segunda-feira, 1 de julho de 2013

Copa aquece a alma e esvazia o cofre

Valor Econômico - 01/07/2013

Por Angela Bittencourt


Construir um estádio de futebol custa caro em qualquer lugar do mundo. Mas o custo pode ser ainda mais alto por fragilidade técnica do projeto descoberta durante a obra ou por excesso de otimismo - inspirado pelo próprio projeto ou pela realização do evento. Afinal, Copa é Copa! O direito do Brasil de ser, pela segunda vez, sede da Copa provocou grande entusiasmo. Doze estádios foram programados para as partidas e construídos do zero ou reformados de cabo a rabo. O orçamento previsto para a arrumação foi cravado em US$ 3,25 bilhões em 2007 e parecia caber na conta brasileira sem crise financeira global batendo à porta, inflação se acomodando no centro da meta e Selic em queda. Em 2011, o orçamento já havia progredido para US$ 6,42 bilhões. No início de 2013, a US$ 6,99 bilhões. Seis anos depois da euforia, da posse de um novo governo, de um controle discutível da inflação pela presidente Dilma Rousseff e da clara percepção de queda do poder de compra da população, estaria a Copa ficando menor aos olhos do brasileiro? Os protestos nas ruas exibem indignação pela construção dos estádios e a baixa oferta de serviços de saúde e educação. As suspeitas acerca dos custos dos estádios, em supostas operações superfaturadas e atos de corrupção, têm fundamento?

O custo de um estádio é avaliado internacionalmente pela relação entre o custo total e sua capacidade (custo por assento). E esse critério, da base de dados da ONG Play the Game, uma entidade da Dinamarca, cujo objetivo é fortalecer a ética no esporte, mostra que o custo de um estádio da Copa no Brasil custa US$ 5.886 por assento; na Copa realizada na África do Sul, US$ 5.299; na Coreia/Japão, US$ 5.070; e na Alemanha, US$ 3.442. O custo do estádio no Brasil ficou bem distante basicamente do custo do estádio na Alemanha - 40% menor.

O Instituto Braudel de Economia trata do tema no estudo "Quanto custa um estádio de futebol? Ou: ainda temos tempo de economizar 42 maracanãs", preparado por dois Consultores-Legislativos do Senado Federal: o doutor em economia Marcos Mendes e o jornalista Alexandre Guimarães, que consideram surpreendente o fato de o Brasil não ter gasto muito mais que Japão e Coreia do Sul, que são países muito mais produtivos e com processo de engenharia mais avançado que o Brasil. "Todos aqueles que conhecem o Brasil esperariam preços muito acima da média internacional, não só devido a uma percepção de alta corrupção e ineficiência, como também pelo fato de que o custo de investir no Brasil é elevado", escrevem.

A grande diferença entre a Alemanha e as outras sedes de Copas, explicam, é decorrência de aquele país já dispor, antes da sua Copa, de diversos estádios que atendiam ao padrão da Fifa, o que reduziu custos. "Paira a dúvida se todos os estádios brasileiros realmente precisavam ser totalmente reconstruídos, ou se faltou capacidade de negociação de nossas autoridades junto à Fifa, no sentido de flexibilizar exigências. Principalmente no caso do Maracanã, que passou por ampla reforma há poucos anos", comentam os consultores.

No ranking de 19 estádios (Brasil, África do Sul, Coreia/Japão e Alemanha) construídos ou reformados, o Mané Garrincha, em Brasília, tem o custo por assento de US$ 8.830. É o quarto estádio de custo mais elevado, sendo ultrapassado pelo Saporo Dome (Japão/US$ 10.373), o Cape Town Stadium (África do Sul/US$ 10.041) e o Nissan Stadium (Japão/US$ 8.846).

Os estádios brasileiros Fonte Nova (custo de US$ 5.639), Arena Pernambuco (US$ 5.518) e Mineirão (US$ 5.512) estão abaixo da média geral, de US$ 6.429 por assento das arenas construídas ou submetidas a grandes reformas para as últimas quatro Copas do Mundo.


