Religiosos temem que permanência de pastor se inviabilize, enquanto minorias querem conter avanço dos conservadores
Felipe Canêdo
Estado de Minas: 14/04/2013
O acirramento dos ânimos na polêmica
envolvendo o pastor Marco Feliciano (PSC-SP) – presidente da Comissão de
Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara – deixa alarmados tanto
religiosos como militantes dos direitos das minorias, que se preocupam
com a radicalização de posições. “Corremos um risco de vermos uma
ascensão de setores muito conservadores, que vai contra a tendência
mundial. O Uruguai aprovou o casamento gay essa semana. O Senado da
França também. Eu tenho fé nos movimentos sociais, não vamos deixar isso
acontecer”, afirma o presidente da Associação Brasileira de Lesbicas,
Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (ABGLT), Carlos Magno.
Enquanto isso, partidários de Feliciano tentam aproveitar sua exposição
midiática com o esforço de evitar que a situação dele se torne
insustentável.
Na quinta-feira, o deputado entrou em contato com a
ABGLT, mas a entidade decidiu não responder. “Não há possibilidade de
conversar com ele, que é nosso inimigo. Não há acordo possível entre
nós”, reforçou Magno. Eliana dos Santos, de 51 anos, frequentadora da
Igreja do Morro da Glória, do interior de Minas, defende Marco Feliciano
e diz que consideraria até votar nele se o pastor fosse candidato a
presidente da República, mas faz uma ressalva: só se ele propusesse
medidas que beneficiariam toda a população e não só os evangélicos.
Bebela
Ramos de Siqueira, do Movimento Popular da Mulher, sustenta que
Feliciano está crescendo politicamente, mas com restrições. “Ele tem
posições profundamente preconceituosas. É sempre positivo quando você
levanta uma crítica a um pensamento que é conservador, atrasado. Então,
acho que ele está nos ajudando também”, argumenta. Para Eliana dos
Santos, o pastor está sendo incompreendido. Ela alega que as críticas se
referem, principalmente, à declarações dadas por ele antes de presidir a
CDHM. “Isso não é justo”, protesta.
Homossexualismo
O
pastor Toniel Pires também sustenta que os evangélicos não são hostis
aos homossexuais , masl admite que para ser tornar membro, a pessoa
deverá mudar. “Se ele passar a frequentar os cultos e para se tornar um
membro da comunidade, ele terá que seguir os ensinamentos das escrituras
e da igreja e abrir mão das suas práticas homossexuais”, avisa.
Frequentadora da Igreja Deus é Amor, Gisele Martins, de 20 anos, conta
que já viu travestis frequentando vigílias, mas revela que a igreja dela
repete a exigência feita na do pastor Toniel. “A bíblia condena
relações entre pessoas do mesmo sexo, mas nós aceitamos os homossexuais.
Se um homem quer viver com outro, tudo bem. Mas a palavra de Deus diz
que isso é errado. Se ele quiser se converter terá que deixar de ter
relações homossexuais.”
Na segunda-feira, a Procuradoria Geral da
República enviou ofício ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo que a
corte aceite a denúncia apresentada pelo procurador-geral, Roberto
Gurgel, em janeiro contra Merco Feliciano. Ele considerou homofóbica a
frase postada na internet pelo pastor: “A podridão dos sentimentos dos
homoafetivos levam ao ódio, ao crime, à rejeição”.
Câmara é front na batalha da intolerância
Grupos se enfrentam todas as quartas-feiras nas sessões da Comissão de Direitos Humanos
Adriana Caitano
Brasília – Desde o
início de março, quando Marco Feliciano (PSC-SP) foi escolhido por seu
partido para comandar a Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM)
da Câmara dos Deputados, as quartas-feiras têm sido dias de tensão,
correria e muito barulho na Casa. Quando o colegiado vai se reunir, os
corredores do Parlamento transformam-se em território de embates entre
manifestantes que participam de protestos contra e a favor do pastor. De
um lado estão estudantes, homossexuais, negros e até funcionários
públicos que querem a derrubada de Feliciano. De outro, evangélicos que
se organizam em caravanas para defendê-lo com a Bíblia nas mãos.
Quando
a crise se instalou, somente alguns ativistas dos direitos humanos
apareciam com cartazes e faixas pedindo a saída do presidente da CDHM.
