quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Dilma promete assumir negociação com partidos, mas aliados duvidam

folha de são paulo
(GABRIELA GUERREIRO, VALDO CRUZ E TAI NALON)

Presidente diz que vai se reunir quinzenalmente com congressistas
DE BRASÍLIARecebida com entusiasmo em público e com ceticismo nos bastidores, a presidente Dilma Rousseff prometeu assumir pessoalmente a articulação política com o Congresso e fazer reuniões quinzenais com deputados e senadores.
A promessa foi feita para tentar acabar com o clima de rebelião na base aliada no Legislativo. Dentro do novo roteiro, Dilma recebe hoje a bancada de senadores do PT.
Ela já agendou na segunda reunião com deputados governistas. Na terça, deve ser a vez dos senadores. O acerto foi feito em reunião com líderes governistas no Senado para atender uma das principais queixas da base: a falta de diálogo com o Planalto.
Nos dias em que Dilma não puder ir às reuniões, elas serão conduzidas pelo vice-presidente Michel Temer ou pela ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais).
O líder do governo no Senado, Eduardo Braga (PMDB-AM), afirmou que a presidente deu início a uma "fase ampliada" de interlocução com os seus aliados, o que é positivo: "Vamos ter as reuniões para discutir questões estratégicas do governo. Sempre vai estar presente, além dos líderes, o presidente da comissão em que tramita a proposta em discussão".
Reservadamente, senadores e deputados que estiveram com Dilma nos dois últimos dias revelam ceticismo com a promessa. Sob a condição de anonimato, um deles disse temer que essa "disposição repentina ao diálogo" pode ser apenas "fogo de palha" de quem está acuada.
Os primeiros testes da presidente serão a votação do projeto sobre a distribuição dos royalties, na próxima semana, e dos vetos presidenciais em sessão do Congresso, marcada para o dia 20.
A disposição de dialogar não foi suficiente, porém, para o governo barrar a votação, em comissão da Câmara, da proposta que torna obrigatória a liberação dos recursos de emendas parlamentares.
Dilma teve de negociar para reduzir o tamanho de sua derrota.
    ANÁLISE - ORÇAMENTO
    Lei em debate no Congresso não elimina 'faz de conta'
    Texto aumenta poder de parlamentares e mantém truque de 'criar' arrecadação
    GUSTAVO PATUDE BRASÍLIAO texto discutido na Câmara dos Deputados eleva os poderes dos congressistas sobre o Orçamento, mas, retórica à parte, mantém o Legislativo brasileiro livre de novas preocupações com a qualidade dos gastos e a solidez das contas públicas.
    No atual faz de conta da elaboração da lei orçamentária, deputados e senadores recorrem a um truque para criar novas despesas sem desagradar a ninguém: inventam arrecadação.
    A estimativa de receita para 2013, por exemplo, subiu de um já otimista R$ 1,230 trilhão, no projeto do Executivo, para R$ 1,253 trilhão --o bastante para incluir emendas de R$ 22,7 bilhões.
    Encerrado o primeiro semestre, a receita esperada pela equipe econômica já caiu para R$ 1,185 trilhão. E, assim como a arrecadação fictícia, as obras prometidas pelos congressistas a seus redutos eleitorais evaporaram.
    O relatório que acompanha a proposta de execução obrigatória das emendas reconhece, em meio a eufemismos, a necessidade de uma nova prática. A solução encontrada foi incluir mais uma declaração de boas intenções na Constituição.
    "A previsão de receita e a fixação da despesa no projeto e na lei orçamentária devem refletir com fidedignidade a conjuntura econômica e a política fiscal", dirá o 10º parágrafo do artigo 165, caso a proposta avance.
    REGRA IGNORADA
    O texto constitucional em vigor já estabelece, no artigo seguinte, uma regra para as emendas sistematicamente ignorada: as despesas criadas pelos congressistas devem ser compensadas com a anulação de despesas propostas pelo Executivo.
    Se aplicado, tal modelo submeteria deputados e senadores ao constrangimento político de cortar investimentos em infraestrutura, já escassos, para acomodar uma miríade de despesas miúdas, típicas de prefeituras.