Brasil oscila entre otimismo e erros estratégicos 

O Brasil é um país otimista e esse reconhecimento que nos é creditado por estrangeiros que aqui aportam - a turismo ou a negócios - não teria como passar despercebido sequer nos investimentos dedicados à Copa de 2014. Os estádios Mané Garrincha, Maracanã e Mineirão - estando as duas primeiras entre as obras mais dispendiosas dos últimos quatro torneios mundiais - são exemplos de otimismo com gasto aquém do efetivamente exigido nas construções. O trio grandalhão tem custo por assento de, respectivamente, US$ 8.830, US$ 7.730 e US$ 5.512. Onde não houve otimismo na estimativa de custos, houve superestimação dos benefícios a serem proporcionados pela Copa: investimentos complementares nas infraestruturas urbanas, estímulo à economia pelo aumento do turismo, melhoria da imagem internacional do país.

Os dois consultores-legislativos do Senado Federal, Marcos Mendes e Alexandre Guimarães, responsáveis pelo estudo "Quanto custa um estádio de futebol? Ou: ainda temos tempo de economizar 42 maracanãs" publicado pelo Instituto Braudel de Economia, afirmam que a diferença entre benefícios e custos tornou-se "douradamente positiva" com alguns estádios tendo seu custo subestimado e o evento como um todo tendo benefícios superestimados.

"Igualmente otimista foi o argumento adicional de que parte substantiva dos investimentos seria feita pela iniciativa privada, não onerando o Erário. Na prática, mesmo nos projetos contratados sob a forma de parceria público-privadas (PPP), há significativos recursos públicos envolvidos, com participação direta dos governos estaduais no financiamento das obras, no financiamento subsidiado via BNDES, que, em última instância, obtém seus recursos por meio de receitas tributárias federais e de transferências do Tesouro Federal", afirmam os pesquisadores.

Os custos que envolvem os estádios da Copa no Brasil não estão limitados às obras. Também foi superestimada a capacidade de planejamento e execução do setor público brasileiro. E as manifestações populares, com início na primeira semana de junho em São Paulo contra o aumento de 20 centavos na tarifa de ônibus, também miraram este ponto - o legado da Copa.

"Em vez de mais e melhores meios de transportes e equipamentos urbanos, a Copa deixará como legado um conjunto de estádios que implicarão custos de manutenção. Mesmo os que estão contratados sob a forma de PPP vão requerer participação pública em sua manutenção. Muitos estádios não vão gerar receita suficiente para cobrir tais custos", explicam os pesquisadores. Eles citam como exemplo o Saporo Dome, do Japão, o estádio mais caro entre os construídos nas últimas quatro Copas - intensamente utilizado e lucrativo, onde ocorrem competições de esqui, jogos de baseball e de futebol. "Já o Mané Garrincha [o quarto estádio mais caro] tem poucas possibilidades de utilização após a Copa, dada a fragilidade da liga brasiliense de futebol e a baixa flexibilidade do estádio para receber outros tipos de eventos", avaliam os consultores.

Os gastos já ocorreram, mas a dupla de especialistas considera que a população brasileira ainda tem como tirar proveito da experiência. "As instituições públicas e privadas [TCU, Ministério Público, comissões temáticas do Congresso, associações de classe, imprensa e as ONGs] precisam tomar consciência da existência do "viés de otimismo" e da "deturpação estratégica" [que envolve obras e eventos de tal dimensão]. Cada vez que um planejador público apresentar um projeto de alto custo, é preciso questionar as estimativas de custos e benefícios que são apresentadas", alertam. Outra lição fundamental a ser aprendida pelos brasileiros, insistem, é de que é fundamental elencar os investimentos por ordem de prioridade. Não é possível fazer tudo ao mesmo tempo, ainda mais com a restrição fiscal e a baixa capacidade de planejamento e execução do setor público.

"O governo, ainda que conte com a participação da iniciativa privada, não consegue, ao mesmo tempo, construir estádios, ampliar metrôs, redesenhar corredores de ônibus, ampliar o saneamento básico, construir hospitais ou aperfeiçoar a educação. É imperioso ter uma lista de prioridades", afirmam os consultores do Senado.

Há atualmente no Brasil um projeto de engenharia que tem toda pinta de, assim como os estádios da Copa, ser um caso clássico de baixa prioridade associada à superestimativa de retorno econômico-social. É o trem-bala, que ligará o Rio a São Paulo. O projeto não é prioritário porque será um meio de transporte de luxo, com passagens caras, destinado a transportar pessoas de renda alta entre Rio e São Paulo", afirmam os pesquisadores.

