domingo, 24 de março de 2013

Tendências/Debates

folha de são paulo

SANDRO JOSÉ DE SOUZA
O meu genoma
Disponibilizei o meu genoma para fomentar um debate inacabado no Brasil. Precisamos de leis sobre a discriminação genética
Recentemente, tornei acessível a quem interessar a sequência do meu próprio genoma. Ela está disponível no banco público mantido pelo Instituto Nacional de Saúde dos EUA (www.ncbi.nlm.nih.gov/sra/SRX208349), bem como nas páginas do Instituto do Cérebro da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e do Instituto de Bioinformática e Biotecnologia.
Quando disse isso a um amigo, ele imediatamente retrucou: "Você não tem medo de que essa informação seja usada contra você?".
Ele se referia à possibilidade de que a informação contida no meu genoma seja usada, por exemplo, por seguradoras de saúde ou empregadores e que eu sofra algum tipo de discriminação por algo que me foi passado pelos meus pais (não que eles tenham qualquer culpa).
O progresso atingido nos últimos anos nas tecnologias de sequenciamento do DNA é algo realmente espantoso. Há cerca de 12 anos, o Projeto Genoma Humano, financiado principalmente pelo governo americano, custou US$ 3 bilhões. Hoje, sequencia-se um genoma por algo em torno de US$ 2.000. Estima-se que, ao final de 2013, teremos dezenas de milhares de genomas humanos sequenciados.
Todos os leitores deste artigo que estiverem vivos daqui a dez anos terão o seu genoma sequenciado e essa informação será usada rotineiramente nas suas consultas médicas. Isso é um processo irreversível, que já traz uma série de benefícios à humanidade, principalmente na área da saúde, mas também em outras como as da agricultura e da pecuária.
A minha resposta à pergunta amiga foi um sonoro não. Apesar de concordar que, em teoria, há o risco de discriminação genética, os benefícios ultrapassam-no. O conhecimento das predisposições genéticas leva, por exemplo, a mudanças de hábito. Um indivíduo que venha a ter uma predisposição genética a problemas cardíacos, por exemplo, pode minimizar esse risco por meio de uma dieta equilibrada e atividade física regular.
No entanto, o principal motivo da minha atitude em disponibilizar o meu genoma foi exatamente fomentar um debate que é fundamental ao Brasil nos dias atuais. Precisamos de uma legislação que proteja o cidadão de qualquer tipo de discriminação genética.
Em 2008, tornou-se efetiva nos Estados Unidos a "Genetic Information Nondiscrimination Act" (lei contra a discriminação genética), segundo a qual fica proibido qualquer tipo de discriminação contra um indivíduo devido às informações presente no seu genoma.
No Brasil, o assunto ainda não está regulamentado. Tramita no Congresso Nacional desde 1998 o projeto de lei 4.610/98 que define os crimes de discriminação genética. Vários outros projetos de lei foram propostos nos últimos 15 anos, todos apensados ao PL 4.610/98.
Assim como qualquer tipo de discriminação, a genética corrompe a integridade do indivíduo. Nas atuais circunstâncias, em que a utilização da informação genética afeta de forma positiva a vida dos brasileiros, torna-se crítica uma aceleração no trâmite dos projetos de lei relacionados a esse tema. Convido os nossos legisladores a agirem de forma urgente.



ANA PAULA ZACARIAS
Uma oportunidade para Mercosul e Europa
Enquanto a União Europeia negocia com parceiros do mundo todo, parece-nos natural que o mesmo aconteça com o MERCOSUL
No dia 1º de março, as barreiras comerciais entre a União Europeia (UE) e o Peru foram superadas como resultado do acordo comercial com aquele país e a Colômbia. Concluído em 2012, o acordo trará um benefício anual imediato de mais de € 500 milhões para as empresas de ambos os lados, bem como condições mais estáveis para o comércio e o investimento.
Os entraves com a Colômbia serão suspensos ainda neste ano, assim que estiverem concluídos os procedimentos de ratificação.
Esse é apenas mais um passo na estratégia econômica e comercial da UE. A Europa está empenhada na promoção do comércio leal e liberalizado com todos os seus parceiros comerciais. Em tempos de crise econômica, o comércio pode ajudar a impulsionar o crescimento e o emprego e aumentar a competitividade, sem causar pressão nos orçamentos públicos.
Além das negociações multilaterais, no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC), a UE tem se envolvido numa ampla gama de negociações com países e regiões do mundo inteiro. Já estão em vigor os acordos com o Chile, o México e a Coreia do Sul e em breve se tornarão efetivos os já assinados com Cingapura e com a América Central.
Além disso, a UE tem negociações em curso com praticamente todas as regiões do mundo e com países de todas as dimensões e níveis econômicos: Malásia, Índia, Armênia e os países da África, do Caribe e do Pacífico (ACP), entre outros.
No entanto, a nossa ambição recentemente foi mais longe. Em fevereiro, a UE e os Estados Unidos decidiram negociar uma Parceria Transatlântica sobre Comércio e Investimento, que apoie a criação de empregos, crescimento econômico e competitividade dos dois lados. Calcula-se que o acordo determinaria um aumento do PIB de 0,5% na UE e de 0,4% nos EUA.
Um anúncio similar foi feito em novembro de 2012 com o Japão, para um acordo que poderá levar a um aumento dos fluxos comerciais entre 25% e 28% nas duas direções.
Num contexto como o que acabamos de descrever, não podemos deixar de expressar a nossa esperança de que um acordo ambicioso e abrangente possa ser alcançado entre a UE e o Mercosul. Enquanto a UE negocia com parceiros de todo o mundo, parece-nos natural que o mesmo aconteça entre dois blocos regionais econômica e culturalmente tão próximos.
O Brasil é o principal exportador agrícola para a UE. A UE é o primeiro parceiro comercial do Mercosul e o maior investidor estrangeiro na região, com um volume de investimentos superior à soma total de investimentos da UE na Índia e na China.
Em janeiro deste ano, a última cimeira UE-Brasil, que teve lugar em Brasília, e reuniões UE-Mercosul realizadas à margem da cimeira UE-Celac (Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos) de Santiago do Chile deram um novo impulso às negociações, com o compromisso de trocar as ofertas concretas de abertura de mercado antes do fim do ano.
Essa é uma oportunidade que não se pode perder. Nós, Europa e Mercosul, precisamos seguir em frente juntos como aliados no comércio mundial. Devemos resolver os problemas de acesso ao mercado que ainda marcam as nossas relações bilaterais e que têm impacto significativo sobre as trocas comerciais.
É também uma oportunidade única para o Mercosul e para o Brasil fazerem parte do processo de integração econômica que está acontecendo no mundo. Se isso acontecer, as empresas brasileiras e do Mercosul poderão se beneficiar dos tratamentos preferenciais concedidos aos seus competidores.
Por isso, convidamos todas as partes envolvidas nas negociações a manter o compromisso acertado em Santiago em janeiro passado. Estamos certos de que a conclusão do acordo de associação UE-Mercosul trará importantes benefícios para as economias, as empresas e os consumidores em ambos os lados do Atlântico.

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