RIO DE JANEIRO - Imagine sentar-se a uma mesa para um uísque tendo atrás de si uma parede com poemas de Vinicius de Moraes, Paulo Mendes Campos e Antonio Maria, rabiscados pelos próprios; barquinhos pintados por Pancetti com o batom vermelho de Dolores Duran; uma pauta com a melodia de "Aquarela do Brasil", por Ary Barroso; o autógrafo de Pablo Neruda; desenhos de Di Cavalcanti, Antonio Bandeira e Carlos Thiré, e frases de Sergio Porto, Lucio Rangel, Fernando Lobo, Haroldo Barbosa, Aracy de Almeida, Dorival Caymmi, garatujados por eles a caneta, giz ou lápis, inclusive de sobrancelha. E tendo à sua volta os citados.
Nos anos 50, esses artistas, escritores e jornalistas se reuniam nos fundos do Villarino, uma uisqueria na avenida Calógeras, no Centro do Rio, em frente à Academia Brasileira de Letras. Como trabalhavam por ali, o Villarino era para onde eles convergiam no fim da tarde, à espera de que o trânsito para a Zona Sul desafogasse. Foi lá, em maio de 1956, que Vinicius propôs ao jovem Tom Jobim trabalharem juntos, e Tom perguntou: "Tem um dinheirinho nisso?".
Anos depois, o esvaziamento do Centro atingiu o Villarino. Os habitués sumiram e, por ignorância ou má-fé, os proprietários cobriram de tinta azul o painel, destruindo-o. Mas o Villarino não morreu. Sobreviveu como importadora e, desde os anos 80, em melhores mãos, voltou a atrair profissionais da música e da palavra. Tem agora, dez andares acima, outra vizinha ilustre: a editora Casa da Palavra, um xodó carioca.
Um dia caiu-me às mãos uma foto do Villarino, em que aparecem alguns dos grandes frequentadores e o famoso painel. Rita e Antonio, os novos proprietários, mandaram ampliá-la e cobriram uma parede com ela. Nem tudo se perdeu.
O Villarino faz hoje 60 anos. E, sim, tinha um dinheirinho na proposta de Vinicius para Tom.
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