    Algo como remanejar verbas da conservação de rodovias --porque a maior parte do Orçamento é tomada por despesas obrigatórias como o pagamento de salários e aposentadorias-- para o calçamento de ruas ou festas folclóricas no interior do país.
    Na proposta votada pelos deputados, esse ônus ficará, na prática, com o governo. De concreto, a única salvaguarda oferecida pelo Congresso Nacional é a dimensão relativamente reduzida de suas pretensões.
    Os parlamentares contentam-se com pouco mais de R$ 6 bilhões, metade de um centésimo do Orçamento. Ainda assim, é o triplo do dinheiro disponível neste ano para o transporte ferroviário --ou o dobro do reservado à educação infantil.
      Câmara ignora apelo e faz avançar projeto incômodo para Dilma
      Comissão aprova proposta que obriga governo a liberar recursos para iniciativas patrocinadas por parlamentares
      Henrique Alves diz a deputados que presidente nunca lhe pediu para não colocar proposta em votação
      DE BRASÍLIAO presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), ignorou os apelos do Palácio do Planalto e começou a trabalhar pela aprovação de um dos projetos que mais incomodam o governo na pauta atualmente em discussão no Congresso.
      Trata-se da proposta de emenda constitucional que torna obrigatória a execução financeira das emendas que deputados federais e senadores incluem todos os anos no Orçamento da União para destinar recursos a projetos em seus redutos eleitorais.
      A comissão criada para debater a proposta aprovou o texto ontem, após seis horas de debate. Alves promete colocar a proposta em votação no plenário da Câmara hoje.
      As emendas parlamentares são um ponto sensível na relação entre o governo e o Congresso. A liberação das verbas é usada como trunfo sobretudo em meio à discussão de projetos importantes.
      Pela legislação atual, cada parlamentar pode apresentar, anualmente, até R$ 15 milhões em emendas, mas nada obriga o governo a liberar dinheiro para esses projetos.
      Pelo contrário, em geral elas são o alvo preferencial da equipe econômica do governo quando há necessidade de cortes no Orçamento.
      Desde segunda-feira, Henrique Alves deixou claro que se empenharia pela medida, que, segundo ele, acabará com o "toma lá, dá cá" entre o Congresso e o Executivo.
      Seu esforço teve continuidade ontem, mesmo depois de tentativas de convencimento feitas por líderes do PT e de outros partidos aliados.
      À tarde, num gesto incomum, o presidente da Câmara foi à comissão e fez uma espécie de preleção aos deputados, enfatizando que a presidente Dilma Rousseff nunca lhe pediu que não colocasse a proposta em votação.
      "Vim aqui agora para pedir para que votem hoje, porque a matéria já está suficientemente amadurecida", disse Alves. Mais tarde, ele voltou à sala para anunciar que suspendera as votações previstas para o plenário para se concentrar na análise do assunto.
      O governo é contra o projeto por causa dos gastos extras que terá que cobrir. Dilma se reuniu anteontem e ontem com deputados e senadores na tentativa de barrar propostas que a desagradam. Prometeu se abrir mais a negociações e conseguiu adiar a votação de alguns projetos.
      A proposta defendida por Alves estabelece que o governo ficará obrigado a executar as emendas até o limite de 1% da receita corrente líquida verificada no ano anterior.
      Se as novas regras já estivessem em vigor, neste ano o governo seria obrigado a executar R$ 6,2 bilhões em emendas individuais, mesmo valor que o Planalto liberou recentemente para conter a insatisfação na sua base. Isso representaria R$ 10,4 milhões para cada congressista.
      A discussão ontem terminou em impasse sobre a eficiência prática da proposta. Pelo texto aprovado, o governo fica obrigado a pagar as emendas empenhadas (que têm o recurso reservado no Orçamento) no mesmo ano.
      O que ocorre é que o governo, legalmente, só pode pagar após comprovação da prestação do serviço ou realização de obra. Assim, obras financiadas por emendas teriam de ser concluídas em tempo recorde. O assunto dominará o debate hoje.

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