Aos poucos, os protestos começaram a ganhar corpo, com a indispensável
ajuda das redes sociais. Representantes de grupos já organizados de
religiões afrobrasileiras e movimentos LGBTT (gays, bissexuais,
travestis, transexuais e transgêneros) reuniam-se na Câmara com
estudantes da Universidade de Brasília (UnB) que estavam de férias. O
encontro contínuo gerou a necessidade de criar grupos específicos para
debater o tema. Surgiram, assim, os movimentos Não me Representa e Vou
Tirar Você Desse Lugar, que se reúnem toda semana para organizar novas
manifestações. Alguns, porém, não se encaixam em nenhum desses rótulos.
“Defendo todas as minorias e não quero ver nesse posto alguém que diz
tantas barbaridades”, comenta a psicóloga Melissa Viana, 32 anos, que é
branca, heterossexual e não integra um movimento específico.
Até crianças
Nas
últimas semanas, o plenário de reuniões da CDHM começou a ser tomado
também por evangélicos que querem manter Feliciano no comando.
Geralmente liderados por um pastor da Assembleia de Deus, eles chegam
mais cedo, discretos e, de certa forma, ariscos, e ocupam os primeiros
lugares da sala antes que a sessão seja fechada. Não gostam de dar
entrevistas ou divulgar o próprio nome. À medida que também se viram
barrados nas sessões, foram obrigados a dividir o corredor com os demais
ativistas. Aumentaram em número e levaram até crianças para os
protestos. Reagiram às provocações também aos gritos, com frases quase
sempre destacando a palavra “família”. Um deles chegou a ser detido ao
chutar o grupo adversário.
Gritos de ordem com o já famoso
“Feliciano não me representa” se misturam a hinos da Igreja Evangélica.
Roupas coloridas, piercings, cabelos de cortes modernos e bandeiras
contra ternos e saias de tons sóbrios, discrição, cabelos longos e
exibição de Bíblias. Todos garantem que participam dos protestos
espontaneamente, sem serem pagos para isso, e que conseguiram folgas ou
férias regulares para marcar presença na Câmara semanalmente em pleno
horário de expediente.
Tiroteios
28 de fevereiro
O
PSC anuncia a indicação do deputado e pastor Marco Feliciano (SP) para a
Presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias (CDHM). Em 2011,
ele escreveu no twitter que o amor entre pessoas do mesmo sexo levava
“ao ódio, ao crime e à rejeição” e que os descendentes de africanos são
“amaldiçoados”.
7 de março
Feliciano é eleito para a Presidência da CDHM
9 de março
Militantes
em Brasília, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, Salvador, Fortaleza, Porto
Alegre, Curitiba e Florianópolis fazem manifestações para mostrar
descontentamento com a eleição de Feliciano.
13 de março
Feliciano
preside sua primeira sessão na Comissão de Direitos Humanos, em meio a
muitos protestos no Congresso. Centenas de militantes foram ao plenário
da comissão. Parlamentares contrários a Feliciano abandonaram a reunião e
alguns quase saíram no tapa.
20 de março
Em sua segunda
sessão na Comissão de Direitos Humanos, Feliciano abandona a reunião
depois de apenas oito minutos. Mais uma vez, militantes gritam palavras
de ordem contra o pastor e pedem a sua renúncia.
27 de março
Feliciano manda prender manifestante que, durante audiência pública, o teria chamado de racista.
29 de março
Durante
culto em Passos (MG), Feliciano diz que a Comissão de Direitos Humanos,
antes de ser presidida por ele, era “dominada por Satanás”.
1º abril
A vice-presidente da CDH, Antônia Lúcia (PSC-AC), se ofende com a declaração, ameaça deixar o cargo, mas depois desiste.
2 de abril
A deputada Iriny Lopes (PT-ES) apresenta à Mesa Diretora da Câmara pedido de abertura de processo disciplinar contra Feliciano.
3 de abril
Feliciano decide fechar as reuniões da Comissão de Direitos Humanos.
5 de abril
Feliciano presta depoimento ao STF, em relação à ação penal a que responde por estelionato.
11 de abril
O
procurador-geral da República, Roberto Gurgel, apresenta nova
representação contra Feliciano no STF, pela contratação de assessores
que não trabalhariam no gabinete dele, mas em igreja evangélica.
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