Mendes e Guimarães detalham, no estudo sobre custo dos estádios, que mesmo antes do início das obras do trem-bala, a estimativa de custo já pulou de R$ 18 bilhões para R$ 35,6 bilhões - a preços de 2008, segundo autoridades. Esse valor corrigido pelo INCC salta a R$ 50 bilhões. "Essa é a estimativa oficial, provavelmente subestimada que apontam indícios de viés de otimismo e deturpação estratégica nesse projeto cuja execução é calculada hoje em 42 Maracanãs!" (AB)


Em dia de vitória, protestos reúnem 10 mil

Por Caio Junqueira, Rafael Rosas e Guilherme Serodio | Do Rio


Sem a presença da presidente Dilma Rousseff, o Brasil derrotou neste domingo a Espanha por 3 a 0 e ganhou pela quarta vez a Copa das Confederações. Fred fez dois gols pela seleção e Neymar fez um. A Espanha perdeu um pênalti.

A presidente ficou em Brasília para uma reunião com ministros com o objetivo de definir os pontos da mensagem sobre o plebiscito da reforma política que enviará ao Congresso nesta semana, como resposta às manifestações que há três semanas ocorrem no país. Com a ausência, ela evitou tomar novamente vaias como as ouvidas na abertura da Copa das Confederações, em Brasília, no jogo entre Brasil e Japão.

Outras autoridades, porém, compareceram ao estádio do Maracanã, palco da final. Segundo a FIFA, foram ao jogo o ministro do Esporte, Aldo Rebelo; o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PMDB); o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB); e o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT). Nenhum deles, porém, discursou.

O Rio foi ontem palco de manifestações muito menores do que aquelas que marcaram o início da temporada de protestos.

Depois de manifestações que chegaram a reunir 300 mil pessoas, o Rio ontem teve protestos com não mais que 10 mil pessoas. Igual número de policiais foi destacado para contê-los.

O clima de rebeldia contaminou alguns dos dançarinos que fizeram a apresentação de despedida da Copa. Dois deles saíram debaixo das fantasias das bolas de futebol em que estavam.

O primeiro estendeu uma faixa escrito "Imediata anulação da privatização do Maracanã", enquanto a outra faixa dizia "Ser gay é mara... Aberração é o preconceito". Diante disso, um organizador se aproximou, retirou as faixas e os retirou do gramado.

Do lado de fora do estádio, apesar do público mais reduzido, houve confronto com a polícia. Os incidentes começaram quando os manifestantes que estavam na região do Maracanã começaram a gritar palavras de ordem para quem assistia ao jogo do Brasil nos bares. O clima ficou tenso e a polícia soltou bombas de gás lacrimogênio e jogou spray de pimenta. Com isso, indignou os torcedores que usualmente se reúnem na Praça Varngagen junto à Avenida Maracanã, distante duas quadras do estádio.

Grupos vestidos de preto caminharam à frente da manifestação, seguidos pela Frente Nacional dos Torcedores (FNT), organização que protesta contra a Fifa e a CBF, além de indígenas representantes da remanescente Aldeia Maracanã, removida do entorno do estádio em maio para as obras da Copa.
Os gritos de ordem ouvidos durante a manifestação foram principalmente contra a Copa do Mundo e o governador do Estado do Rio, Sérgio Cabral (PMDB-RJ). A mídia também foi alvo dos manifestantes: ainda na concentração da passeata, uma equipe da TV Globo foi hostilizada e expulsa da praça. "Cabral ditador" e "Não vai ter Copa" foram alguns dos gritos mais frequentes.

Um grupo de advogados da Ordem dos Advogados do Brasil no Rio de Janeiro acompanhou a manifestação para monitorar as ações da Polícia Militar no entorno do estádio
Mais cedo, cerca de 40 manifestantes invadiram o prédio da nova sede da CBF na manhã deste domingo, por volta das 9h30, na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio. Eles protestavam contra um suposto superfaturamento das obras do edifício da entidade.

Ninguém ficou ferido e não houve depredação.

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