Com 30 anos de estrada, Titãs se unem à nova geração do humor em filme e preparam disco
DE SÃO PAULO
"Já deu para ver que vamos ser gongados", brinca o cantor e compositor Paulo Miklos. Ao redor dele, em uma pequena sala de reunião, estão seus companheiros de Titãs, Branco Mello, Sérgio Britto e Tony Bellotto, enquanto o baterista Mário Fabre segue, ali ao lado, na ilha de edição do Mega Estúdio, na rua Bahia, em Higienópolis.
Banda Titãs chega aos 30 anos cheia de projetos
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Os integrantes do Titãs reunidos em estúdio de gravação em São Paulo
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O comentário de Miklos se justifica. Afinal, o quinteto está reunido para nova gravação do clipe de seu clássico "Cabeça Dinossauro", música inserida na trilha sonora da comédia "Vai Que Dá Certo", que estreou nessa sexta nos cinemas.
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"Dinossauros" do rock brasileiro, com 30 anos de carreira, os Titãs sabem que, pelo elenco escalado para o filme, a banda fatalmente será alvo de piadas. No time escolhido pelo diretor Mauricio Farias estão expoentes do "novo humor brasileiro" -nem tão novo assim-, como Fábio Porchat, Gregorio Duvivier, Bruno Mazzeo, Lúcio Mauro Filho, Danton Mello e Natália Lage.
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No longa, em que um grupo de cinco jovens decide assaltar uma transportadora de valores, a banda escapou de ser "gongada", como previa Miklos, já que apenas o áudio de "Cabeça Dinossauro" foi aproveitado em uma cena em que Danton e Duvivier cantam a música em um karaokê de quinta categoria.
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Já o clipe de "Cabeça de Dinossauro" virou peça de promoção do longa, com o grupo interagindo com os atores do filme.
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"Gosto de todos os comediantes das novas e das velhas gerações. O humor é uma especialidade brasileira. Só tem craque", diz Branco Mello a Lucas Nobile após ser perguntado sobre as diferenças entre humoristas mais antigos (como Chico Anysio, Mazaroppi, Os Trapalhões) e os mais novos, criticados muitas vezes por fazerem algo mais apelativo.
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Os integrantes do Titãs se reuniram para a gravação do clipe em fevereiro. Depois, no Rio, foi gravada a outra parte da cena, apenas com Porchat e Duvivier. Dentro do "aquário" de um estúdio, a dupla de humoristas brinca com os músicos.
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Depois da sugestão de Porchat para montar uma banda, Duvivier pede a ele que cante "Cabeça de (sic) Dinossauro", ao que ele responde: "Não vou cantar, porque minha linha é diferente da dos caras, é mais 'melody', outra pegada".
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Na sequência, Duvivier duvida que Porchat recusaria o convite se fosse chamado para entrar para os Titãs.
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"Claro que eu ia, mas ia tentar implementar uma coisa mais Titãs universitário", brinca Porchat, fazendo uma interpretação escrachada e melosa para "Polícia", outro sucesso dos anos 1980 dos roqueiros paulistanos.
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O convite para que a banda gravasse "Cabeça Dinossauro" para o filme de Farias não poderia ser mais natural. Branco Mello assina a trilha do longa ao lado de Emerson Villani, produtor que pilota a gravação da faixa. A dupla já havia trabalhado para a série de TV "Aline" (2008 a 2011), para o filme "Verônica" (2008), também de Farias, e para "Jacinta", peça de Andrea Beltrão.
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"A trilha do filme traz um monte de misturas, guitarra com acordeom, por exemplo. Não é tão diferente compor para uma comédia, mas claro que tem uma ironias musicais que servem melhor para aquele tipo de filme. É diferente fazer baseado só no roteiro. Desta vez, a gente pôde ver o filme inteiro, aí fica mais fácil para amarrar todas as pontas da trilha", comenta Branco.
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No estúdio, a postura da banda é de extremo profissionalismo. Não é à toa que os Titãs lançaram 20 discos em 30 anos de carreira, com mais de 8 milhões de cópias vendidas. Comemorando os 26 anos de seu álbum mais clássico, "Cabeça Dinossauro", o grupo fez uma turnê em 2012 tocando o disco na íntegra. Como resultado, lançou CD e DVD do registro ao vivo de "Cabeça", que, somando os dois formatos, já vendeu mais de 25 mil cópias.
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Mesmo com a tensão do trabalho, a banda se permite, naturalmente, fazer algumas brincadeiras entre seus integrantes.
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A certa altura da gravação, Sérgio Britto diz: "Agora joga o 'pró-tools'", fazendo uma piada com o programa de computador que edita e corrige imperfeições sonoras.
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No mesmo clima, Paulo Miklos dá uma tirada no baterista Mário Fabre, que tem certa dificuldade em contar os compassos da introdução da música: "Porra, 30 anos estudando para isso?".
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Paralelamente ao registro sonoro da faixa para a trilha do filme, os Titãs começam a ensaiar a gravação de seu próximo disco de inéditas. Assim como os últimos trabalhos da banda, o álbum será produzido por eles mesmos, de maneira independente.
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"O DVD do 'Cabeça Dinossauro' já foi feito pela gente, pela Titãs, Diversão e Arte, nossa produtora. A gente é artista e empresário. Na nossa carreira nunca teve problema de relacionamento com gravadora, mas é uma situação que mostra para onde foi a indústria. As pessoas querem trabalhar independentes, depois licenciam seus produtos", comenta Branco.
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Os integrantes do grupo são unânimes em dizer que a reunião para tocar "Cabeça Dinossauro" foi primordial para ditar os rumos do próximo trabalho. "Vai ser uma mistura entre 'Cabeça' (1986) e 'Õ Blésq Blom' (1989), como se isso fosse possível, pra gente se orientar, ter uma baliza estética. Ter tocado as músicas do 'Cabeça' na íntegra obviamente ajuda a recuperar um tipo de estética que a gente trabalhou tanto e fez tão bem naquela época, e acho que vai ajudar a gente a construir essa coisa nova", afirma Britto.
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Além do disco dos Titãs, com previsão para ser lançado no segundo semestre deste ano, os integrantes seguem trabalhando em vários projetos paralelos. Miklos gravou recentemente no álbum da banda Garotas Suecas a inédita "Charles Chacal", que entraria no primeiro disco dos Titãs, mas foi censurada pela ditadura. "Eu sou o DJ do camarim dos Titãs, sempre coloco pra gente ouvir coisas novas, que estão sendo faladas. Tem o Porcas Borboletas, de Uberlândia, o Vivendo do Ócio, da Bahia", conta Miklos.
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Sérgio Britto já tem um disco solo gravado, sem nome definido, com participações de Rita Lee e Alaíde Costa, e que deve ser lançado antes do álbum de inéditas do Titãs. Bellotto acaba de publicar seu novo romance, "Machu Pichu" (Companhia das Letras), e aguarda para ver os desenhos que o catarinense Pedro Franz fez para ilustrar uma história em quadrinhos de "Bellini".
Mônica Bergamo, jornalista, assina coluna diária publicada na página 2 da versão impressa de "Ilustrada". Traz informações sobre diversas áreas, entre elas, política, moda e coluna social. Está na Folha desde abril de 1999.
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