti mantêm o Gamboa, um projeto ambicioso. Tudo começou de maneira despretensiosa. “Queria um lugar para ensaiar. Toda vez que conseguia o espaço, ele virava outra coisa e eu era expulso. Então, resolvi procurar algo que ninguém quisesse. Foi assim que achei um galpão na Providência”, conta o ator, referindo-se ao bairro na zona portuária do Rio de Janeiro. Nanini viu ali a oportunidade de levar adiante um projeto social. “Sempre dei minha contribuição ao trabalho social dos outros. Resolvi fazer algo meu”, resume.


Aberto há cinco anos, o Galpão Gamboa promove ações nas áreas de cultura, esporte e saúde em região carente da capital fluminense. Deu tão certo que, recentemente, a Garagem Gamboa passou a funcionar ao lado. “Aos pouquinhos, descobrimos a personalidade daquele nosso lugar: tem dança, coral, teatro, esportes. Quero me dedicar mais a essas coisas”, avisa Nanini.


Ele não para

Nascido no Recife em 1948, Marco Antônio Barroso Nanini é um dos melhores atores de sua geração. Em 1968, deixou a Escola de Teatro do Conservatório Nacional para atuar em Salomé, de Oscar Wilde, com direção de Martim Gonçalves. Contratado por Dercy Gonçalves, atuou em diversos espetáculos em dupla com ela. Na década de 1970, Nanini fez peças de Mário Prata, Fauzi Arap, Joracy Camargo, Aderbal Freire-Filho e Flávio Rangel, entre outros. Em 1981, dividiu o palco com Marília Pêra em um grande sucesso: Doce deleite, trabalho que lhe rendeu o Prêmio Mambembe. Em 1985, outro sucesso: O mistério de Irma Vap, ao lado de Ney Latorraca, sob a direção de Marília. A TV e o cinema também marcaram a carreira de Nanini. O ator interpretou o grotesco dom João VI no emblemático filme Carlota Joaquina, de Carla Camurati; trabalhou com o cineasta mineiro Helvécio Ratton em Amor & Cia; e há 12 anos frequenta os lares brasileiros como Lineu, o pacato patriarca do seriado A grande família.

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