Contágio por NCoV, responsável por
infecção respiratória severa, foi registrado em hospital francês.
Especialistas dizem que riscos de o micro-organismo causar grave
epidemia são pequenos
Paloma Oliveto
Estado de Minas: 14/05/2013
Descoberto no ano
passado, um novo tipo de coronavírus — família de vírus de RNA que
provocam desde gripe comum a infecção respiratória severa – pode ser
transmissível entre humanos. Um alerta divulgado pela Organização
Mundial da Saúde (OMS) confirmou que, em um hospital da cidade francesa
de Valenciennes, um homem que dividia o quarto com o primeiro paciente
infectado do país contraiu o chamado NCoV. Ambos estão internados em uma
área de isolamento. Na Arábia Saudita, onde houve o maior número de
casos e de óbitos até agora, o ministro da Saúde, Abdullah Rabia,
informou, no domingo, que o coronavírus infectou 15 pessoas e matou nove
apenas neste mês. De acordo com a agência France-Presse, moradores do
Norte do país estão em pânico e, ao menor sinal de febre, correm para os
serviços de emergência.
O balanço oficial do Centro de Controle e
Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, que atua com a OMS no
controle estatístico e nas pesquisas sobre o vírus, apontava ontem, em
todo mundo, 34 casos confirmados e 20 mortes. Os dados, contudo, não
estão bem esclarecidos. O informe do CDC mostra números diferentes dos
divulgados no domingo pela Organização Mundial da Saúde, que citava 18
mortes. Ao mesmo tempo, o detalhamento dos surtos, iniciados em
fevereiro de 2012 na Jordânia e seguidos por ocorrências na Arábia
Saudita, no Catar, na Inglaterra, nos Emirados Árabes Unidos e, agora,
na França, indica 30 infecções que resultaram em 16 mortes.
Apesar
do descompasso estatístico, uma coisa é certa: o fato de o vírus passar
de pessoa a pessoa eleva os riscos de contaminação – assim como a
gripe, ele pode ser transmitido, por exemplo, por uma tosse ou um
espirro. Em fevereiro, três pessoas da mesma família foram infectadas na
Inglaterra, sendo que uma delas tinha viajado recentemente para o
Oriente Médio. Isso levantou a suspeita da transmissão entre humanos
que, com os casos franceses, foi confirmada. Se sair da Ásia e da Europa
e atingir o continente americano, o NCoV será considerado uma pandemia.
Sem alarme O infectologista Stefan Cunha
Ujvari, do Hospital Alemão Oswaldo Cruz, em São Paulo, esclarece, porém,
que ainda não há motivo para alarme, principalmente no Brasil, onde não
há sequer casos suspeitos. Autor do livro Pandemias – a humanidade em
risco (Editora Contexto), Ujvari explica que esse termo não se refere ao
número de infectados, mas à abrangência geográfica. “Não quer dizer que
vai haver uma alta letalidade. Temos de ficar em alerta porque o vírus
está circulando e não é de hoje. Ainda não se sabe muito sobre esse novo
coronavírus, mas ele não parece ter uma grande capacidade infectante”,
afirma.
O médico que identificou o NCoV, o virologista egípcio
Mohamed Zaki, disse em entrevista à agência Reuters que o vírus está
sofrendo mutações genéticas e, por isso, infectando humanos mais
facilmente. Mas também ressaltou que não acredita em uma epidemia grave,
pois o micro-organismo foi descoberto e sequenciado rapidamente, ainda
no ano passado. “Agora, temos ferramentas para diagnosticá-lo”, disse.
Segundo Stefan Cunha Ujvari, ao contrário da gripe, que começa a ser
transmitida antes que o indivíduo apresente os primeiros sintomas, os
coronavírus só passam para outras pessoas por volta da segunda semana, o
que dá tempo para diagnosticar e tratar os pacientes.
O
especialista lembra que a própria pandemia de Síndrome Respiratória
Aguda Grave (Sars, sigla em inglês), pneumonia asiática provocada por um
coronavírus semelhante ao NCoV e que emergiu em 2003, não atingiu
níveis alarmantes: acometeu 8 mil pessoas em 30 países. O problema foi a
gravidade dos sintomas, que mataram quase 10% dos pacientes
contaminados. De forma parecida, o NCoV se manifesta agressivamente,
causando febre alta, tosse e pneumonia severa.
“As questões da
exposição que resulta na infecção humana, o modo de transmissão, a fonte
do vírus e a extensão infecciosa na comunidade precisam ser respondidas
urgentemente”, disse a OMS, em um informe técnico divulgado no mês
passado. De acordo com a organização, até agora, as estatísticas sugerem
que a transmissão ocorre mais no ambiente hospitalar e que homens de
meia idade (média de 58 anos) estão mais suscetíveis. "Além dessas
questões epidemiológicas básicas, mais trabalho é necessário para
determinar as estratégias corretas de tratamento dos pacientes
infectados e para avaliar o potencial de intervenções farmacêuticas",
alertou o documento.
Vetor é mistério
Assim como na
Sars, há evidências de que morcegos sejam os hospedeiros do NCoV, mas
ainda não se sabe qual o vetor que atinge seres humanos diretamente. Os
mamíferos alados carregam o vírus que, para eles, é inofensivo e,
provavelmente, o transmitem para algum animal. Esse último passa o
agente patógeno para as pessoas de alguma forma, geralmente pelo contato
com as secreções corporais. Apesar de os cientistas já terem
sequenciado o genoma do NCoV, eles ainda não conseguiram identificar a
espécie que faz o papel de reservatório do vírus. Sem isso, pouca coisa
pode ser feita em termos de prevenção.
O infectologista Stefan
Cunha Ujvari esclarece que cada nação adota as medidas de vigilância
sanitária que achar mais adequadas, de acordo com os alertas da OMS. Com
a descrição dos casos, os governos podem recomendar, por exemplo, que
não se viaje para a Península Arábica, coisa que nenhum país achou
necessário fazer até agora. No Brasil, o Ministério da Saúde ainda não
se manifestou sobre o NCoV. Procurada pelo Estado de Minas, a assessoria
do órgão não retornou até o fechamento desta edição. Ujvari acredita
que, por enquanto, nenhuma estratégia precisa ser considerada no Brasil
devido ao número restrito de casos mundiais.
Em uma entrevista
coletiva realizada em Riad, na Arábia Saudita, porém, o diretor-geral
adjunto da OMS para a Segurança Sanitária e o Meio Ambiente, Keiji
Fukuda, alertou que o novo coronavírus “é um grande desafio para todos
os países”. A organização divulgou uma nota de imprensa na qual afirma
que “a principal preocupação global é sobre o potencial de disseminação
do novo vírus”.
Na Arábia Saudita, principalmente na região de
Al-Ahsa, onde a maioria dos casos ocorreu, a preocupação da população é
grande. Na mesma entrevista da qual participou Fukuda, o ministro
saudita da Saúde, Abdullah Rabia, disse que outros três casos estão
sendo investigados. Todos os pacientes que procuraram os hospitais
locais foram colocados em isolamento. “Senti os sintomas de uma gripe,
acompanhados de febre”, afirmou à France-Presse um jovem que pediu para
não ser identificado. “Fui ao hospital, mas esses sintomas desapareceram
um dia depois, e apesar disso, sigo em quarentena com outros doentes, o
que me dá medo”, revelou.
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