Ruins de cálculo
À primeira vista, há muito a comemorar na notícia de que em 2011 houve mais que o dobro de calouros em cursos de engenharia do que cinco anos antes. O aumento acelerado mostra que os jovens brasileiros estão atentos e reagem racionalmente à carência de profissionais nessa área essencial para o desenvolvimento do país.Em 2006, mostram dados do Censo da Educação Superior do Ministério da Educação (MEC), os cursos de engenharia receberam 95 mil novos estudantes, em números redondos. Eram 5% do total de calouros. Em 2011, esse contingente havia saltado para 277 mil --um décimo dos ingressantes.
Pela primeira vez, o número de candidatos a engenheiros ultrapassou o de aspirantes na carreira de direito (199 mil). O preferido é o curso de administração, que --como o de direito-- só precisa de salas e professores para funcionar e confere formação generalista supostamente útil em qualquer setor.
O caso da engenharia é, obviamente, muito diverso. Não só exige laboratórios e bancadas como forma especialistas: engenheiros civis (24% dos calouros), de produção (19%), mecânicos (12%), elétricos (11%) e assim por diante. É desse pessoal com formação técnica apurada que o país carece.
O otimismo com o avanço na procura pela engenharia arrefece quando se leva em conta que poucos desses jovens de fato acabam por formar-se. A cada ano, apenas cerca de 45 mil obtêm seu diploma.
Como a demanda do mercado de trabalho ronda a casa de 70 mil novos engenheiros por ano, o deficit é de pelo menos 20 mil. Estima-se que a China forme anualmente 600 mil engenheiros --13 vezes a cifra do Brasil, para uma população seis vezes maior.
A grande muralha, por aqui, é a dificuldade dos alunos para acompanhar o curso. Cálculo, estatística e física vão abatendo os aspirantes ao longo dos cinco anos da graduação. A maioria deles chega à faculdade com deficiências graves nessas disciplinas, que deveriam ter aprendido no ensino médio.
O incremento rápido de ingressantes nas engenharias significa uma proporção ainda maior de jovens com má formação básica. Não é preciso ser pessimista para predizer que a deprimente proporção de formandos pode cair ainda mais.
A procura por cursos superiores para formar professores de matemática, física e química, aliás, caiu ligeiramente --de 3% para 2,8%. Aí também a carência é aguda.
Sem docentes para preparar alunos capazes de encarar as exigências acadêmicas do terceiro grau, como esperar que o país forme todos os engenheiros de que necessita? A conta não fecha.
EDITORIAIS
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Venezuela dividida
Vantagem pequena na eleição de Maduro mostra crise do modelo chavista e torna ainda mais complicada a missão do novo presidente
A vitória apertada de Nicolás Maduro provoca forte abalo nas pretensões do chavismo. O candidato oposicionista Henrique Capriles obteve 49% dos votos, contra os 50,75% de Maduro, que disputou como presidente interino do país.
A margem, estreita em qualquer contexto, torna-se ainda menor diante das circunstâncias que cercaram as eleições venezuelanas. Maduro concorreu como herdeiro político de Hugo Chávez, cujo funeral atraiu multidões há pouco mais de um mês. Teve, além disso, a máquina estatal ao seu lado e o apoio de 20 dos 23 governadores.
É evidente o desencanto com Maduro, que chegou a ter 20 pontos de vantagem em pesquisas do início de abril. Seu declínio, porém, é mais bem compreendido em perspectiva: há seis meses, o próprio Chávez foi eleito com 54,4% dos votos, resultado modesto se comparado aos 63% de 2006.
Torna-se cada vez mais difícil sustentar a retórica maniqueísta que o chavismo utilizou nos últimos 14 anos, dividindo o país entre uma maioria "bolivariana" e uma minoria de "burguesitos" --apelido dado aos opositores do governo. Até Fidel Castro disse a Chávez, anos atrás, que não há milhões de oligarcas na Venezuela.
Se quiser chegar ao final dos seis anos de mandato, Maduro, mais conciliador que Chávez, precisará abandonar a estratégia do confronto. Não é mais possível deslegitimar uma oposição que, com menos recursos e acesso limitado à TV, conquistou metade da nação.
Maduro tampouco poderá seguir com ações paliativas contra o atual descalabro econômico, que tem resultado em inflação fora de controle, desabastecimento e um deficit público de 15% do PIB. Medidas necessárias, mas impopulares, como a maxidesvalorização da moeda local e o aumento do preço da gasolina, terão de ser cogitadas.
Não será tarefa fácil. À insegurança econômica soma-se a fragilidade política --a liderança de Maduro é questionada, com força crescente, dentro dos próprios círculos chavistas, e o resultado de domingo parece não ter sido suficiente para legitimá-lo no comando da nação.
A insistência de Capriles em contestar o saldo das urnas é apenas sintoma desse quadro instável. Ainda que o sistema de votação pareça confiável do ponto de vista técnico, não faltam, nessa democracia tutelada, pretextos para duvidar das instituições. Instalada a controvérsia, seria melhor proceder à recontagem oficial dos votos.
Estão previstas para este ano, provavelmente em julho, eleições locais na Venezuela. Já não será surpresa se a oposição vencê-las.
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